Vale a pena fazer um esquemático resumo daquilo que acontece no filme Memórias de um Caracol, do australiano Adam Elliot. Deparamos com uma saga de dois gémeos, Grace e Gilbert, da infância até à idade adulta, pontuada por muitas formas de violência emocional, a começar pelo facto de a sua mãe ter morrido na sequência do seu nascimento... Depois da morte do pai, são entregues a diferentes famílias de acolhimento: o casal adoptivo de Grace é dado a trocas regulares de parceiros sexuais; quanto a Gilbert, o fundamentalismo religioso da nova família exprime-se através de frequentes gestos de abuso e repressão...Dir-se-ia um drama familiar (ou sobre os destroços de uma família), visando claramente um público adulto. Assim é – com a particularidade, não propriamente secundária, de estarmos perante um filme de desenhos animados. Aliás, não desenhos, mas bonequinhos animados, filmados imagem a imagem através da técnica muito antiga de “stop motion”. Para completar este quadro de peculiaridades, convém não esquecer a proeza que Memórias de um Caracol consegue na actual temporada de prémios: depois das distinções já obtidas (por exemplo, nos festivais de Annecy, Stiges e Londres), está nomeado para o Óscar de melhor filme de animação (a atribuir no dia 2 de março).Ainda a não esquecer: Memórias de um Caracol recebeu nos EUA a classificação “R”, o que significa que os espectadores com menos de 17 anos apenas o poderão ver acompanhados por um adulto. Nos Óscares, esta é apenas a segunda vez que um filme com tal classificação obtém a referida nomeação – aconteceu com Anomalisa, de Duke Johnson e Charlie Kaufman, nos prémios referentes ao ano de produção de 2015.. É pena que Memórias de um Caracol seja um objecto de grande esquematismo narrativo, conduzido pela voz off de Grace, interpretada por Sarah Snook (nossa conhecida através da personagem de Shiv Roy, na série Succession). O facto de Grace ser uma menina fascinada pelos caracóis introduz uma nota insólita e curiosa em toda a sua trajectória, ainda que não impedindo o filme de evoluir como uma colagem simplista de “flashbacks” cujas bizarrias (de personagens, cenários, etc.) não bastam para construir verdadeira tensão dramática.Enfim, a presença de Memórias de um Caracol na corrida dos Óscares justifica um sublinhado (ainda que a maior parte dos analistas americanos aponte Robot Selvagem como principal favorito). Assim, o destaque desta produção australiana é mais um sintoma da internacionalização dos prémios da Academia de Hollywood, abrindo espaços “alternativos” em categorias que foram durante muito tempo um exclusivo das produções americanas – pelo menos neste caso, é mesmo verdade que ser nomeado já constitui um pequeno triunfo..'Visita de Estudo'. Na intimidade de uma escola da Bósnia.'O Império'. Ficção científica em ambiente rural