Três filmes para devorar neste arranque do IndieLisboa

O melhor que o DN já viu do primeiro fim de semana do 16.º IndieLisboa, festival que tem uma das mais apelativas programações dos últimos anos.
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O IndieLisboa está a fazer 16 anos e nesta edição quer ser contaminado com o novo cinema independente do mundo. Um programa com chamarizes fortes para chamar público novo e encetar uma reflexão sobre temas sociais de hoje, em especial através da secção Herói Indie, neste caso o novíssimo cinema brasileiro, cada vez mais ativo face à nova política cultural punitiva do novo regime. Um festival que também acredita militantemente no cinema feito em Portugal. O DN sugere três momentos altos para o primeiro fim de semana do evento.

In Fabric, de Peter Strickland

Era um filme perfeito para o MOTELx, mas o Indie apanhou-o para a sempre excitante secção Boca do Inferno. O novo de Peter Strickland é provavelmente o maior caso de culto das propostas do festival. Um thriller insano com a assinatura de nomes mais recomendáveis do novo cinema britânico.

A história da maldição de um vestido e os efeitos nefastos que causa a quem o adquire. Humor negro e violência escatológica que resultam sempre num cocktail de comédia grotesca. Strickland parece cada vez mais seguro do seu estilo e aqui exibe uma fluência narrativa mais resolvida e enxuta.

Além do universo de série B estar mais apurado, In Fabric assume uma aura de taradice genuína. Visualmente é de uma excentricidade com contorcionismos artísticos notáveis...

Dia 4, 23.00, Cinema Ideal

Dia 5, 22.30, Cinema Ideal

Campo, de Tiago Hespanha

Depois de ter convencido tudo e todos no Cinéma Du Réel, em Paris, o documentário produzido pelo coletivo Terratreme chega ao IndieLisboa com sessões nobres. O filme de Tiago Hespanha é de uma liberdade sem compromissos e é uma exploração sobre o Campo de Tiro de Alcochete, o maior campo militar da Europa.

A câmara de Hespanha vai à caça de tudo aquilo que a vasta área proporciona: faits divers de um ecossistema que mistura o que acontece no quotidiano de um terreno no limiar da realidade. São convidados aeromodelistas, apicultores, atores, civis e cientistas. Afinal de contas, o campo é aberto à sociedade civil.

O resultado é uma obra capaz de refletir sobre o absurdo da guerra e divertir-se com o nonsense do cerimonial do combate e as suas regras militares. É tudo menos um mero documentário formatado. Podemos ter algumas reticências com a narração na primeira pessoa, mas Campo é a prova do talento de um cineasta em encontrar a fantasia lusitana de um espaço e de uma realidade.

Dia 4, 17.00, Cinema São Jorge

Tragam-me a Cabeça de Carmen M., de Catarina Wallenstein e Felipe Bragança

Goste-se ou não, a estreia da atriz Catarina Wallenstein na realização ao lado do realizador brasileiro Felipe Bragança é um dos acontecimentos da competição nacional. A própria Catarina é a protagonista deste filme experimental que imagina uma atriz portuguesa no Brasil a filmar uma longa-metragem sobre a mítica Carmen Miranda. Mas as filmagens são neste Brasil mergulhado num pesadelo político e o imaginário colorido da embaixatriz do samba esbarra violentamente com a falência da marca pan-tropicalismo.

Tragam-me a Cabeça de Carmen M. peca por não colar muito bem os seus diversos registos e, a espaços, parece ainda em "construção". Ainda assim, alguma coisa a seu favor, quanto mais não seja a força energética de Catarina Wallenstein, atriz cuja voz e presença têm uma ressonância impactante, sobretudo nos momentos musicais, bem como todo o lado de crónica de uma autópsia de um certo Brasil. Filme de combate, portanto.

Dia 5, 21.45, Cinema São Jorge - Sala Manoel de Oliveira

Dia 7, 22.30, Cinema Ideal

Durante a próxima semana, o IndieLisboa tem ainda outras pérolas para descobrir. Destaca-se o panorama sobre o novo cinema brasileiro, em que consta um dos títulos maiores de Locarno 2018, Temporada, de André Novais Teixeira, viagem ao interior de um Brasil onde a solidão é um dos seus maiores flagelos. Muito recomendável é ainda Divino Amor, de Gabriel Mascaro, filme que em Portugal já teve a sua estreia no Luso-Brasileiro de Santa Maria da Feira.

Da competição nacional de curtas, registe-se a presença de Invisível Herói, de Cristèle Alves Meira, obra já selecionada para Cannes. Isto numa competição que também perfila nomes como Jorge Jácome, Susana Sousa Dias ou Welket Bungé.

Outro dos trunfos deste Indie são as antestreias. Corações ao alto para Peterloo, de Mike Leigh, Burning - Em Chamas, de Lee Chang-Dong e Verão, do russo Kiril Serebrenikov. Mas o maior tesouro talvez esteja na sessão de encerramento, dia 12, com Sinónimos, de Nadav Lapid, o vencedor do último Festival de Berlim.

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