Aos 82 anos, Isabel Allende, que iniciou a carreira como escritora com o livro A Casa dos Espíritos, em 1982, continua a lançar romances e começa a escrever sempre a 8 de janeiro, o dia em que iniciou o seu livro de estreia. Veio a Portugal apresentar O Meu Nome é Emilia del Valle e, no passado domingo, encheu o grande auditório do CCB . Nesta entrevista ao DN, fala sobre o novo romance, a sua vida e como vê os EUA, onde reside, sob a nova administração Trump.A Isabel Allende diz que é uma "caçadora de histórias". Como surgiu a ideia para o romance que lançou agora, O Meu Nome é Emilia Del Valle? A ideia original foi a guerra civil no Chile. Eu comecei a pesquisar, metade dos materiais vem da investigação, e o meu irmão Juan, que é académico, é um professor retirado de Ciência Política, ajuda-me sempre com a pesquisa. É realmente maravilhoso ter todo esse material como base. E depois posso construir a história e desenvolver os personagens. Eu queria contar a guerra civil de uma perspetiva neutra, não tomando partido por nenhum dos lados. Então pensei que o protagonista tinha de ser um estrangeiro. E depois, claro, eu queria uma voz de mulher, porque as vozes das mulheres nunca estão nos livros de história. E então pensei: vou trazê-la da Califórnia, uma coisa levou à outra, e o personagem apareceu.Mas porque decidiu abordar um momento da história do Chile, o país onde nasceu? Eu sou estrangeira em todos os lugares. E quando volto para o Chile, eu também sou estrangeira, porque eu não moro lá há muito tempo. E o país mudou, e eu também. Eu tenho uma ideia do Chile na minha cabeça e no meu coração que não é real, é um país inventado. Contudo, se me perguntar o que eu sou, eu digo chilena. Porquê não sei, porque eu vivi poucos anos no Chile. Mas é lá que estão as minhas raízes. E, de certa forma, quando eu comecei a escrever a história, e trouxe a minha protagonista para o Chile, percebi que ela encontraria na paisagem, no país, o que eu encontro na paisagem e no país, que é a terra. Há um paralelismo entre a guerra civil chilena, em 1891, entre forças progressistas e conservadoras, que levou o presidente Balmaceda a suicidar-se, e o golpe de Estado de 1973 que destronou Salvador Allende? Há muitos paralelismos, mas a protagonista, Emilia, não pode saber o que vai acontecer 80 anos depois. Foi por isso que me interessei pela guerra civil, mas eu não consigo fazer essa ligação no livro. No livro eu só posso contar a história que ela testemunha, nada mais. Quando um romance é contado na primeira pessoa, é muito limitador, porque só se tem a perspetiva do narrador naquele lugar, o narrador não sabe o que as outras pessoas pensam ou dizem, apenas se ele está presente.Sobre Salvador Allende, que era primo do seu pai, disse certa vez que o maior impacto que ele teve na sua vida foi quando morreu.Sim, a minha família inteira foi dispersa pelo mundo. Os meus irmãos e eu só nos reunimos quando a minha mãe morreu, porque quando o meu padrasto faleceu os meus irmãos não vieram. Eu fui sozinha. E a minha vida mudou completamente. Eu não seria escritora sem a experiência do exílio. .Até que ponto este livro tem elementos biográficos?As pessoas têm apontado que há muitos, mas eu não estava a pensar de todo na minha própria vida quando criei a personagem. Mas, claro, agora que o livro está publicado todos se voltam para mim e dizem que tem paralelos com a minha vida. Eu não conhecia o meu pai, eu tive um padrasto maravilhoso, eu comecei como jornalista, e é isso. Porque ela é alta, tem longas pernas, não tem nada a ver comigo, e é jovem. E é uma mulher forte, que quer ser independente...Mas a maioria das mulheres hoje são assim. . Assume-se feminista, como olha para a condição da mulher atualmente?Eu tenho visto ciclos, e tenho visto que o movimento feminista alcançou