Isabelle Huppert decide mudar a vida de toda a gente em Sintra
Era uma vez em... Sintra. Pega-se na imperial Isabelle Huppert, chama-se Rui Poças para iluminar as sombras e o nevoeiro da serra e inventa-se uma história de despedida. Chama-se Frankie e é o novo filme de Ira Sachs, cineasta americano que se tornou aclamado com Love is Strange - O Amor é uma Coisa Estranha e Homenzinhos. Crónica de umas férias de família em Sintra, onde a matriarca, uma atriz francesa de sucesso, junta a família e uma amiga para anunciar algo que vai mudar a vida de todos. Frankie (Isabelle Huppert) escolheu a bela Sintra para revelar que está doente. Mas como em qualquer família, há disfunções e relações quebradas. Entre passeios pelos bosques e por atalhos, as três gerações partilham segredos e angústias, tão novas como antigas.
"Foi muito importante para mim estar a competir em Cannes. Foi uma afirmação pessoal! Estar em Cannes é um reconhecimento para um cineasta, além de ser muito prestigiante, põe-me igualmente num diálogo com o melhor do cinema do mundo, algo que me interessa muito. Além do mais, é bom para a carreira comercial do filme", disse-nos Sachs em Cannes, um dia depois de Frankie ter passado na seleção oficial.
O filme, no maior festival do mundo, dividiu opiniões. Mas, gostando-se ou não, colocou como personagem central Sintra, filmada com um encanto particular, mas também denunciando a sua desmedida tendência para o turismo de massas, embora o mais interessante, para além dessa Sintralândia, seja a possibilidade de criar um imaginário de fábula em décors naturais. Como se a beleza natural funcionasse como um ecossistema vivo em redor de uma história de família, onde o carisma matriarcal comanda tudo. E Sintra tem ainda outro engodo: faz-nos respirar de surdina com o sofisticado elemento narrativo do próprio dispositivo coral, onde cada personagem tem o seu tempo. À medida que a câmara vai subindo a serra (no fim, a subida é espantosamente literal), ganha-se mesmo uma elevação mística ou, porque não assumir, sintrense...
Coproduzido pela O Som e a Fúria, de Sandro Aguilar e Luís Urbano, o filme é financiado pelos EUA e França, tendo sido completado antes de Colour Out Of Space, de Richard Stanley, co-produção Portugal/EUA, com Nicolas Cage, todo ele rodado em Sintra, podendo estar a acontecer uma nova tendência de Portugal servir cada vez mais como destino de grandes produções internacionais, embora a mais-valia do filme de Sachs, entre outras, seja a inclusão de Carloto Cotta no elenco. E o português impressiona bastante num papel de um guia de turismo: "O Carloto tem qualquer coisa de leading man. Curiosamente, a sua personagem, por acaso, veio de uma história que ouvi de um empregado do café Pau de Canela sobre o seu próprio casamento... Creio que cria uma certa aura de mistério para o espetador, quase que também poderia ter o seu próprio filme. Era preciso um ator muito forte, sobretudo porque contracena com todos esses grandes atores", confessou o cineasta. Na verdade, além de Huppert, há também Greg Kinnear, Marisa Tomei, Brendan Gleeson ou Pascal Gregory.
Um elenco fortíssimo para uma obra que faz a síntese perfeita entre ligeireza e profundidade, mas que é perita em nunca perder a sua subtileza, mesmo quando expõe a sua amargura. Uma amargura que, felizmente, é sempre contida.
"Frankie não é bem sobre Sintra, é mais sobre pequenos locais interessantes que lá encontrei. Diria que é sobre a Peninha, a Praia das Maçãs, a Pena, a Quinta de São Tiago, entre outros", resume Ira Sachs. Na verdade, Frankie é sobretudo uma "masterclass" sobre como não ser previsível num filme de família.
**** Bom