Revelado em 2024, em Cannes, como título de abertura da secção “Un Certain Regard”, No Romper da Luz é um filme islandês que surpreende pela serenidade e subtileza com que encena uma perturbante variação sobre o modelo clássico do “trio amoroso”. Agora disponível nas salas portuguesas, a realização de Rúnar Rúnarsson (também responsável pelo argumento) saiu de Cannes sem qualquer consagração oficial, mas acabaria por acumular uma série de distinções, incluindo, no passado mês de abril, nos prémios do cinema islandês (Edda Awards), o troféu de melhor filme do ano.Em boa verdade, o trio central de No Romper da Luz é um duo. Acontece que Diddi (Baldur Einarsson) vive com Klara (Katla Njálsdóttir), mantendo uma relação secreta com Una (Elín Hall). Na cena de abertura, Diddi promete a Una que, nessa mesma noite, vai falar com Klara, pondo fim à sua vida comum — a noite está longe de se passar como ele previra e as duas mulheres vão protagonizar uma aproximação plena de contrastes emocionais, difícil de classificar...Mesmo evitando ser demasiado explícito sobre as peripécias que irão pontuar a existência de todas as personagens, talvez possamos dizer, de forma esquemática mas sugestiva, que este é um filme sobre as convulsões que os movimentos amorosos põem em marcha. Há mesmo em No Romper da Luz uma contida dimensão de conto moral, no sentido em que Una e Klara, “empurradas” para um diálogo a que faltam as palavras adequadas, entrarão num processo de mútua descoberta que, talvez, em última análise, seja um exercício doloroso, mas vital, de autodescoberta.Daí a pormenorizada definição das personagens, tendo como cenário nuclear a escola artística que frequentam. Há mesmo no trabalho de Rúnarsson a preocupação de caracterizar os laços internos de uma pequena comunidade de jovens, cruzando o consumo de grandes quantidades de álcool com a preservação de uma lógica afetiva, com o seu quê de “tribal”, feita de cumplicidades e compromissos.Para o cruzamento de todas essas histórias, No Romper da Luz conta com uma galeria de brilhantes intérpretes, sendo inevitável destacar o misto de transparência e mistério com que Elín Hall compõe a personagem de Una. Na definição material dos ambientes, aliás sublinhando o sentido (literal e metafórico) do título, destaca-se o contributo da direção fotográfica de Sophia Olsson, recuperando uma certa nostalgia cinéfila que não é estranha à utilização da película de 16mm. Enfim, na banda sonora, importa recordar a utilização de Odi et Amo, composição do grande Jóhann Jóhannsson (1969-2018), incluída em Englabörn (2002), o seu primeiro álbum de estúdio. .'Batalha Atrás de Batalha'. A América e o seu paraíso perdido.'Ernest Cole - Perdido e Achado'. Redescobrindo imagens do Apartheid