muito, mas com alguns recuos. Há momentos em que parece que regredimos. E agora nos Estados Unidos, por exemplo, o Supremo Tribunal eliminou o direito ao aborto que existia há muitas décadas. Depende do Estado, e todos os estados vermelhos estão a eliminá-lo e os estados azuis ainda o têm. Mas há cada vez mais um ataque aos direitos das mulheres. E há lugares como o Afeganistão, onde em 24 horas as mulheres perderam todos os direitos que tinham adquirido na última década. E isso pode acontecer em qualquer lugar. A situação pode mudar muito rapidamente?Muito rapidamente. Primeiro que tudo, acho que hoje as mulheres jovens acham que ser feminista não é sexy. Eu acho que não tem nada a ver com isso. Pode-se ser tão feminina e sexy quanto se quiser, e ainda defender os seus direitos. Elas tomam como garantido algo que podem perder em muito pouco tempo, se não estiverem informadas, conectadas e vigilantes. Voltando ao O Meu Nome é Emilia del Valle, pelo meio do romance aparecem crónicas escritas pela protagonista na qualidade de jornalista. Foi a fórmula que encontrou para relatar factos históricos sobre a guerra civil do Chile?Em alguns casos. Mas eu queria sobretudo desenvolver a personagem. Que tipo de histórias ela escreveria? Em que tipo de histórias estaria ela interessada? E em que tom ela o diria? Porque é que ela se torna uma jornalista tão boa que a partir de certa altura pode usar o seu próprio nome em vez de um nome masculino. Tudo isso é parte do desenvolvimento da personagem.E no fim, depois de passar pela guerra, ela pensa que tudo o que ela escreveu antes era frívolo e refugia-se na natureza. Pode explicar esse final da história?Quando ela sai da Califórnia para ir para a guerra, para ela é uma aventura. E depois encontra-se no campo de batalha com morte e violência e homens feridos e todo o horror da guerra. Ela envolve-se nisso e aí quase morre. Então tudo muda para ela, já não é mais uma aventura, é algo que a muda dramaticamente. E ela está tão confusa, tão traumatizada que precisa encontrar a sua alma e vai para o sul do sul do mundo. Em solidão, onde vai conhecer quem ela é e o que quer fazer. E tudo muda para ela na natureza.Ficamos com a ideia de que ela morre, mas há um epílogo...No meu final ela entra num barco no lago e parte, desaparece no nevoeiro. E o meu editor americano achou que ela morreu. E eu disse que não, ela não morreu, ela só entrou no barco e partiu. Sim, mas isso é uma metáfora para a morte, disse-me ele.E então escreveu o epílogo, mas contrariada?Não, não, não. Foi engraçado, porque o meu editor disse que eu tinha de trazê-la de volta à vida se não queria que ela morresse. Então, o meu marido estava a cozinhar uma omelete, ele não tem ideia do que eu estou a escrever, porque eu escrevo em espanhol e ele não consegue ler. E eu disse: o que achas de uma mulher que entra num barco num lago e desaparece no nevoeiro? Que ela morreu, um final terrível, disse Roger, precisas de um epílogo. Foi assim que aconteceu, enquanto ele cozinhava a omelete. . O seu processo de escrita mantém-se, escreve um primeiro esboço de rajada e depois trabalha nele?Isso era dantes. Isso foi nos primeiros livros, mas desde que trabalho com computador que vou corrigindo e editando à medida que escrevo. Então é muito difícil dizer que esse é o meu primeiro esboço. Porque eu massajei-o tanto que eu não sei o que é o primeiro esboço. Mas há um momento em que penso que o manuscrito está pronto. E depois vai para o meu editor, ou o meu agente. E aí eu recebo algum feedback, não muito, porque eu escrevo em espanhol e vivo em inglês. E com o pouco feedback que recebo procuro fazer as mudanças que talvez sejam necessárias, e é isso. E depois o livro é publicado, vai, e eu nunca penso nele de novo. De qual dos seus livros gosta mais?Eu não me