Entre o prestígio e o orgulho ou entregar o título ao Benfica
O desfecho do clássico entre o FC Porto e o Sporting marcado para sábado (18.30, SportTV1) pode ser determinante nas contas do título. Caso o Benfica vença amanhã o V. Guimarães e os leões percam pontos no Dragão no dia a seguir, a equipa de Rui Vitória fica muito perto do tricampeonato - quatro pontos em caso de empate e cinco se o Sporting for derrotado com duas jornadas por cumprir. Ironia do destino, o FC Porto pode contribuir para a conquista do 35.º título do histórico rival de Lisboa.
"90% dos adeptos do FC Porto são antibenfiquistas e oferecer de mão beijada o título ao Benfica não será uma sensação agradável", reagiu Paulo Futre ao DN, ele que como jogador representou os três grandes do futebol português. Fernando Mendes, defesa que também passou pelos três rivais, segue o mesmo raciocínio, lembrando que "qualquer adepto portista não gosta do Benfica, por isso não o quer ver campeão". Tese também defendida por Nélson, antigo internacional português que representou dragões e leões: "A última coisa que os adeptos do FC Porto querem é ver o Benfica sagrar-se campeão nacional."
Eurico Gomes, que como futebolista também vestiu as camisolas dos três grandes portugueses, dá mais força a esta rivalidade entre FC Porto e Benfica a nível dos adeptos: "O grande rival do FC Porto é o Benfica e se é verdade que qualquer adepto quer ganhar, durante o jogo nem se irá lembrar disso, quando a partida terminar poderá ficar com um sentimento de alguma tristeza."
Há contudo um ponto de honra em que todos coincidem: o FC Porto, já sem hipóteses de sequer chegar ao segundo lugar, não vai facilitar. "Está o orgulho portista em jogo e os jogadores sabem que uma vitória será muito importante, até como motivação para a final da Taça de Portugal. Uma coisa são os adeptos e outra a equipa. O FC Porto vai dar tudo!", garantiu Futre ao DN.
Formado no Sporting foi no FC Porto que Fernando Mendes conquistou grande parte dos seus títulos, tendo sido tricampeão nacional entre 1996 e 1999. "Este Sporting é muito superior ao FC Porto mas é sempre complicado jogar no Dragão e não é a diferença pontual que tornará as coisas diferentes", atirou, lembrando que "Pinto da Costa teceu críticas ao plantel, o que espicaçou os jogadores, que vão querer mostrar que podem vencer".
O antigo defesa sublinha que o clube de Alvalade "estará debaixo de grande pressão, pois qualquer resultado que não a vitória poderá significar a despedida do título". Ainda assim, antevê que "caso as coisas corram normalmente, o Sporting tem condições para ganhar, até porque tem um treinador com capacidade e experiência, capaz de fazer a diferença nos grandes jogos".
Eurico Gomes, bicampeão pelos três grandes, entende que num confronto desta dimensão "nunca se pode falar em favorito, porque cada jogo é único e num clube com a dimensão do FC Porto há sempre um prestígio a defender e exigência máxima, que ultrapassa qualquer classificação menos boa". "Não é pelo FC Porto ter menos dez pontos do que o Sporting que parte numa posição de fragilidade", defendeu.
Eurico reconhece, porém, que a equipa de Jorge Jesus "apresenta um coletivo muito mais coeso e uma linha defensiva mais forte", mas logo contrapõe referindo que "isso pouco importa nestes jogos". E sublinha que "terá de aparecer o estofo de campeão do Sporting nesta fase final de luta titânica com o Benfica".
Nélson brilhou no Sporting, em que foi quase sempre titular entre 1991 e 1996, tendo representado o FC Porto de 1998 e 2002, mas com muito menos destaque. Embora defenda que a equipa de Jesus "é muito superior", antevê enormes dificuldades no Dragão. "Só quem não passou por aquela casa é que pensa que o FC Porto vai facilitar. É um jogo de tripla, pois os jogadores do FC Porto estão com o orgulho ferido e vão fazer tudo para retificar os maus resultados e fazerem as pazes com os adeptos", anteviu.
Os clássicos mais marcantes
Questionado sobre o clássico entre os dois clubes que lhe traz melhores recordações, Fernando Mendes não hesita. "Foi um jogo há uns 30 anos [n.d.r: 10 de maio de 1987], em que o Sporting ganhou por 1-0 nas meias-finais da Taça de Portugal, com um golo do brasileiro Mário, já no final do prolongamento", recordou. O pior veio depois: "Os adeptos do FC Porto ficaram furiosos e partiram os vidros do nosso autocarro com pedras, já numa zona afastada do estádio. Eram situações recorrentes, não só no estádio do FC Porto mas também em outros recintos portugueses, felizmente ninguém ficou ferido."
Paulo Futre, seu grande amigo e conterrâneo no Montijo, estava do outro lado da barricada nesse jogo: "Esse clássico também é o primeiro que me vem à cabeça, pois ninguém esperava esse desfecho. Estive três anos no FC Porto e foi a minha única derrota em casa."
O clássico entre dragões e leões que Eurico Gomes recorda com mais saudade foi o empate (1-1) nas antigas Antas, na temporada de 1979-80, ao serviço do Sporting: "Foi um resultado muito importante porque o campeonato estava disputadíssimo e em caso de derrota teríamos passado para segundo lugar, por troca com o FC Porto. Ainda tivemos um golo mal anulado pelo António Garrido, mas o empate serviu-nos e no final atingimos o nosso objetivo."
Já o jogo entre os dois clubes que mais marcou Nélson foi o triste clássico de 7 de maio de 1995. E não devido à derrota do Sporting (0-1) que praticamente afastou a equipa da luta pelo título. "Uma multidão de adeptos esperava a equipa do FC Porto em Alvalade e, quando o autocarro chegou, caiu um varandim e dois adeptos morreram. Lembro--me de que eu estava no posto médico e os médicos e enfermeiros que lá estavam desapareceram para ir assistir os feridos", recorda, acrescentando que "foi muito difícil entrar dentro de campo.