Clubes da I e II Liga com receitas recorde de mil milhões de euros em 2023-24. Adeptos nos estádios aumentam
Os clubes portugueses passaram, pela primeira vez, a barreira dos mil milhões de euros em receitas numa só época. Na época 2023-24, os 34 emblemas que compõem a I e II Ligas chegaram aos 1073 milhões de euros de receitas - sendo que 1024 milhões foram garantidos pelos 18 clubes da I Liga-, mais 86 milhões do que na temporada anterior. Já os gastos foram de 1122 milhões de euros. O que significa que um défice de 98 milhões entre receitas e gastos totais.
A indústria do futebol manteve assim um relevante contributo para o Produto Interno Bruto (PIB) do País, na ordem dos 662 milhões de euros, num ano de novo recorde de espectadores nos estádios. Estas são algumas das conclusões que constam do Anuário do Futebol Profissional, que resulta de uma parceria estratégica entre a Liga Portugal e a EY, ontem apresentado na Sede da Liga Portugal, no Porto.
O mercado de transferências continua a ser a fonte de receita mais rentável dos clubes, com as verbas resultantes dos direitos televisivos se seguida. Na época em questão, foram transferidos 230 jogadores da I Liga para ligas estrangeiras (63% do total), o que prova, segundo a instituição que gere os campeonatos, a internacionalização do futebol português. As saídas totalizaram 361 milhões de euros, com o mercado de verão a ser o período mais ativo, concentrando 75% das vendas.
Para isso muito contribuíram as vendas do benfiquista Gonçalo Ramos (65 milhões de euros), do leão Ugarte (60 milhões) e do portista Otávio (60 milhões).
No total saíram 364 futebolistas e foram contratados 377, num saldo positivo de 151 milhões de euros. O peso das transferências entre atletas das Sociedades Desportivas (vulgo SADs) diminuiu, bem como a entrada de atletas da II Liga, em contraste com o aumento de jogadores provenientes de campeonatos estrangeiros.
A contribuição da indústria do futebol profissional para o PIB diminuiu 1% face à temporada 2022-23, “em parte devido à queda significativa” dos ganhos dos clubes presentes nas competições europeias, segundo consta do Anuário, onde se pode ainda ler que foram gerados mais 4400 postos de trabalho e 268 milhões de euros em impostos (mais 14% do que em 2022-23).
Olhando para o mapa do futebol português é muito desequilibrado e concentrado a Norte, onde moram 53% dos clubes dos os campeonatos profissionais. Segundo os dados do relatório, mais de metade (18) das entidades que compõem a I e II ligas são da região Norte, com a Área Metropolitana de Lisboa a ser representada por sete emblemas. Ou seja, na temporada passada, apenas nove clubes das regiões do Centro, Algarve e Ilhas integraram os campeonatos profissionais.
O futebol profissional gerou 4436 postos de trabalho - 3239 na I Liga -, mais 932 do que na época anterior (3504). Os jogadores são o coração do negócio e, segundo os dados agora revelados, foram 1554 futebolistas que deram cor aos campeonatos em 2023-24. E sendo que a maioria (989) esteve ligada a clubes da I Liga. Juntos, custaram 294 milhões de euros em salários (mais 25 milhões face aos 269 da temporada anterior).
Os futebolistas pagaram 152 milhões em IRS e 57 milhões para a Segurança Social. Neste capítulo percebe-se a abismal diferença salarial e contributiva entre os dois principais campeonatos, com as estrelas do principal campeonato. Os jogadores da I Liga pagaram 115 milhões de IRS (face aos 9 milhões da II Liga) e 20 milhões para a Segurança Social, mais 18 do que os do segundo escalão.
Os adeptos também contribuíram para os ganhos dos clubes e para os cofres do Estado com 39 milhões de euros, resultando do IVA, em gastos na compra de bilhetes e afins, entre agosto de 2023 e junho de 2024.
A carga fiscal tem muito a ver com o IRS que existe em Portugal, segundo o presidente da EY Portugal, que produziu o Anuário, Miguel Farinha: "É uma carga fiscal pesadíssima. Há ligas que têm condições privilegiadas, em que os jogadores de futebol, que têm uma vida profissional muito mais curta, têm uma taxa de imposto bonificada que permite atrair os jogadores. O ideal seria haver uma taxa particular para a indústria do futebol, por exemplo, que permitisse, quando eu estou a comparar um jogador em Itália ou em Portugal, eu para pagar ao mesmo jogador em Portugal o que pagam em Itália, teria que gastar o dobro do dinheiro, para ele receber o mesmo líquido na sua conta. Isso, imediatamente, faz com que haja uma desvantagem competitiva gigante. Já não estou a falar, obviamente, dos casos dos Emirados, das Arábias, com taxas zero, não é esse o nosso comparativo, mas dentro da Europa há diferenças muito significativas e é preciso percebê-las e tentar corrigi-las."
Três grandes concentram 62% das assistências
A temporada 2023-24, que terminou com o Sporting campeão, o Benfica em segundo e o FC Porto em terceiro, ficou ainda na história da competição pelo recorde de espectadores nos estádios: 3, 7 milhões de adeptos marcaram presença em 306 partidas da I Liga. Sem surpresa, os jogos dos três grandes concentram 62% do total das assistências. O clássico da jornada 7, entre o Benfica e o FC Porto, jogado no Estádio da Luz, em setembro de 2023, foi o que mais adeptos chamou a um recinto: 62 247.
E, embora a ocupação média por jogo seja na ordem dos 60%, o número ainda envergonha o top 5 das melhores ligas europeias (Inglaterra, Espanha, Alemanha, Itália e França). Em média um jogo tem 12 117 adeptos nas bancadas... e na segundo II Liga não sega às 2 mil pessoas por encontro.
E, apesar do Anuário concluir que os principais fatores que influenciam as assistências médias serem as equipas envolvidas e o momento do campeonato, o dia e a hora dos jogos também tem impacto. Assim, 232 jogos (76% do total) realizaram-se ao sábado e ao domingo e os horários com maior assistência média foram sexta-feira entre as 18-19 horas e ao fim-de-semana entre as 20-21 horas.
O retorno mediático estimado da I Liga cresceu 6% e foi de 1708 milhões de euros, com os conteúdos online a registarem um crescimento de mais de 29% face a 2022-23, tendo assim contribuído com 545 milhões de euros - 14 milhões provenientes das interações realizadas em redes sociais.
José Gomes Mendes ou Reinaldo Teixeira. Liga Portugal vai a votos em abril
"Os dados sublinham o peso crescente do futebol profissional na economia nacional, o que deve servir de referência ao poder político, a quem cabe um papel relevante na garantia de condições justas para assegurar a competitividade do setor", afirma a presidente interina da Liga, Helena Pires.
Um dado surpreendente refere-se à evolução da própria estrutura da Liga Portugal, que à data era liderada por Pedro Proença - eleito presidente da Federação Portuguesa de Futebol no dia 14 de fevereiro - e que aparece com 147 funcionários. Desportivas.
Pelo nono ano consecutivo, a Liga Portugal apresentou resultados operacionais positivos, registando cerca de 29 milhões de euros em receitas, com as competições profissionais a representarem 75% deste valor. A Liga fechou a época com lucros de 774 mil euros, tendo distribuído mais de 9,8 milhões de euros às SADs.
O organismo liderado interinamente por Helena Pires vai ter eleições no dia 11 de abril, com José Gomes Mendes e Reinaldo Teixeira a concorrerem à sucessão de Pedro Proença.