A Casa de Serralves abres as portas, a partir desta quinta-feira, 3 de julho, à mais extensa exposição do italiano Maurizio Cattelan alguma vez apresentada em Portugal. E sim – “ela” também está cá. A banana colada com fita adesiva à parede, que causou furor mundial, dividiu opiniões e que teve um exemplar vendido por seis milhões de euros num leilão em Nova Iorque, é agora uma das estrelas da mostra Sussurro.Intitulada Comedian, a peça é ao mesmo tempo escandalosa e banal: uma banana, real, presa à parede com uma simples fita de prata. Mas o impacto foi tudo menos simples. A obra tornou-se viral, foi alvo de piadas e ensaios académicos, memes e debates, e gerou uma tempestade de interpretações em redor da banana mais valiosa da história, comprada por um qualquer milionário das criptomoedas.Como frisou Philippe Vergne, diretor do Museu de Serralves, no Porto, e curador da exposição, aquando da apresentação da programação de Serralves para este ano, Comedian obriga o público a escolher um lado: “Cattelan criou um símbolo que força as pessoas a tomarem posição — quer gostem ou não de arte, quer gostem ou não de bananas. É espetacular ou é ridículo. Querem comê-la ou desprezá-la. Não importa: já estão envolvidos.”A banana é só o início.Na visita à imprensa, esta quinta-feira, sem a presença do artista, Vergne não se quis alongar sobre a mais icónica obra, segundo a agência Lusa. “Sei que querem que fale de uma banana, mas não há bananas nesta exposição”, ironizou. “Ninguém fala da fita-cola. A exposição Sussurro — patente até 11 de janeiro de 2026 em Serralves — apresenta 26 obras do irreverente artista italiano, que, desde os anos 1990, tem sido um dos nomes mais falados da arte contemporânea. Concebida especificamente para o espaço da Casa e do Parque de Serralves, a mostra é um diálogo íntimo e provocador entre obra, espaço e visitante. Entre as peças em exibição estão algumas das mais icónicas de Cattelan, para lá da já citada Comedian: o público poderá ver também La Nona Ora (1999), com o Papa atingido por um meteorito; Him (2001), uma representação de Hitler de joelhos em oração; Breath (2021), onde um homem e um cão repousam lado a lado; Daddy Daddy (2008), uma figura de Pinóquio que parece ter-se afogado numa fonte; ou L.O.V.E , a imponente escultura de um pirete apontado à Bolsa de Valores de Milão que agora está instalada em plena fachada da Casa de Serralves, virada para o Parque..Clique nas fotos:. A exposição propõe uma reflexão sobre a História e o nosso tempo, recorrendo ao humor, à sátira e à encenação teatral das peças. “Os momentos de transição — entre a infância e a idade adulta, entre a vida e a morte, entre épocas históricas — são a origem da iconografia de Cattelan”, diz Philippe Vergne. É nesses entretempos que o artista encontra o material para a sua crítica: ao poder, à autoridade, aos sistemas de crença. Mas fá-lo sem entregar verdades feitas, obrigando o visitante a interrogar-se, a decifrar.Charlatão para uns, génio para outros, Maurizio Cattelan é um dos provocadores por excelência da arte contemporânea, mestre na ironia e exímio em testar os limites do aceitável. O título da exposição, Sussurro, é uma provocação subtil, “deliberadamente ambíguo”, descreve Serralves. “Através deste gesto curatorial, a exposição convida os visitantes a refletirem sobre a autoridade institucional, o valor cultural e as forças subtis que moldam a nossa compreensão da arte e da história”..O percurso da exposição está cuidadosamente encenado para desafiar a perceção do público. Aqui, cada obra dialoga com o espaço e com o olhar do visitante, numa coreografia milimétrica entre a surpresa e o desconforto. Ao longo do percurso, o grotesco roça o sublime, o cómico cruza-se com o trágico, e tudo parece dançar à beira do abismo..As peças não estão apenas dentro da Casa. Algumas espalham-se pelo Parque, reforçando o carácter cenográfico da obra de Cattelan, onde tudo — o cenário, o gesto, o ângulo de visão — é parte da narrativa. Outra, o já referido pirete de L.O.V.E, cumprimenta de forma ostensiva todos aqueles que desde o parque observam a fachada da casa.“Sussurro é para Serralves o que as Tentações de Santo Antão de Bosch são para o Museu Nacional de Arte Antiga, em Lisboa. As Tentações de Lisboa têm agora um paralelo: as Tentações do Porto”, equipara o texto que apresenta a exposição no site de Serralves, traçando um paralelo com a pintura de Bosch, “um espetáculo exacerbado da loucura humana, uma visão de um mundo que se aproxima vertiginosamente do fim, tendo como pano de fundo a alegoria bíblica do bem e do mal — uma visão psicótica da decadência, em que pessoas e animais dançam rumo à condenação num cenário em que tudo ardeu.”Produzida pela Fundação de Serralves, com curadoria de Philippe Vergne e coordenação de Giovana Gabriel, Sussurro inclui também um novo catálogo com ensaios de Bernard Blistène, Cecilia Alemani e do próprio Cattelan. O artista, nascido em Pádua em 1960, mantém-se fiel à sua missão: chocar-nos ou fazer-nos rir, mas sobretudo... pensar. Mesmo que, para isso, tenha de colar uma banana à parede..Empresário come banana de obra de arte que comprou por 5,9 milhões de euros