"Listen" é o candidato português aos Óscares e Netflix quer dominar em toda a linha

<em>Listen</em>, de Ana Rocha e Sousa, é o filme escolhido para a candidatura portuguesa aos Óscares. Uma corrida em que estão também Sacha Baron Cohen, Tom Hanks, Meryl Streep, George Clooney, Sophia Loren, Gary Oldman e Glenn Glose. A Netflix está apostada em arrebanhar várias categorias.
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A temporada dos prémios dos Óscares já têm um favorito: a Netflix. Portugal põe em destaque Listen, o muito premiado filme de Ana Rocha e Sousa nesta competição promovida pela Academia de Hollywood todos os anos.

Para lá do poderio da Netflix e dos seus jogos de poder, a escolha portuguesa para o Óscar de filme internacional é Listen, o aclamado drama sobre adoção forçada no Reino Unido. A Academia portuguesa escolheu o maior sucesso do ano em Portugal também pelo facto de ter um distribuidor internacional poderoso, a Magnolia, capaz de eventualmente fazer um bom lobby junto dos votantes de Hollywood. Fica assim afastada a possibilidade de Vitalina Varela, de Pedro Costa, obra que já é um caso sério de estima na imprensa americana, coisa sempre a ter em conta nesta coisa dos Óscares.

Contudo, conforme o DN sabe, devido ao facto de em Listen o inglês ser uma língua muito falada, a candidatura portuguesa ainda terá de passar por uma análise de elegibilidade por parte da Academia de Hollywood, não se descartando a possibilidade de Portugal ser forçado a escolher outro filme. Nos Óscares, nesta categoria pede-se que a língua seja predominantemente qualquer uma menos o inglês...

Quanto à Netflix, são muitos os filmes com que tenta finalmente chegar à glória suprema dos Óscares. Em 2021, no primeiro ano em que a Academia deu luz verde para os filmes estreados em "streaming" estarem ilegíveis, a aposta é forte e intensa. Depois das muitas nomeações de Roma (que venceu ainda assim a estatueta de melhor realizador) e de The Irishman, é tempo de uma temporada de prémios com o selo do estúdio gerido por Ted Sarandos, um pouco a fazer lembrar o que antigamente Harvey Weinstein e sua Miramax conseguiam...

São mesmo muitos os títulos que o gigante do "streaming" vai colocar "à consideração da Academia". A própria imprensa especializada americana já começou a fazer uma espécie de passadeira vermelha, aliás já começada no verão com Da 5 Bloods- Irmãos de Armas, de Spike Lee, filme de caça-de-tesouro que é afinal uma tomada de consciência do trauma dos afro-americanos no Vietname.

A campanha da Netflix está sobretudo centrada na categoria de melhor ator, onde Delroy Lindo é um favorito natural. A enorme interpretação deste ator habitualmente de elenco é aquilo que de mais consensual tem o filme, mas convém não esquecer o efeito de luto em torno de Chadwick Boseman, que também em Ma Rainey - A Rainha dos Blues, de George C. Wolfe, baseado na peça de teatro de August Wilson, tem um papel que lhe pode dar glória póstuma junto da Academia, neste caso como ator principal.

Ma Rainey - A Rainha dos Blues, com emissão a partir de dezembro, é uma aposta de prestígio da Netflix, uma história sobre músicos de blues nos anos 1920 numa América racista. Em ano de George Floyd, é um dos filmes sobre tensão racial que terá de ter impacto nas contas dos votantes da Academia, embora a Amazon já tenha também um trunfo com Regina King e a sua história panfletária One Night in Miami, onde se imagina um encontro entre Muhammad Ali, Jim Brown, Sam Cook e Malcom X nos anos 1960 para falar sobre racismo.

Mas não é preciso esperar por dezembro para conhecer as tais apostas da Netflix. Por exemplo, já está disponível um dos primeiros favoritos, Os 7 de Chicago, de Aaron Sorkin, que na América dividiu a crítica mas que seguramente vai ter alguns atores na conjetura dos analistas. Sacha Baron Cohen parece estar na linha da frente no papel do ativista "hippie", mas é bem sensato não descartar a interpretação sublime de Mark Rylance e a de Eddie Redmayne. A Academia pode querer voltar à moda dos filmes-de-tribunal..

Destinado a ser um sucesso popular e com muito lobby em torno de Sophia Loren está também já disponível Uma Vida à Sua Frente, de Edoardo Ponti. O filme poderá não ter a qualidade suficiente para ir longe nas nomeações, mas é impensável a Academia ignorar o talento e o valor simbólico da interpretação da mais bela mulher de sempre do cinema italiano. De alguma forma, o filme parece desenhado para o efeito do "grande regresso". Resta saber se o marketing da Netflix aposta na lendária atriz de 86 anos para a categoria principal ou para secundária.

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Talvez possibilidades menores tenha Lamento de uma América em Ruínas, de Ron Howard, drama pouco subtil sobre uma família de saloios do Kentucky. O DN já visionou o filme e pode garantir que é uma das apostas a tresandar a "bluff", mesmo com um elenco onde pontificam Glenn Close e Amy Adams. Close, mesmo em modo de boneco de "avô bruxa", é o melhor de um filme a roçar o histerismo que a Academia já evita. Noutros tempos, com Sally Field à mistura, poderia pegar, agora só mesmo com muito dinheiro investido para a nomeação de Glenn Close como secundária.

O trunfo dos trunfos chega no próximo dia 3 e vai ter nomeações certinhas em todas as categorias. Chama-se Mank e é um grande filme de David Fincher sobre o processo de escrita de Citizen Kane - O Mundo a Seus Pés. Será quase escandaloso se Gary Oldman como um ébrio Herman Mankiewicz não for nomeado...

A existência de um filme como Mank, em que apenas se fala sobre cinema e das memórias da indústria de Hollywood nos anos 1930, e onde Fincher filma como quer a preto e branco numa duração que ultrapassa as duas horas, é um atestado de crédito criativo para a Netflix...

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Logo a seguir, entra no menu dos assinantes, The Prom, de Ryan Murphy, um musical com causa LGBT onde temos Meryl Streep, Nicole Kidman e James Corden à solta numa noite de formatura num liceu onde duas raparigas querem assumir o seu amor. Nesta altura ainda ninguém viu o filme, mas é quase certo que deverá ter mais impacto nos Golden Globes do que nos Óscares...

À última da hora, fora dos EUA, em pleno dia de natal, chega à Netflix outra "bomba" a cheirar a prestígio de "awards season", o western, Notícias do Mundo, de Paul Greengrass, com Tom Hanks. Diz-se que o veterano ator pode voltar a ser nomeado depois de no ano passado ter estado quase com a estatueta nas mãos em Um Amigo Extraordinário. Mais do que nunca, a pandemia a ser amiga da Netflix e a obrigar os estúdios de Hollywood a colocarem o seu produtor em "streaming".

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Também é bom não esquecer, dois dias antes, O Céu da Meia-Noite, de e com George Clooney, filme de ficção-científica, cujo trailer parece sugerir ser mais material de consumo popular, embora qualquer filme de Clooney não possa ser subestimado no que toca a manobras para prémios...

Por fim, os mais cinéfilos poderão contestar por que razão Tudo Acaba Agora não tem aparecido tanto na lista dos filmes desta temporada de prémios, mas a radicalidade deste objeto de Charlie Kaufman talvez ainda seja muito vincada para estas correrias. Em última instância, a Netflix talvez interceda apenas na categoria de melhor argumento adaptado. Kaufman, que não é estranho aos Óscares, desta vez, por certo não se importará de correr por fora.

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