Shigeru Mizuki é descrito como historiador e autor de manga e faz todo o sentido. Esta biografia Hitler em banda desenhada que a Devir acaba de publicar em Portugal é de uma notável qualidade artística, mas igualmente conta a ascensão de Adolf Hitler enquadrando-a com grande conhecimento no período político na Alemanha pós-Primeira Guerra Mundial. O autor japonês, que morreu em 2015, consegue ainda traçar um perfil psicológico do líder nazi que nos deixa estupefactos pela evidente fragilidade de alguém que ao mesmo tempo mostra uma determinação tremenda de sucesso na vida.Mizuki, que nasceu em 1922 e serviu o exército imperial durante a Segunda Guerra Mundial, tendo até sido gravemente ferido em combate, oferece-nos também neste Hitler uma visão japonesa dos acontecimentos da primeira metade do século XX na Europa. O livro refere, e bem, como a dado momento o imperialismo nipónico na Ásia se tornou no aliado natural do imperialismo germânico na Europa, juntando-se os dois países, mais a Itália, num Eixo que depois de parecer destinado a dominar o mundo, acabou derrotado em toda a linha em 1945. Mizuki, que num posfácio confessa que chegou aos 18 anos a sentir-se “inebriado” por Hitler ao ponto de pensar deixar crescer um bigode igual ao do Führer, explica depois que Tóquio não imaginou o grande erro que era atacar os Estados Unidos, tal como Berlim não entendeu o enorme risco de querer conquistar a União Soviética.Encadernado no formato original japonês, o que significa folhear de trás para diante, este Hitler faz uso do preto e branco para realçar o cinzentismo de todo percurso do austríaco que odiava os Habsburgos e por isso combateu pela Alemanha na Primeira Guerra Mundial; um cabo condecorado, mas mesmo assim desprezado pela aristocracia militar germânica; um pintor falhado que tinha ilusões de grandeza; um eterno solitário que viu a sobrinha Geli (amor?) suicidar-se e só encontrou alguma estabilidade emocional junto dessa Eva Braun com quem casou na véspera de suicidar-se no bunker, quando os soldados soviéticos já tinham entrado em Berlim. Em inícios de maio de 1945, a Alemanha rendia-se, em ruínas, e afinal o tal Reich dos mil anos durou pouco mais de uma década. Como mostra o traço de Mizuki, a mais terrível das marcas da passagem de Hitler por este mundo foi o Holocausto, fruto de um ódio profundo aos judeus que sentia desde jovem..HitlerShigeru MizukiDevir286 páginas