lembro dos meus livros, não sei. Não, eu já os escrevi, porque haveria de os ler? Às vezes os tradutores de outros idiomas perguntam-me sobre um livro que eu escrevi há dez anos e não sei do que eles estão a falar. Eu esqueço-me dos nomes dos personagens, esqueço o que aconteceu. Mas às vezes as personagens voltam noutros romances...Porque essas pessoas são muito intrusivas. Elas voltam contra a minha vontade. E eu reconheço-as, aqui está ele de novo... Para mim, há duas formas de descrever o processo de escrever ficção. Uma é que no chão há mil pedaços de um puzzle, e eu tenho de juntá-los. Isso leva um ano ou dois, para juntar as peças para que elas façam sentido. Mas eu não sei o que vai acontecer até que esteja terminado. Quando está terminado, eu olho e digo: ah, esta é a história. Mas não sei como é que isso acontece. E a outra coisa é: eu entro na história tão profundamente que não tenho vida fora da história. Não quero saber de mais nada. Torna-se como uma obsessão. E depois o livro está terminado e a obsessão desaparece e nunca mais penso nisso de novo. E depois descansa por um tempo ou começa a trabalhar imediatamente?Depende, às vezes termino um livro, digamos, em outubro, e tenho que esperar até 8 de janeiro para começar a escrever outro livro. Se eu tiver uma ideia daquilo que quero começo a investigar, mas muitas vezes não sei. E é nesse momento que começo a ler ficção. E eu devoro ficção para ter ideias e para ver como outras pessoas estão a contar histórias. Eu adoro ler outros escritores, ver como eles fazem.E o que está a ler agora? Há algum autor que a interesse particularmente?Estou a ler muita não ficção, sobre envelhecimento, estou a ler memórias e estou a ler John Boyd, que é um escritor irlandês, um escritor extraordinário. Samanta Schweblin, que é argentina e está a ser traduzida agora para inglês, mas estou a lê-la em espanhol, e outros autores. Tem 24 mil cartas trocadas entre si e a sua mãe, desde 1987, devidamente arquivadas. Vai escrever alguma coisa com base nelas? Uma autobiografia?Não. Estou a escrever um livro de memórias e recorro às cartas para informação, mas não vou publicar nada das cartas. Estou a escrever um livro que é uma memória em três vozes. Eu, a minha mãe e a minha filha. E eu tenho as cartas de ambas, então eu posso ouvir as suas vozes na minha cabeça. O seu próximo lançamento será esse livro de memórias?Não sei, talvez. Estou a tentar terminá-lo, mas é difícil. Sinto-me muito mais confortável a escrever ficção.Como é que vê o seu papel como escritora, como vê a literatura? É para si uma forma de abordar os problemas do mundo?Eu apenas adoro contar uma história. Eu não quero pregar ou passar uma mensagem na minha ficção. Eu escrevo não-ficção para esse propósito e tenho uma fundação para o meu ativismo. Todo o meu ativismo político e ideológico é feito através da minha fundação, nunca na minha ficção. Os meus romances são apenas porque estou envolvida numa história que quero contar, que quero partilhar. E é isso. Não há nenhum outro propósito..Há alguma coisa que gostaria de alcançar ainda na sua carreira de escritora? Não. Eu só quero continuar a contar histórias. Mas nunca foi uma ambição, não o planeei como uma carreira. Tudo aconteceu de um dia para o outro, sem nenhum plano, sem nenhuma intenção. Eu queria ser jornalista.E foi. Poucos anos, e depois tivemos o golpe de Estado e eu não conseguia trabalhar como jornalista na Venezuela, ou sequer nos Estados Unidos. Então tornei-me escritora, penso que por não conseguir ser jornalista. Eu saí do Chile, e por muitos anos trabalhei em coisas diferentes para ganhar a vida, até que em 1981 eu comecei a escrever uma carta para o meu avô que estava a morrer, que se tornou o meu primeiro livro.Eu tinha uma pequena máquina de escrever portátil na bancada da