A metáfora é diabolicamente divertida: a televisão como fonte do mal ou como o Diabo, ele mesmo, dá-se bem num direto. Os australianos Cairnes não estão a inventar a pólvora, sobretudo se pensarmos que Tobe Hooper e Hideo Nakata, respetivamente com Poltergeist - O Fenómeno e Ring - A Maldição, já tinham proposto o mesmo, embora tenha sido Videodrome, de David Cronenberg, o filme de terror seminal a fazer um exorcismo dos poderes diabólicos da caixa mágica. Pois bem, aqui estamos sempre cientes de que este é um jogo de terror, mas é o sentido de ironia a controlar o conceito - o high-concept movie nas suas sete quintas, em especial porque estamos literalmente dentro da emissão de um talkshow, o Night Owls, programa do turno da noite que precisa de audiências..Os manos Cairnes querem sobretudo falar da televisão americana e da cultura do sensacionalismo dos takshows da década de 1970 e inventam este tour de force: o que vemos é literalmente a emissão do Dia das Bruxas desse programa e, em vez da publicidade nas pausas, temos imagens dos bastidores de uma suposta câmara de making-of. Um engenho levado aos mais ínfimos detalhes, quase sempre com um olhar de gozo perante os clichés de um espetáculo televisivo feito para ter audiências à viva força..Subtilmente, vamos percebendo que o anfitrião desta espécie de Noites Marcianas tem problemas pessoais: está viúvo, perde sempre as audiências para Johnny Carson e quer sobreviver neste negócio. Neste direto joga a carreira quando leva à emissão uma psicóloga do paranormal que traz também uma adolescente que se diz ser recetora do demónio. A dada altura, as câmara talvez não mintam: a menina, à boa maneira do Exorcista, muda de voz, levita e torna-se o Diabo..A premissa sabe gerir bem as expectativas do conto da lenda de Fausto, ou seja, a televisão, como sempre, a vender a alma ao Diabo. Está tudo muito bem e os primeiros 40 minutos agarram-nos com força. O problema é o argumento insistir e repisar nas coordenadas do género - a sua marca de horror movie é precisamente a sua toxidade frágil. A dada altura, fatiga e fica sempre longe de meter medo, não obstante a habilidade na recriação de uma época e dos seus costumes psicológicos. O seu último terço é um daqueles casos flagrantes que a quantidade não é qualidade. Os efeitos visuais e a inesperada carga sangrenta parecem de outro filme, são autenticamente concessão, já para não referir que nesse clímax excessivo parece imperar um ridículo involuntário..No meio de uma vaga de filme de terror de autor, o tal elevated horror, Late Night with The Devil, por ter uma certa originalidade à partida, tornou-se um media hype. Desta vez, como em muitos casos, há que não acreditar no hype, ainda que seja um objeto que deixe ao espectador a bizantina questão de ainda ir na conversa das miudezas das imagens de arquivo perdidas, a estética do espólio da lost footage..David Dastmalchian (os fãs de Suicide Squad adoram-no), o protagonista, tem daqueles papéis que faz uma carreira. Ao menos isso…