Da Ópera de Nova Iorque ao cinema: os boicotes à cultura russa

Começou com o maestro Valery Gergiev. Seguiram-se uma soprano, a Eurovisão, produções de cinema e até Dostoiévski foi boicotado como consequência da guerra na Ucrânia.
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Além das sanções económicas aplicadas à Rússia, muitos têm sido os cancelamentos feitos à cultura russa desde o início da ofensiva em solo ucraniano.
No entanto, estes boicotes não têm sido aplicados apenas a nível internacional, tendo existido também demissões de cargos dentro da própria Rússia.
Da ópera de Nova Iorque ao cinema, estes são alguns exemplos de boicotes à cultura russa.

Poucos dias após o início do ataque russo à Ucrânia, a Ópera de Nova Iorque, também conhecida como Metropolitan Opera, demitiu Anna Netrebko, uma das suas principais sopranos. A cantora, que tinha sido contratada para fazer duas temporadas de concertos, acabou por anunciar uma pausa na carreira depois dos seus espetáculos terem sido cancelados.

Peter Gelb, o gestor principal da Metropolitan Opera, disse que, apesar de "representar uma grande perda artística e para a ópera", a decisão foi a mais acertada. "Anna é uma das maiores cantoras da história da Metropolitan Opera, mas com o regime de Putin a matar inocentes na Ucrânia, não havia outra alternativa", disse o responsável.

Segundo o jornal The Guardian, a Ópera tentou fazer com que Netrebko condenasse a invasão, mas a cantora - que recebeu o louvor de Artista do Povo da Rússia das mãos de Putin em 2008 - acabou por não o fazer.

O concurso de música Eurovisão também tomou uma posição em relação ao ataque, proibindo a Rússia de participar na edição deste ano.

A União Europeia de Radiodifusão (EBU), que promove o concurso, disse em comunicado que a decisão se baseia "nas regras do evento e nos valores" da organização.

A 24 de fevereiro, o primeiro dia do ataque, a emissora pública da Ucrânia tinha apelado à EBU para excluir a estação pública da Rússia da União Europeia de Radiodifusão, por considerar que a estação era "porta-voz do Kremlin e uma peça chave de propaganda do regime, financiada pelo Orçamento de Estado russo".

O cinema russo sai igualmente penalizado, com festivais da sétima arte a cancelarem a exibição de filmes russos. Depois do Festival de Glasgow ter excluído dois filmes (No Looking Back e The Execution), foi o Festival de Estocolmo a proibir a exibição de produções russas.

"A decisão é lamentável mas é uma tomada de posição necessária. As ações da Rússia são inaceitáveis", justificou Beatrice Karlsson, coordenadora da programação do festival que, por outro lado, escolheu a Ucrânia como país em foco na edição deste ano. Segundo a responsável, esta decisão foi uma consequência direta do conflito.

Já o festival de Cannes também seguiu o mesmo caminho e proibiu a presença de delegações russas na edição deste ano. Em comunicado, a direção do festival explicou que "delegações russas não serão bem vindas, nem será aceite a presença de pessoas com ligações ao governo russo".

Além disso, também as produtoras Disney, Paramount e Sony cancelaram estreias de filmes na Rússia, com o serviço de streaming Netflix a suspender a gravação das quatro produções em andamento no país.

Por outro lado, também o maestro Valery Gergiev, conhecido por ser próximo de Putin, sofreu na pele o boicote cultural feito depois da ofensiva russa.

Gergiev tinha programado dirigir a Orquestra Filarmónica de Viena em três concertos no Carnegie Hall mas, após ter sido instado a pronunciar-se sobre a invasão e não o tendo feito, acabou afastado.

A proximidade do maestro com Putin não é novidade, tendo o músico já manifestado o seu apoio a outras ações do presidente contra a Ucrânia (como em 2014, aquando da anexação da Crimeia).
Também o pianista russo Denis Matsuev, que atuaria com o maestro e a orquestra, foi afastado do Carnegie Hall.

Além disso, Gergiev foi também afastado da Filarmónica de Munique, do Festival de Edimburgo e do Teatro alla Scala de Milão.

A Universidade de Milão-Bicocca, uma das mais prestigiadas de Itália, decidiu, poucos dias após o início do confronto, cancelar um curso livre focado na obra do escritor russo Fiodor Dostoiévski.

A decisão não foi, desde logo, consensual, com o professor do curso a manifestar-se publicamente contra a posição da universidade. Isto fez com que, dias mais tarde, a posição fosse revista e o curso retomado como anteriormente.

A Orquestra Filarmórnica de Zagreb cancelou dois de três concertos de obras do compositor russo Tchaikovsky.

A decisão foi tomada dois dias após a invasão russa como mostra de solidariedade para com os ucranianos.

"Devido à situação na Ucrânia que afeta o mundo inteiro e causa uma terrível agitação, a Orquestra Filarmónica de Zagreb expressa a sua solidariedade com o povo ucraniano e altera o programa", referiu a Filarmónica em comunicado. Em substituição, foram tocadas composições de Beethoven e Samuel Barber.

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