À procura dos "melhores filmes" do ano
É conhecida a "duplicação" de prémios inerente aos Globos atribuídos pelos representantes da imprensa estrangeira em Hollywood: a existência de duas áreas - Drama e Musical ou Comédia - faz com que haja uma lógica de consagração muito diferente da que preside aos Óscares. Desde logo, como é óbvio, com a escolha, não de um, mas dois "melhores filmes".
Ao longo dos anos, tal divisão tem perdido alguma pertinência. Porque alguns títulos irrelevantes chegaram às nomeações? Sim, sem dúvida, mas sobretudo porque, por vezes, a Associação da Imprensa Estrangeira de Hollywood parecia nem sequer respeitar os seus próprios critérios. Para nos ficarmos por um exemplo sintomático, lembremos Perdido em Marte (2015), de Ridley Scott, com Matt Damon a interpretar um astronauta a tentar sobreviver no Planeta Vermelho... Como explicar a sua nomeação (e vitória!) na categoria de "melhor musical ou comédia"?
Este ano, pelo menos, as nomeações dos Golden Globes para esses dois "melhores do ano" parecem refletir opções mais consistentes e também mais ligadas a alguns consensos que, com maior ou menor pertinência, se vão estabelecendo na comunidade de Hollywood. Assim, nas duas frentes "estéticas" encontramos uma pequena coleção de títulos que, de uma maneira ou de outra (com ou sem Óscares), ficarão como símbolos marcantes do 2021.
Será o caso de Dune, na categoria dramática, filme que funcionou como bandeira do desejo de regressar às salas escuras e aos grandes ecrãs (um pouco à maneira de Tenet, o ano passado). Ou ainda Licorice Pizza e West Side Story, ambos nomeados para o prémio de melhor musical ou comédia.
Certamente não por acaso, dois títulos em grande parte sustentados pela excelência dos respetivos elencos chegaram também a estas nomeações: King Richard (drama), dominado pela performance de Will Smith, e Não Olhem para Cima (musical ou comédia), com Leonardo DiCaprio, Jennifer Lawrence, etc. Correm "por fora" dois filmes que, também neste domínio, refletem a ambição da Netflix no sentido de marcar pontos no território de consagração "institucional" de Hollywood (embora, claro, os Óscares sejam a prioridade); são eles O Poder do Cão (drama) e Tick, Tick... Boom (musical ou comédia). Com o curioso complemento de ambos serem assinados por "marginais" de Hollywood: respetivamente, a neozelandesa Jane Campion e Lin-Manuel Miranda, consagrado como encenador da Broadway (Campion está nomeada na categoria de realização).
Restam dois filmes que, independentemente das suas qualidades específicas, parecem os mais fracos nesta corrida aos prémios: CODA, drama sobre uma jovem cujos familiares adultos são todos surdos, e Cyrano, musical inspirado, não diretamente na peça de Edmond Rostand, mas sim num espetáculo da Broadway. Sem esquecer, claro, Belfast, memória semi autobiográfica de Kenneth Branagh, nomeado para melhor drama e que tem sido um dos eleitos de muitos analistas americanos. Nos Golden Globes, é também líder de nomeações: surge em sete categorias, número apenas igualado por O Poder do Cão.
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