A escultura Figo, de 2017, de Paula Rego, é um dos destaques deste leilão de peças raras e históricas da Bordallo Pinheiro, com um valor base de licitação de 7500 euros. O preço de lançamento, naquele ano, foi de 3500 euros e a peça depressa esgotou. Elsa Rebelo, diretora artística e criativa da Bordallo Pinheiro e ceramista, explica que a escultura nasceu de um convite que ela fez à artista em 2016 para fazer uma peça para a série WWB - WorldWide Bordallianos, que junta nomes nacionais e internacionais das artes plásticas, design e moda. Trata-se do número 30 de 125 destas esculturas que foram produzidas em faiança, na Fábrica Bordallo Pinheiro. A artista plástica radicada em Londres o aceitou o convite, mas pouco depois teve uma queda e foi hospitalizada. Elsa Rebelo pensou que o projeto seria abandonado, mas tal não aconteceu. “Nick Willing, o filho, foi o interlocutor e ele disse que a mãe queria fazer um figo em cerâmica a partir de uma escultura têxtil que estava na casa dela no Estoril”, explica a diretora artística. .“É um figo incrível em escultura têxtil, bordado com pontinhos minuciosos, pela Paula Rego, penso que dos anos 1960”, explica Elsa Rebelo, que foi à casa da artista buscar a obra e levá-la para a fábrica. Na sala de modelação começou o processo de criação do figo em faiança Bordallo. “Foi uma conversa entre mim e ela através do filho, porque ela estava hospitalizada, e quase todos os dias trocávamos mensagens ou fotografias, e foi assim o processo criativo”. .Sem agulhas e linhas usadas para bordar, Elsa Rebelo recorreu às texturas tradicionais da cerâmica bordalliana, o areado, o musgado e as verguinhas. Quanto às cores, havia muitas na escultura têxtil que serviu de modelo. “Era tão rica, mas tão rica em cores, que decidimos que em termos de cor íamos tentar replicar. E então tentámos criar fórmulas para os vidrados da cor dos bordados da Paula Rego, porque cada cor tem uma fórmula específica. São mais de 30 cores que temos aqui, dentro dos rosas, do salmão, e depois o verde Caldas tradicional, bem bordalliano. E foi assim que nasceu o Figo”. . A Elsa Rebelo fez uma primeira prova de autor que Paula Rego aprovou, mas a ceramista achou que podia fazer melhor, e realizou uma segunda. “E eles adoraram, disseram Elsa, não mexa mais, é este”. E acabaram por ser feitas 125 cópias para marcar os 125 anos da fábrica criada por Raphael Bordallo Pinheiro em 1884. A escultura de suspensão em faiança foi exposta na Casa das Histórias Paula Rego, em Cascais, e mais recentemente na exposição Entre os vossos dentes, que juntou obras de Adriana Varejão e Paula Rego no Centro de Arte Moderna da Gulbenkian. A expectativa de Miguel Cabral de Moncada, sócio-gerente da Cabral Moncada Leilões, é que o Figo de Paula Rego seja arrematado por entre dez a 12 mil euros, ou até mais. “Se atingir os 15 mil euros não fico de boca aberta”, diz o leiloeiro. E isso porque a peça pode interessar não apenas aos colecionadores de faiança Bordallo Pinheiro, mas também a instituições de arte contemporânea. . A escultura de Paula Rego é apenas uma das 153 peças Bordallo Pinheiro, com valor base de 72.350 euros, que vão a leilão no próximo sábado na Cabral Moncada Leilões, em Lisboa. Será o primeiro grande leilão da marca das Caldas da Rainha e as peças vieram de 20 proprietários. A conta é feita por Miguel Cabral de Moncada, que detalha ainda que 50 são de apenas um proprietário, que recebeu uma herança que incluía a coleção bordalliana. Outro colecionador tem 35 peças, outro 17, outro dez, outro nove bens, e dez proprietários têm uma peça só. O processo começou em fevereiro com uma campanha de divulgação que ficou fechado em setembro. As pessoas começaram a contactar a leiloeira, e segundo Miguel Cabral de Moncada, foram vistas cerca de 500 peças, 200 foram logo rejeitadas por não se enquadrarem no padrão do leilão, outras 150 não foram aceites por já haver uma igual ou semelhante, ou por estarem em mau estado de conservação. Também só foram consideradas peças cuja autenticidade foi comprovada. “Este leilão não é possível realizar-se sem peritagem interna da própria Bordallo Pinheiro. Houve uma dezena de bens que foram rejeitados, porque não conseguimos comprovar, para lá de qualquer dúvida, que foram produzidos na Bordallo Pinheiro”, diz o leiloeiro. E há entre 20 e 30 peças que não vão estar no leilão porque os proprietários não aceitaram o valor de licitação proposto. .A ideia para fazer este que é o “1º Grande Leilão Bordallo Pinheiro”, como se intitula o catálogo, foi do administrador com o pelouro do marketing da Vista Alegre (a que pertence a Bordallo Pinheiro), depois do sucesso de um leilão da Vista Alegre realizado em outubro do ano passado. O leilão marca os 120 anos da morte de Raphael Bordallo Pinheiro e é um acontecimento pouco visto. “Um leilão temático de uma empresa produtora de obras de arte e bens artísticos como a Vista Alegre [201 anos] e agora a Bordallo Pinheiro [141 anos] é uma coisa muito rara de se fazer em qualquer parte do mundo. Há muito poucos. Se forem olhar para o panorama dos leilões mundiais, encontram isto rarissimamente. Estamos a falar de uma única empresa. A maior parte das empresas acabam por fechar, falir, ser compradas e incorporadas noutras coisas”, sublinha Miguel Cabral de Moncada. Um leilão com peças de uma única marca “só é possível quando a empresa conseguiu ganhar uma notoriedade tal - que deriva da qualidade e diversidade da produção, e da longevidade -, para ter fãs suficientes para que tenhamos aqui um grupo enorme de pessoas a querer comprar. Logo à cabeça temos um conjunto de pessoas a querer vender”, acrescenta. . A peça mais antiga das 153 é um prato decorativo de suspensão com cogumelos, pinhas e musgo. Em faiança das Caldas, como não podia deixar de ser, foi feito em 1887 e é um modelo do próprio Raphael Bordallo Pinheiro. Tem uma base de licitação de 900 euros. Para a diretora artística fábrica das Caldas da Rainha, Elsa Rebelo, “este prato é uma raridade, é uma joia, é material mais que nobre.”As peças que vão a leilão podem ser vistas na Cabral Moncada Leilões, em Lisboa, esta quinta e sexta-feira, entre as 14 e 19 horas, e também no sábado, dia 22, de manhã. .Painéis de São Vicente ganham nova vida no silêncio de um museu vazio.Do público inquieto ao “milagre” de Mafra. Museu da Música reabre as portas