Okuda San Miguel a trabalhar nas obras que trouxe à exposição de Lisboa.
Okuda San Miguel a trabalhar nas obras que trouxe à exposição de Lisboa.Jeosm

“Não sinto que a Inteligência Artificial seja uma ameaça”

O artista espanhol Okuda San Miguel, conhecido pelas figuras geométricas e multicolores, está a usar IA no seu trabalho e o resultado está na exposição inaugurada na passada quarta-feira, em Lisboa.
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Para o artista espanhol Okuda San Miguel a Inteligência Artificial (IA) é apenas mais uma tecnologia à disposição dos artistas, com a qual tem vindo a experimentar e que utilizou na exposição Interdimensional Landscape que inaugurou em Lisboa, na galeria Underdogs. “Eu não a sinto que a IA seja uma ameaça. Sinto que é uma ferramenta maravilhosa, pelo menos eu estou a vivê-la assim, igual a todos os elementos tecnológicos que têm agora os artistas. Uma mais, uma tecnologia mais para os artistas”, diz ao DN.

Okuda San Miguel é um artista urbano conhecido pelas suas figuras e estruturas geométricas e multicolores, que além de expôr em galerias tem murais e esculturas em locais públicos em vários países do mundo, como França, Estados Unidos, Brasil, Rússia ou China.

Ancestral retro Mirage (2019), Rússia.
Ancestral retro Mirage (2019), Rússia.D.R.

Nesta exposição em Portugal, o artista exibe 17 obras inéditas, entre pinturas e esculturas, e explica até que ponto utilizou a Inteligência Artifical. “Eu marquei as linhas que a IA me propôs, mas depois eu fui mudando, porque a Inteligência Artificial nunca pode ser o artista, o artista é único. A essas linhas eu depois fui adicionando os elementos que me pedia o avanço da obra e, sobretudo, colocando as impressões mais ajustadas à minha identidade e à minha linguagem”.

Alem disso, acrescenta, “também usamos a IA aqui nesta exposição para mostrar um pouco como aparece uma das esculturas que lembra as letras do grafite dos meus primeiros anos, no final dos anos 1990, 2000, as letras tridimensionais do grafite que eu fazia. Usei algumas dessas letras e mostro como a Inteligência Artificial me gerou a transição para esta última escultura 3D”.

Um dos quadros da exposição na galeria Underdogs, em Lisboa.
Um dos quadros da exposição na galeria Underdogs, em Lisboa.Carla Ribeiro (DN/de)

E há ainda um convite para os visitantes interagirem com a tecnologia. “Estamos a propor nesta exposição um jogo para as pessoas virem brincar com a Inteligência Artificial, como eu brinquei. Quer dizer, que lhe contem as ideias de que gostam para que a IA proponha uma obra”.

A crescente digitalização do mundo e o esbatimento das fronteiras entre o que é real e virtual é um dos temas que aborda no seu trabalho. “Pertenço à geração que está a viver a transformação do mundo físico para o mundo virtual, do mundo mais real para o mundo mais digital”, diz ao DN. “Há jovens que gastam mais dinheiro nas roupas parao seu avatar ou para o seu eu virtual do que para eles mesmos. Isto faz-me pensar muito. Acho que estas obras o que propõem é uma paisagem interdimensional, no meio de vários mundos, do espiritual, do virtual, do mundo real, do mundo surrealista. Esta exposição pretende transmitir isto que eu sinto, de estar um pouco nesse caminho”.

The New Mona Lisa, paris, 2017.
The New Mona Lisa, paris, 2017.D.R.

Na folha de sala da mostra, patente até 31 de maio, sublinha-se como as obras retratam a diversidade de etnias, géneros, identidades e crenças, de “personagens que vivem num único ecossistema harmonioso e psicadélico”.

O artista espanhol explica que até esta exposição utilizava sobretudo tinta em spray sobre madeira e no caso das esculturas, metal ou fibra. Agora, em Lisboa, há algumas novidades em relação aos materiais, como resinas, espelhos, bocados de metal ou purpurinas nas pinturas. “Estou a introduzir novos materiais. Acho que se vê essa experimentação e essa necessidade de contar essa multiculturalidade e essa diversidade de texturas. A mensagem também está intrínseca nos materiais, de alguma forma”, diz Okuda.

O artista, que nasceu em Santander e tem atelier em Madrid, começou como grafitter e explica como a sua linguagem evoluiu. “As letras da rua foram, pouco a pouco, se geometrizando e tornando-se em triângulos, em losangos, em círculos, simplificando e minimalizando as próprias letras. Dei-me conta que eu podia geometrizar tudo, ou seja, que a minha própria identidade era essa geometria”.

Okuda estudou Artes na Universidade Complutense de Madrid e diz que o uso da cor vem dessa formação. “Tenho o círculo cromático muito dentro de mim para dar esse volume, é como uma espécie de matemática perfeita, quando eu preencho esses triângulos com todo o círculo cromático, é uma espécie de matemática”. A geometria e a cor, diz, “transmitem essa diversidade, essa liberdade e essa digitalização. Essa fractalização de tudo é como se, de alguma forma, digitalizasse tudo.”

Kaos Temple (2015), numa igreja nas Astúrias, em Espanha,
Kaos Temple (2015), numa igreja nas Astúrias, em Espanha,

O artista gosta de intervir em edifícios “abandonados e muito loucos”, e quando se lhe pergunta se há algum em que gostasse especialmente de trabalhar, fala “numa espécie de catedral em forma de frango” na China.

“Já transformei várias igrejas, um castelo e continuo a gostar dessa linha da arquitetura clássica ou da arquitetura muito louca. Ou seja, jogar com a própria arquitetura e que esta diga qual é o guião. Este jogo atrai-me muito, porque é um trabalho muito distinto do de estúdio, onde se planeia uma mensagem, uma composição sobre uma coisa plana, onde não há elementos que distorçam ou que apresentem um desafio. E este desafio interessa-me muito.”

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