André Carrillo: “Sair do Sporting para o Benfica foi difícil. Mas fiz a escolha certa”
Foto: Corinthians

André Carrillo: “Sair do Sporting para o Benfica foi difícil. Mas fiz a escolha certa”

Em entrevista ao DN, o jogador peruano revisita memórias de Portugal, exalta a passagem pela Arábia Saudita e o futebol brasileiro, onde joga atualmente com a camisola do Corinthians.
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Tinha 20 anos quando chegou a Portugal. Quais são as suas primeiras memórias do país e especialmente das temporadas em Alvalade?

São lembranças muito lindas. Eu cheguei sem nenhum nome, ninguém me conhecia, era uma aposta para o futuro. Nos primeiros seis meses não joguei um minuto, mas com o passar do tempo fui ganhando massa muscular, pois era muito magrinho antes. Fui-me aperfeiçoando taticamente e tecnicamente, e comecei a ganhar o meu espaço. Os primeiros dois anos foram de adaptação, e no terceiro já comecei a ganhar lugar no onze do Sporting. Os treinadores começaram a acreditar mais em mim, o Leonardo Jardim, Marco Silva, Jorge Jesus. E foram boas épocas. Ganhámos alguns troféus, como a Taça de Portugal e a Supertaça. Não tive a oportunidade de ganhar a Liga. Nesses anos o Benfica e o FC Porto eram muito mais fortes.

Por falar no Benfica, houve aquela polémica transferência. Sentiu muita pressão dos adeptos? Foi algo difícil de lidar? Está arrependido?

Sim, foi difícil, uma mudança de clube na mesma cidade, com uma rivalidade gigante e, ainda por cima, toda a gente do Sporting gostava de mim. Mas na vida temos de tomar decisões, e, naquele momento, sou sincero, o Benfica era, e acho que é até aos dias de hoje, muito maior que o Sporting. O Sporting tem uma massa adepta gigante, mas a nível de títulos e de história, acho que o Benfica é maior. No momento, economicamente também, a aposta que o Benfica fazia em mim era de outra dimensão. Tinha de olhar para mim e para a minha família, e acho que foi a escolha certa. Só joguei um ano no Benfica, mas fui muito feliz e ganhei um título nacional, algo que não tinha conseguido ainda na carreira. Sinto que foi um ano incrível.

Ainda acompanha algum dos clubes portugueses?

Não muito. Saíram muitos amigos da época que eu estava lá, como André Almeida, Rafa, João Mário e Salvio. Já não conheço muitos jogadores e não acompanho muito a Liga portuguesa, passou. Hoje em dia acompanho mais a Liga árabe que a portuguesa.

No Benfica foi emprestado ao Watford e ao Al-Hilal. Como foi essa experiência na Premier League? É mesmo a melhor liga do mundo?

Sim, é diferente. Era o Marco Silva o treinador, ele conhecia-me do Sporting, gostava muito de mim, e pediu para eu ir. Fui um ano emprestado e o que posso dizer é que a Premier League é maravilhosa se jogarmos numa grande equipa, jogar no Watford é lutar para não descer. Ganhar uma partida já era uma loucura, porque é muito difícil competir com outras equipas. Mas foi uma experiência bonita também, para aprender. Queria passar pela Premier League e o Watford e o Marco Silva deram-me essa oportunidade.

No Al Hilal reencontrou Jorge Jesus. Foi ele que o chamou? Como avalia sua passagem pela Arábia?

Sim, foi ele que me ligou, queria que eu fosse para o Al Hilal, e era um momento no qual o mercado árabe não é o que era agora. Ninguém conhecia a cultura, era um país mais fechado naquele tempo, foi há sete anos. Mas o Jorge Jesus convenceu-me e senti-me muito querido. Os adeptos adoraram-me, ganhei muitos títulos e senti-me um ídolo, que é o que todo jogador gosta. Sinto que foi a melhor decisão da minha vida, onde me senti mais querido e o Al Hilal, para mim, é hoje a equipa do meu coração.

Já dava para ver que seria um mercado em ascensão?

Agora o investimento é muito maior, muito mais estrelas, como Cristiano Ronaldo, o Neymar, a liga cresceu muito e é super competitiva. Além disso a vida na Arábia Saudita é incrível. Vivi lá seis anos, cinco no Al Hilal e um no Al-Qadsiah, e a verdade é que eu e a minha família fomos muito felizes, temos muito boas lembranças e é um país que, no futuro, vou gostar de visitar. O futebol saudita também melhorou, ganharam à Argentina no último Mundial, os jogadores locais têm aprendido com os que vêm de fora.