minha cozinha, e eu escrevi ali o meu primeiro livro. Naquela época, claro, não havia computadores. A única forma de fazer uma cópia era com papel de carbono, mas sujava muito e eu não tinha uma cópia, apenas o manuscrito, e não queria perdê-lo, por isso tinha um saco em tela e andei com ele como se fosse um bebé recém-nascido durante quase um ano. Uma vez deixei-o no cabeleireiro e quase morri.E como conseguiu publicá-lo?A minha mãe pensou que a carta parecia um livro. Então ela enviou-o para vários editores na América Latina que ela conhecia. Mas ninguém respondeu às cartas. Eu não recebi nenhum feedback até que alguém disse que eu precisava de um agente literário. E disseram-me que Carmen Balcells, em Barcelona, era a melhor agente literária para literatura em espanhol. Então enviei-o pelo correio. Por essa altura tínhamos feito uma cópia da coisa inteira, a única cópia que eu guardei, e enviei a outra para a Carmen. E a Carmen disse: gosto do livro, vou publicá-lo, mas isso não faz de si um escritor. O escritor é provado no segundo, no terceiro e nos outros livros que se seguem. Ela também disse: e lembre-se, você é uma mulher. Terá de fazer duas ou três vezes o esforço de qualquer homem para obter metade do reconhecimento e respeito. Mas você consegue fazer isso.E que efeito tiveram essas palavras em si?Essas foram as duas coisas de que sempre me lembrei: eu não sou escritora até escrever o livro. E tenho de fazer um grande esforço para ser respeitada. Agora tenho 82 anos, quem liga? E depois de 40 anos a escrever, tenho um nome, mas demorou muito tempo para chegar lá. E a partir do segundo livro começou a acreditar que era escritora e que a literatura seria o seu caminho? Não. No meu terceiro livro comecei a receber os cheques das traduções e disse que poderia a ganhar a vida com isto. Mas antes não deixei o meu emprego. Eu administrava uma escola e mantive o meu emprego, porque eu não sabia se conseguiria suportar a minha família a escrever. Porque poucos escritores o conseguem.Depois de lançar, em 1994, o livro Paula, sobre a morte da sua filha, não conseguiu escrever durante três anos. Voltou alguma vez a ter um bloqueio assim?Não, daquela maneira não. O que eu aprendi depois de não poder escrever por muito tempo, é que podia escrever não ficção. Se eu não tenho a energia ou a paixão para escrever um livro, eu posso sempre voltar à não ficção e, como um jornalista, pesquisar algo e escrever do ponto de vista da não ficção. Isso não precisa de inspiração. Precisa de informação. Então eu nunca tive esse problema de novo. Quando eu estava a escrever A Ilha debaixo do mar, que é sobre a escravatura, eu fiquei doente com a investigação, porque os horrores da escravatura são inimagináveis. O tipo de coisas que pessoas com poder podem fazer quando não têm de prestar contas é assustador. Então eu fiquei doente e disse que não podia continuar, e larguei o livro. Foi a única vez em que larguei um livro. E depois escrevi não ficção, escrevi O Meu País Inventado, e isso desbloqueou-me se consegui voltar ao livro e terminá-lo. Sente os sentimentos das personagens quando escreve?Completamente. E eu sofro, grito, rio. E sou cada um dos personagens. Por isso é muito difícil para mim escrever sobre pessoas com as quais me é difícil identificar. Por exemplo, há muitos romances agora muito interiores, sobre problemas psicológicos... Um casal que está a passar por um divórcio algures em Nova Iorque... Isso não me interessa nada, não porque eu não entenda o que está lá, mas porque não me toca. Mas consigo escrever um livro sobre uma avó no Nepal ou qualquer coisa do género, se houver alguma coisa com a qual me possa conectar.O que a levou aos Estados Unidos e porque decidiu tornar-se cidadã norte-americana?Apaixonei-me por um homem. Estava de passagem numa