O 'Indiana Jones' egípcio esteve em Lisboa e falou, entre outras coisas, dos segredos que irá revelar em breve acerca das Pirâmides do Egito.
O 'Indiana Jones' egípcio esteve em Lisboa e falou, entre outras coisas, dos segredos que irá revelar em breve acerca das Pirâmides do Egito. FOTO: Reinaldo Rodrigues

Zahi Hawass: “A crença na vida após a morte construiu o Antigo Egito”

O arqueólogo egípcio veio a Lisboa para palestra na Nova. Ao DN falou das suas pesquisas, da reivindicação de peças a museus estrangeiros, e de uma exposição em Portugal sobre a civilização faraónica.
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Há alguma descoberta arqueológica recente no Egito que queira destacar?

Sim, há tantas. Sabe, estou a ter muitos projetos agora. O mais importante é que estamos a utilizar tecnologia dentro da Grande Pirâmide de Khufu [Quéops] para revelar os seus segredos. Estou a liderar uma equipa a trabalhar dentro da Grande Pirâmide. Bem, na realidade, são duas equipas. A primeira quer descobrir o que pode estar escondido atrás das portas da pirâmide. E a segunda trabalha no projeto de scanerização da pirâmide, utilizando ultrassons e infravermelhos, e encontrámos já um corredor atrás da entrada principal. Encontrámos também um grande, grande vazio por cima da Grande Galeria, do tamanho de dois camiões. Este ano de 2025 é o ano em que iremos revelar todos os segredos da Grande Pirâmide. E vamos fazê-lo em direto para o mundo inteiro antes do final de 2025. Todos verão o que descobrimos dentro da Grande Pirâmide. Porque as pessoas acusam-me de esconder provas dentro da Grande Pirâmide, mas eu nunca escondo nada. Mas agora, para mostrar ao mundo inteiro, antes do final de 2025, vamos fazer um espetáculo ao vivo para revelar a todos o que descobrimos dentro da Grande Pirâmide de Khufu. Este é o projeto número um. Projeto número dois: estou a usar o ADN para descobrir como é que Tutankhamon morreu. Porque, sabe, descobri que ele não foi assassinado. Encontrámos uma fratura na perna esquerda. Foi um acidente que lhe aconteceu dois dias antes de morrer. Daqui a um mês, vamos saber se teve uma infeção ou não. Se, de facto, teve uma infeção, anunciarei numa conferência de imprensa que Tutankhamon morreu num acidente. Também usando ADN, trabalhando com uma equipa estrangeira e uma equipa egípcia sob o meu comando, estamos a tentar descobrir a múmia da rainha Nefertiti e a múmia da sua filha Ankhesenamun. E estamos quase lá. Dentro de um ou dois meses, farei uma conferência de imprensa para anunciar esta descoberta. Em Saqqara, procuro a Pirâmide de Huni e participei num filme que está a ser mostrado na Netflix. Na verdade, vou dizer-lhe, encontrámos essa pirâmide. E estamos a escavar essa pirâmide neste momento. Outras descobertas que fiz em Saqqara, não posso anunciar ainda. Porque primeiro tenho de anunciar no Egito. Há uma grande descoberta em Saqqara que anunciarei daqui a duas semanas.

Quando era chefe do departamento de Antiguidades e ministro, consegui que fossem devolvidos 6000 artefactos roubados do Egito. E foi por isso que fui escolhido em 2006 pela revista Time como uma das pessoas mais influentes, pela forma como recuperei a herança do Egito.”
Zahi Hawass, arqueólogo

Referiu Tutankhamon e a minha pergunta é: como explica que figuras de há tantos milénios, como Tutankhamon, Nefertiti ou Hatshepsut, hoje em dia sejam nomes que praticamente toda a gente conhece em todo o mundo?

Porque, já se sabe, o Antigo Egito tem mais magia do que qualquer outra civilização no mundo. Se perguntar a uma criança nas ruas de Lisboa para lhe dizer o que é o Egito, ela responder-lhe-á a Grande Pirâmide de Khufu, conhecida por todos. Ou dirá a Esfinge, sobre a qual revelei os segredos. Ou falará de Tutankhamon e das múmias. Portanto, isso é realmente natural, porque o Antigo Egito é incrível. É uma civilização que traz emoção, magia e mistério a todos.