Chegou ao Brasil no ano passado e voltou aos holofotes após a passagem pelo Al-Qadsiah. Muitos surpreenderam-se pela sua nova posição, como “oito”. Como ocorreu essa mudança?

Quando trabalhei com o Ramón Diáz [ex-treinador do Al Hilal e atualmente no Corinthians] ele chegou sem me conhecer e colocou-me como médio. Nunca tinha jogado assim e, no primeiro jogo que ele me colocou nessa posição, eu marquei um golo e fiz uma assistência. A partir daí ganhei confiança e comecei a jogar todos os jogos como médio. Foi um ano em que o Al-Ittihad estava em primeiro, 15 pontos à frente de nós. Conseguimos dar a volta e no fim da época fomos campeões, comigo a médio. Acabei por ficar nesta posição. Foi algo que me surpreendeu, pois não me imaginava assim, sempre fui um extremo, mas a verdade é que perdi um pouco de velocidade e gosto de ficar com a bola no meio, então dei-me bem na posição.

Essa mudança de posição dá mais gás para o final de carreira? Já está com 33 anos…

Sim, já estou velho [risos]. Não, é uma boa idade, e estou com mais gás nessa posição. Acho que no meio campo, se estamos bem posicionados, com bola, dá para correr menos. Por isso estou feliz nesta posição.

Falou de Leonardo Jardim, Jorge Jesus, Marco Silva e Ramón Díaz. Houve algum treinador que mais o marcou?

Sim, esses quatro são alguns dos mais importantes. Colocaria também o Razvan Lucescu, que hoje está no PAOK, tivemos uma ótima relação. E também o Ricardo Gareca, que foi muito importante para mim e para o meu país na seleção peruana, uma pessoa que admiro e tenho muito carinho.

Como vê o Brasileirão emrelação à I Liga portuguesa?

O jogador brasileiro tem mais qualidade e aqui é um jogo mais físico. Sinto que me adaptei bem porque, apesar de não ter a mesma intensidade de antes, tenho mais tranquilidade com a bola, dou outras coisas à equipa que talvez antes não tivesse. Mas o futebol brasileiro é de alto nível, tem muitos jogos, muita competitividade e muitos clubes grandes. São 10 ou 12 na liga e isso faz muita diferença. Não dá para relaxar em nenhum jogo.

E fora de campo? O ambiente da bancada?

Na Arábia Saudita joguei muitas vezes em estádios vazios. Em Portugal tive a sorte de jogar em grandes equipas, no Sporting e Benfica era sempre com os estádios lotados. Mas a torcida aqui é muito mais apaixonada, em todos os clubes. O Estádio do Grêmio, o Maracanã, no Palmeiras e no São Paulo sei que também é assim, cheio. Mas nenhum como o Corinthians, claro.

Nos últimos anos tem jogado fora da Europa. Com a globalização do futebol e o Mundial de Clubes este verão, fica a dúvida se estes clubes de fora conseguem fazer frente aos europeus. Acha que é possível?

Acho que dá para competir, sim, é questão do momento certo. Claramente não é fácil, o europeu está sempre um pouco mais à frente, especialmente clubes campeões das grandes ligas, como Barcelona, Real Madrid, Manchester City. Estes estão acima do resto do mundo. Mas acredito que, hoje em dia, o futebol está tão competitivo que se se está bem fisicamente, que se estamos no momento certo, com confiança, dá para lutar contra qualquer um.

Chegou ao Corinthians no meio de muitas dúvidas, por vir da II Divisão saudita. Mas tornou-se fundamental na boa fase da equipa. Como está a ser a vivência no Brasil?

No ano passado sentia que o clube árabe já não me queria, na seleção também terminei sem jogar muito e perguntava-me se a minha carreira em grandes clubes tinha chegado ao fim. Foi quando recebi o convite do Corinthians. Não hesitei e vim logo, mas com algum receio de poder cair para II Divisão, dos adeptos, de tudo, mesmo que com bola eu soubesse que ia ter confiança, que estava bem, e deu certo. Adaptei-me muito bem, os companheiros ajudaram-me muito e a equipa também foi crescendo em confiança. Esperamos que este ano continue assim, que consiga ganhar algum título, está uma relação muito boa entre adeptos, jogadores, comissão e direção. Estou a aproveitar cada momento. Já sei que falta pouco para acabar a carreira, então quero aproveitar muito cada dia.

nuno.tibirica@dn.pt

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