digressão literária, conheci o Willy e decidi passar uma semana com ele e tirá-lo do meu sistema. Acabámos por casar e vivemos juntos 28 anos. Tornei-me cidadã norte-americana porque queria trazer os meus filhos. Os meus filhos já eram adultos, Paula [e Nicolás], ambos estavam casados e eu queria trazê-los. E estava com o Willy há muito tempo.Casou-se recentemente pela terceira vez com um homem que a ouviu na rádio e que nunca mais a largou. Sabe o que é que o atraiu nessa conversa?Eu não tenho ideia, não me lembro. Ele ouviu-me na rádio, e depois escreveu para a minha fundação. E começou a escrever todos os dias e todas as noites, durante seis meses. Eu nunca o vi, nunca falei com ele ao telefone. E depois, quando fui a Nova Iorque fazer algo sobre direitos reprodutivos, disse que tinha de conhecer este homem. Estava na hora. Então conhecemo-nos e em menos de 24 horas ele queria casar comigo. E eu disse, casar, estás a brincar? Nesta idade? Não, mas podemos ser amantes se fores para a Califórnia, porque eu não vou mudar. Então ele começou a ir à Califórnia aos fins de semana, mas são seis horas de avião, somos demasiado velhos para isso. Então ele acabou por vender a casa. Naquela altura, eu estava a morar numa casa muito pequena, com os meus dois cães, porque o meu ex-marido morreu e eu fiquei com o cão dele. Então, uma casa muito pequena, com um quarto e dois cachorros...Ele veio, vendeu a casa, deu tudo, e mudou-se para a minha casa com duas bicicletas, as roupas dele, e alguns copos de cristal, não sei porquê. Eu disse-lhe: eu tenho copos, não te preocupes, mas ele trouxe os seus copos. E começámos a morar nesta pequena casa, e depois veio a covid e ficámos aqui presos, resguardámo-nos em casa, trabalhando remotamente, online, mas a relação sobreviveu. E ele insistiu e insistiu que deveríamos casar, porque se algo acontecesse a um de nós, a outra pessoa deveria ser capaz de tomar decisões.Teme que a democracia esteja em risco nos EUA sob a administração Trump? Absolutamente. Não pela primeira vez, mas ela está em perigo. E é uma viragem para a direita. Mas é um movimento contra o que eles chamam as 'elites'. E isso é ciência, intelecto, universidades, academia. Hoje li no The New York Times que 10% dos americanos acreditam que a Terra é plana, 10%. Há muito tempo que está provado que a terra é redonda. E há essa rejeição do conhecimento. É uma coisa má nos Estados Unidos ser um intelectual. Vai permanecer nos Estados Unidos?Eu vou ficar nos Estados Unidos o tempo que puder, porque eu tenho uma fundação e quero mantê-la a funcionar. Mas também porque a minha vida é linda. Eu moro numa casa que está na água, numa lagoa. Tenho dois cães, uma vida muito tranquila com o meu marido. Se pudéssemos só morar nessa bolha... mas eu sei que não podemos, porque eu estou no mundo. Eu falo, faço ativismo, tenho a fundação. Portanto, ficarei o máximo tempo que puder. E depois, se eu tiver que partir, para onde irei? Penso que será para o sul do Chile, o lugar para onde ela vai [Emilia Del Valle, a protagonista do seu novo romance]. E esteve lá, nessa região do Chile, para escrever este livro?Eu vou sempre aos lugares que descrevo nos meus livros. Mas eu já lá estive muitas vezes. E a primeira vez que eu fui para o sul, foi quando eu tinha cerca de dez anos, com meu avô. O meu avô tinha ovelhas na Patagónia argentina. Então, uma vez por ano, ele ia de comboio para o sul, até onde o comboio ia, porque ele não chegava até lá abaixo. E depois de camião, e depois de mula e a cavalo, atravessando a cordilheira até ao outro lado. Toda essa viagem levava mais de uma semana. E eu lembro-me da travessia dos Andes. E aquela paisagem, aquele lugar, ficou na minha mente e no meu coração para sempre. .A literatura também pode curar.Quando é a máquina que valida o ser humano