Como é que essa antiga civilização do Egito é vista hoje pelo egípcio comum?

Ah, maravilhosamente. Olham para ela com orgulho, todos eles. Por exemplo, como no dia 8 de janeiro, quando fiz uma conferência de imprensa em Luxor para anunciar uma grande descoberta relacionada com a rainha Hatshepsut e com Amósis I, aquele que expulsou os hicsos. E esta descoberta foi divulgada em todo o lado, não apenas entre os egípcios, mas entre as pessoas de todo o mundo.

É possível afirmar que as pirâmides de Gizé são o maior símbolo do Egito?

Não, não são só as pirâmides. A Grande Pirâmide de Khufu, a Esfinge. Tutankhamon, a única descoberta encontrada completamente intacta, e as múmias. Todos eles são símbolos do Egito. E eu, arqueólogo, tenho muita sorte por ser o único a trabalhar em todos estes itens. Revelei os segredos de muitas múmias, através da scanerização de múmias. E descobri sobre cada rei como morreu, todas as doenças que teve e muitas coisas desse género. Mas uma grande descoberta que fiz em Luxor, no ano passado, foi a Cidade Dourada. E dentro da cidade, encontrámos o nome Semenechkara. E penso que o nome Semenechkara é na verdade o nome de trono da rainha Nefertiti. E descobri um grande, enorme cemitério, em Luxor, datado de 500 a.C., sobre os cantores do Deus Amon, mulheres e homens, ao serviço da esposa do Deus Amon. Também estou a procurar no Vale dos Reis agora, em busca dos túmulos desaparecidos de reis, como Amenófis I, Tutankhamon II, Ramsés VIII e também o túmulo da Rainha Nefertiti.

George Lucas, que inventou Indiana Jones, veio ver-me. E ele disse: ‘Vim aqui só para lhe perguntar por que é que o seu chapéu é mais famoso do que o chapéu de Harrison Ford?’ Eu disse-lhe que o meu chapéu é um chapéu de arqueólogo a sério e que o chapéu de Harrison Ford não.”

Será o Nilo o segredo da pujança desta antiga civilização?

O rio Nilo é uma fonte de vida para o Egito. E ajudou esta civilização. Mas, na verdade, o que ajudou a criar o Antigo Egito foi a única coisa: a crença na vida após a morte. A crença na vida após a morte construiu o Egito. Porque os egípcios tinham pedras para construir pirâmides e túmulos. O Nilo para transportar as pedras. E o Nilo, claro, sempre foi também uma fonte importante para a vida do povo.

Referiu que o Egito e a egiptologia são famosos em todo o mundo, até mesmo através das peças em muitos museus em todo o mundo. Ainda existe o projeto de recuperação de peças emblemáticas como a Pedra de Roseta, que está em Londres, ou o busto de Nefertiti, que está em Berlim?

Sim. Quando era chefe do Departamento de Antiguidades e ministro, consegui que fossem devolvidos 6000 artefactos roubados do Egito. E foi por isso que fui escolhido em 2006 pela revista Time como uma das pessoas mais influentes, pela forma como recuperei a herança do Egito. Em 2010, enviei uma carta a Berlim a pedir a devolução de Nefertiti. Mas tivemos logo depois a revolução no Egito. E eu realmente não consegui acompanhar o processo. Mas agora existem duas petições. Uma petição pelo regresso da Pedra de Roseta do Museu Britânico e outra pelo regresso do Zodíaco do Louvre, em Paris. E no dia 7 de setembro, fiz outra petição para pedir a devolução do busto de Nefertiti.

Estes três são as peças mais importantes fora do Egito?

