Nascido em Bailleul, no norte de França, em 1958, Bruno Dumont é autor de uma filmografia tão singular quanto desequilibrada. Seja como for, se há epíteto que ele não merece é o de cineasta conformado, muito menos repetitivo. Agora, dir-se-ia “vindo do nada”, podemos redescobri-lo através de uma insólita fábula de ficção científica, O Império, revelada no Festival de Berlim de 2024, onde recebeu o Prémio do Júri.Enfim, não simplifiquemos. Os cenários de O Império provêm de uma região campestre, ligada à chamada Côte d’Opale, próximo da zona onde o cineasta nasceu, e marcam presença em várias das suas longas-metragens, a começar pela epopeia moral que é L’Humanité, Grande Prémio de Cannes em 1999. Numa dessas longas-metragens, P’tit Quinquin (2014), que também existe no formato de mini-série televisiva, encontrávamos mesmo duas figuras burlescas da polícia local – o comandante Van der Weyden e o tenente Carpentier – que reaparecem em O Império interpretados pelos mesmos actores (Bernard Pruvost e Philippe Jore, respectivamente).O dispositivo, sendo esquemático, não deixa de ser sugestivo. Há duas “raças” de invasores da Terra que se confundem com os habitantes humanos: os “0s” (zeros) querem preparar as condições para a chegada de um messias e os “1s” (uns) tentam impedi-los de consumar o seu domínio imperial... As coisas baralham-se porque, em boa verdade, alguns “0s” e “1s” até alimentam uma certa simpatia pela estupidez dos terráqueos, ao mesmo tempo que um homem dos primeiros e uma mulher dos segundos se apaixonam ou, pelo menos, partilham aquilo a que também dão o nome de sexo...Dumont não será um grande admirador das qualidades dos humanos e O Império, para lá da sua paródia a “guerras das estrelas” e afins, expõe a sua misantropia num tom sarcástico bem diferente dos seus filmes trágicos, incluindo o já citado L’Humanité e Flandres (2006), também distinguido com o Grande Prémio de Cannes. Aliás, a sua veia moralista tende a limitar a crueza realista de alguns dos seus filmes, por vezes derivando para um artifício caricatural que se esgota ao fim de poucos minutos – assim acontecia no seu título anterior, France (2021), uma sátira política com Léa Seydoux.É pena que, agora, as ironias desta ficção científica não consigam superar os esquematismos de tal visão, até porque há componentes que, pura e simplesmente, não funcionam – é o caso da exuberante e desastrosa composição de Fabrice Luchini na figura maligna de Belzebu, e também da concepção cenográfica da sua corte como um “duplo” de Versalhes. Nos seus melhores momentos, O Império tem qualquer coisa de conto moral futurista vivido na melancolia de paisagens rurais do presente..'Memórias de um Caracol'. Um filme de animação a pensar nos adultos.'Visita de Estudo'. Na intimidade de uma escola da Bósnia