O filme Três Dias sem Deus, tem a particularidade de ser a primeira longa metragem de ficção portuguesa dirigida por uma mulher e de ter representado Portugal na primeira edição do Festival de Cinema de Cannes, em 1946. A película integral não sobreviveu à passagem do tempo, e dos 102 minutos que teria originalmente, preservaram-se 32 minutos. Mas apenas de imagens, porque do som não restou nada, com exceção do que se ouve num trailer da película, encontrado durante o processo de digitalização, que foi feito para a sua estreia no Rio de Janeiro, no Brasil, em 1949. .A realizadora, Bárbara Virgínia, também coassina o argumento deste filme no qual interpreta Lídia, uma das protagonistas, juntamente com João Perry, que faz de Paulo Belforte, e de Linda Rosa, no papel de Isabel Belforte.Foi com esta película que a Cinemateca Portuguesa celebrou esta quinta-feira, dia 18, a meta de digitalização de mil filmes portugueses no âmbito do projeto financiado pelo Plano de Recuperação e Resiliência (PRR) em quase 11 milhões de euros, e que começou em 2022 e ainda prosseguirá por mais três meses. É o milésimo filme que passa do analógico para o digital ao abrigo desta medida do PRR, ou um deles. “É difícil obter o milésimo, porque como estamos a trabalhar com vários laboratórios, se calhar chegaram diferentes filmes para preencher o milésimo. É verdade que apeteceu-nos que este filme fosse o milésimo também”, diz ao DN Rui Machado, o diretor da Cinemateca. E porquê? “Porque estava mesmo a ser terminado, é a primeira a longa-metragem realizada por uma mulher e é um filme que tem imensos problemas patrimoniais. Também é importante para nós dizermos porque existe uma cinemateca. E porque é mesmo necessário digitalizar, porque senão estes bocadinhos de filme que temos não eram vistos em lado nenhum”.E foi mesmo um “bocadinho” de Três Dias sem Deus, mais concretamente 14 minutos, legendados, que a Cinemateca exibiu, numa cerimónia que contou com a presença da ministra da Cultura. Tanto Margarida Balseiro Lopes como Rui Machado sublinharam a importância da digitalização do património cinematográfico nacional para que circule e seja visto por mais pessoas. “Hoje, qualquer um destes filmes, através deste trabalho de digitalização, pode ser programado e exibido em qualquer sala de cinema que tenha um projetor digital DCP [Digital Cinema Package, o padrão para exibir filmes em salas de cinema], sublinhou Rui Machado. A digitalização permite também a exibição televisiva, em streaming e nas plataformas vídeo on demand (VOD).“O acesso e difusão de todo este património digitalizado” será agora a grande prioridade da Cinemateca, sublinhou Rui Machado. A lista de todos os filmes digitalizados passou a estar disponível numa nova página no site da instituição. "Onde se poderá consultar a lista de todos os filmes portugueses digitalizados, com informação detalhada sobre cada título, sobre a sua digitalização e, muito importante, as condições de acesso às cópias digitais para os diferentes filmes. Julgamos que esta ferramenta de consulta será essencial para qualquer programador de cinema de património, que terá, sim, a vida facilitada para a programação e divulgação do cinema português nas diferentes janelas de exibição e acesso que hoje o digital permite", sublinhou o diretor da Cinemateca.Celebrou-se a chegada à meta dos mil filmes digitalizados, mas na realidade já se passaram 1030 películas do analógico para o digital no âmbito da medida do PRR, e, nos próximos meses, deverão ainda ser concluídos entre mais de 100 a 200, colocando o número final em cerca de 1200 filmes digitalizados. Finda a medida do PRR, o que ficará ainda por fazer? “Ao nível das longas, à partida, vai ficar muito pouca coisa para fazer. Tudo o que são longas de ficção. Depois ainda há o universo de curtas-metragens, que ainda vai ser necessário digitalizar, alguns milhares, estou a incluir atualidades, documentários do Estado Novo, aqueles documentários de cinema de propaganda, e algumas ficções”, diz o diretor da Cinemateca. “Haverá sempre vida para além do PRR, com menos meios, é certo, mas vamos continuar a digitalizar mais filmes portugueses”, garante. .Avatar: o fim da utopia? .'Na Terra dos Nossos Irmãos'. Histórias de afegãos em cenários do Irão