Exclusivo Quando a guerra nunca acaba
Onoda, 10 000 Noites na Selva, de Arthur Harari, retrata o impressionante caso verídico de um oficial japonês que não acreditou no fim da II Guerra Mundial, mantendo-se em missão durante quase 30 anos.
Quando o jovem Hiroo Onoda (1922-2014) chegou à ilha de Lubang nas Filipinas, em 1945, já a guerra estava praticamente perdida. A maioria dos soldados japoneses rendia-se, morria de doenças ou pelas próprias mãos, sendo esta última considerada, na sua cultura militar, a mais honrada forma de morrer no campo de batalha. Mas Onoda não foi treinado assim. Na qualidade de aspirante a piloto que se amedrontou face a uma missão kamikaze, ele acabou por ser recrutado para a chamada "guerra secreta", que se fazia com outro tipo de preparação mental. A sua glória, também secreta, seria manter-se vivo - mais precisamente, estava proibido de morrer - à espera de ser resgatado.
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É por este ângulo, o de uma mentalidade adestrada para decifrar o real como uma dissimulação do inimigo, que se contempla o protagonista de Onoda, 10 000 Noites na Selva, segunda longa-metragem do francês Arthur Harari. Um homem do Exército Imperial japonês que durante 29 anos viveu na selva filipina, após o fim da Segunda Guerra Mundial, convencido de que a sua missão era para continuar. Conseguiu reunir mais três soldados à volta do seu delírio disciplinado e liderou-os num regime de sobrevivência que passava por pequenos ataques de guerrilha contra os habitantes da ilha - na grande ilusão destes homens, a ilha converteu-se mesmo num território mapeado pelos próprios, que deram nomes a várias zonas. Mas ao longo das quase três décadas de estado de guerra sem guerra, à espera de reforços imaginários, o bando foi desaparecendo até restar só Onoda, que em 1974 depôs, finalmente, as armas. Uma circunstância que, pelo choque com a realidade, requeria a prova máxima: Onoda exigiu fazê-lo na presença do antigo Major que o tinha treinado.