Morreu o realizador e crítico de cinema Bertrand Tavernier

Realizador de <em>Um Domingo no Campo</em> e<em> Uma Viagem pelo Cinema Francês</em>, Tavernier tinha 79 anos e estava à frente do Institut Lumière de Lyon.
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Era um dos ilustres apaixonados pelo cinema, figura incontornável da cultura francesa. Bertrand Tavernier morreu nesta quinta-feira aos 79 anos. O anúncio foi feito pelo Institut Lumière de Lyon, do qual era presidente. Quer pela escrita, quer pelos filmes, fez constantes homenagens à arte que o seduziu desde a juventude.

Filho do poeta e crítico literário René Tavernier, escolheu o cinema quase como "uma maneira inconsciente de me separar do meu pai e ter o meu próprio domínio." E desde cedo, como estudante em Paris, foi um espetador assíduo da Cinemateca onde fundou, com o futuro programador Bernard Martinand e o poeta Yves Martin, o cineclube Nickelodéon. Um espaço que os três amigos usaram para recuperar o cinema americano das décadas de 1940 e 1950 que já não tinha presença nos cinemas. De resto, todos os géneros cinematográficos eram do seu gosto, do western ao noir, passando pela ficção científica e o musical, entre grandes clássicos e obras menores. É também por esta diversidade que se mede um bom cinéfilo.

O amor de Tavernier pelo cinema nunca lhe deixou criar barreiras, ao contrário dos colegas cineastas da Nouvelle Vague (Jean-Luc Godard, François Truffaut, Jacques Rivette...) que se distanciaram da geração anterior. Para ele, o classicismo francês, de Jean Renoir a Julien Duvivier - este último visto como um dos realizadores do chamado "cinema de papá" - era a grande fonte de uma admiração pela Sétima Arte.

Foi, por isso, através da escrita em revistas especializadas, entre as quais a Positif e os Cahiers du Cinéma, que chegou a assessor de imprensa do produtor francês Georges de Beauregard e, através dele, deu os primeiros passos na realização com dois segmentos em filmes coletivos: Les Baisers (1963) e La Chance et l"Amour (1964). Após uma década, fez a sua primeira longa-metragem, O Relojoeiro (1974), drama policial que adapta um romance de Georges Simenon, protagonizado por Philippe Noiret. Um filme que retrata a relação entre um pai e um filho, com eco noutras obras suas como Um Domingo no Campo (1984), Daddy Nostalgie (1990) ou A Filha de D"Artagnan (1994). Já o homem de cultura clássica e olhos postos na modernidade está espelhado na personagem de Michel Piccoli em Geração Estragada (1977). Modernidade, por sinal, cujos excessos televisivos são tema de um filme com a eterna Romy Schneider, A Morte em Direto (1980).

Mas é sobretudo a imagem do cinéfilo inveterado que deixa marca profunda. É autor, por exemplo, do monumental livro Amis américains: entretiens avec les grands auteurs d'Hollywood, que reúne as entrevistas feitas pelo próprio Tavernier, ao longo de meio século, a grandes nomes da indústria americana, e em 2016 deu-nos um dos mais fascinantes documentários sobre a arte de amar os filmes. Uma Viagem Pelo Cinema Francês com Bertrand Tavernier (que está disponível numa bela edição DVD da Midas Filmes) é uma extraordinária partilha, uma viagem apaixonada pelo circuito íntimo da história da cinematografia francesa. Sem dúvida, Tavernier é um dos guardiões da sua memória.

dnot@dn.pt

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