Joan Baez: o cinema revisita memórias da música popular dos EUA.
Joan Baez: o cinema revisita memórias da música popular dos EUA.

Joan Baez: a história, o mito e as canções

Foi há cerca de cinco anos que Joan Baez cumpriu a sua digressão de despedida, pouco antes de celebrar o 80.º aniversário. 'Joan Baez – A Cantiga É uma Arma' parte das imagens dessa digressão para fazer um autorretrato em que as memórias felizes vencem os momentos de desencanto.
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Revelado no Festival de Berlim de 2023, agora lançado nas salas portuguesas pela distribuidora Zero em Comportamento, o documentário Joan Baez – A Cantiga É uma Arma evoca, no início, um célebre aforismo de Gabriel García Márquez: “Todos temos três vidas: a pública, a privada e a secreta.” Logo a seguir, ouvimo-la dizer: “Se eu pudesse escrever a minha história, ninguém saberia se tem alguma coisa a ver com os factos.”

Tudo se passa como se a música nascesse do cruzamento da história com a mitologia. Começamos por ver Joan Baez em sua casa, na Califórnia, lembrando que, para quem, como ela, a consagração chegou muito cedo, o preço (público e privado) a pagar está longe de ser um mar de rosas. Com uma realização tripartida — Miri Navasky, Karen O'Connor e Maeve O'Boyle —, este é, afinal, um filme sobre a tenacidade do trabalho contra as ilusões da fama.

O ponto de partida está carregado de simbolismo: acompanhamos Joan Baez a preparar a sua digressão de despedida, assinalando 55 anos de carreira, pouco depois da celebração do seu 79º aniversário — recorde-se que nasceu em Staten Island, Nova Iorque, a 9 de janeiro de 1941. O seu primeiro álbum em nome próprio (intitulado, justamente, Joan Baez) surgiu em 1960, integrando sobretudo temas tradicionais da folk americana, com novos arranjos, da responsabilidade da própria cantora.

Acompanhando vários momentos emblemáticos dessa derradeira digressão, o documentário vai encontrando rimas temáticas ou emocionais nas memórias mais diversas. Descobrimos, assim, algumas das suas primeiras performances no lendário Club 47, na cidade de Cambridge, no estado do Massachusetts; depois a sua transformação num ícone da música popular; por fim, muito em particular, a relação com Bob Dylan.

Vemo-la, por exemplo, na Rolling Thunder Review, uma digressão com Bob Dylan, que ficou para a história como um momento emblemático de reinvenção de matrizes da música popular. Escutamo-lo a recordar o modo como essa música se transformou num elemento de combate ideológico (“uma arma”, como diz o título português) no interior das convulsões das décadas de 1960/70. Enfim, observamo-lo a comentar as transformações da sua própria música em paralelo com a pesada herança dos sixties, suas ilusões e desilusões.

Em resumo, estamos perante um exemplo feliz de revisitação de um capítulo fundamental da música made in USA, apoiado numa sóbria gestão de materiais de arquivo. Eis três canções (não necessariamente citadas no filme por estas imagens) que podem servir de entrada no universo de Joan Baez:

• IT AIN’T ME BABE
(canção de Bob Dylan, num registo televisivo dos anos 60)

• NEVER LET ME GO
(Rolling Thunder Review, 1975/1976, com Bob Dylan)

• THERE BUT FOR FORTUNE
(canção de Phil Ochs, num concerto de 2004)

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