Sim, creio. Não estou a pedir que tudo volte, que tudo seja devolvido. Estou a pedir três peças. A casa deles deveria ser o grande museu que construí no Egito. As duas petições foram já assinadas por 300 000 pessoas. Temos jovens a circular por todo o lado para conseguir em assinaturas de estrangeiros e de egípcios. Daqui a dois meses chegarei a um milhão. Quando atingir um milhão de assinaturas, terei um advogado, um advogado francês, voluntário para trabalhar comigo e pedirei oficial e publicamente que devolvam as três peças. E o mais importante é que o nosso presidente apoiou estas petições. Vou fazer um grande alarido por todo o lado, porque os europeus começam agora a despertar. Destruíram os monumentos de África. [Emmanuel] Macron, o presidente francês, disse que chegou a altura de anunciar que realmente os europeus causaram danos a África. A Etiópia, tal como a Grécia, está a solicitar oficialmente artefactos do Museu Britânico. Depois, quando atingirmos o milhão para as duas petições, pedirei oficialmente a devolução das três peças ao Egito. Não estou a pedir mais nada. Especificamente estes três.

“Vamos trabalhar para trazer uma grande exposição do Antigo Egito para ser exibida pela primeira vez na vossa bela capital, Lisboa.”

O destino desejado é o novo Museu do Cairo?

O novo Grande Museu do Egito. Sabe, eu construí esse museu. E eu estava a planear inaugurá-lo antes. Mas o problema que tivemos foi que não conseguimos fazer isso. Deixei o meu emprego, mas agora estou no conselho de administração, que responde ao presidente. Inaugurámos parcialmente este museu há um mês. Significa que agora qualquer pessoa pode ir lá, ser recebido por Ramsés II. Grande escadaria, 100 estátuas de reis, e 12 galerias, repletas de belos artefactos. No dia 3 de julho, terá lugar a grande inauguração da exposição, com a exibição dos artefactos de Tutankhamon,algo que conquistará os corações das pessoas vindas de todo o mundo. E o Egito fará 10 dias de grande celebração. E o presidente pedirá que reis, rainhas e presidentes compareçam na inauguração deste museu.

Comemoramos agora os 50 anos do restabelecimento das relações entre Portugal e o Egito, uma das razões da sua palestra em Lisboa. E há muita cooperação internacional ao nível da egiptologia, incluindo arqueólogos portugueses como Maria Helena Trindade Lopes e Francisco Caramelo. É importante para o Egito manter esta cooperação internacional?

Sim, estamos a cooperar com muitos países. Com Portugal também. E tenho um amigo que está a trabalhar comigo em Tebas, e também em Luxor agora. E estou muito feliz por termos uma boa relação com Portugal. Entregaram-me dois títulos de Doutoramento Honoris Causa em Portugal, um deles da Universidade Nova de Lisboa. E nós pensámos, estive a falar disto com o nosso embaixador em Portugal, que com estes 50 anos de boa relação precisamos de uma exposição em Lisboa. E vamos trabalhar para trazer uma grande exposição do Antigo Egito para ser exibida pela primeira vez na vossa bela capital, Lisboa.

Há data para essa exposição?

Não será este ano, mas creio que talvez no próximo ano. Temos de providenciar esta exposição.

Como reage quando as pessoas o associam a Indiana Jones?

Sabe, isso deixa-me feliz, pois, como arqueólogo, é muito difícil ser conhecido. Mas estou feliz por ter-me tornado conhecido em todo o mundo por causa das minhas aventuras na arqueologia. E digo-vos, George Lucas, que inventou Indiana Jones, veio ver-me. E ele disse: “Vim aqui só para lhe perguntar por que é que o seu chapéu é mais famoso do que o chapéu de Harrison Ford?” Eu disse-lhe que o meu chapéu é um chapéu de arqueólogo a sério e que o chapéu de Harrison Ford não. Portanto, acho mesmo que isto prova que conquistei os corações das pessoas em todos os lugares. E quero dizer que em maio, junho e julho deste ano irei à América e ao Canadá, dando 33 palestras, para anunciar todas as grandes descobertas que estou a fazer agora. E faremos com que, em cada cidade, pelo menos 2000 pessoas venham testemunhar o grande mistério do Antigo Egito.

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