Nascera nas águas atlânticas de latitudes setentrionais, baixara em latitude até ao Mar Mediterrâneo, varrera-o com ventos de vigor ciclónico e rumou a nordeste, ao estreito do Bósforo, para enveredar caminho no Mar Negro. Limitada a leste pelas barreiras naturais das cordilheiras dos sistemas do Cáucaso e dos Montes Pônticos, a tempestade apontou à península da Crimeia. O calendário assinalava 14 de novembro de 1854, data funesta para a frota de naves francesas e britânicas estacionada ao largo da baía de Balaclava, no sul do território. A Guerra da Crimeia que opunha o Império Russo à Aliança Anglo-Franco-Sarda desenrolava-se há um ano. O conflito prolongar-se-ia até 1856. De momento, o bloqueio naval e o cerco por terra à cidade portuária de Sebastopol visavam debilitar a frota russa do Mar Negro. Na noite, ventos de 110 Km/h, cúmplices de bátegas de chuva, afrontaram os navios de suprimentos estacionados ao largo da região de Balaclava. Em poucas horas, 37 embarcações (21 navios britânicos e 16 franceses) perderam-se no precipício marinho. Quatro a seis milhões de cartuxos de minas, milhares de galões de rum, alimentos, agasalhos e forragens encontraram o fundo do mar. Ancorado frente à baía de Balaclava o navio Agamemnon, contava a bordo com o inglês George Taylor. Este, descreveria em carta a paisagem que se entrepunha entre si e terra: "A linha de rochas apinhava os restos de navios levados para a praia (...) fragmentos de mastros e madeiras assemelhavam-se a uma caixa de fósforos. Todos os navios foram danificados em graus variados (...) após o furacão partes de corpos boiavam ao redor dos navios"..Entre as embarcações caídas na tempestade de 1854, encontrava-se uma das joias da marinha de guerra francesa, o navio de cem canhões batizado Henri IV. Um duro golpe que lançou no espírito de Napoleão III de França a pergunta: Sabendo-se previamente a rota da tempestade (esta varrera toda a Europa Ocidental), estabelecendo-lhe a cronologia, não seria possível dar notícia a jusante da mesma, em tempo útil e, com isso, implementar um sistema de alerta precoce? A pergunta tinha um destinatário, o astrónomo e matemático Urbain Le Verrier. A resposta foi afirmativa por parte do homem que asseverara a existência do planeta Neptuno com recurso a cálculos matemáticos..Le Verrier respondia a Napoleão III num tempo em que a ciência meteorológica experimentava a aurora. O século XIX apresentava avanços teóricos relevantes na matéria. O aparente caos atmosférico organizava-se. Havia um entendimento insípido sobre os mecanismos internos das tempestades. Em França, o químico e meteorologista Buys Ballot estabeleceu a relação entre o vento e a pressão atmosférica. Na década de 1830, os navios começaram a reportar leituras barométricas, temperaturas e padrões de vento. Por seu turno, a implementação de uma rede telegráfica permitia a partilha de observações meteorológicas de longa distância. Avanços fundamentais para o desenvolvimento das primeiras representações gráficas das condições atmosféricas. Em 1855, Urbain Le Verrier olhou para o telégrafo e, em seis meses, estabeleceu uma rede de 13 estações meteorológicas telegráficas ligadas ao Observatório de Paris. Em 1858, o Observatório trocava boletins meteorológicos matutinos, entre outras cidades, com São Petersburgo, Viena, Genebra, Bruxelas, Roma, Madrid e Lisboa..A noroeste de Paris, para lá do Canal da Mancha, um inglês nascido em 1822, acompanhava o trabalho pioneiro de Le Verrier sobre previsão do tempo. Matemático, antropólogo, estatístico e meteorologista, Francis Galton planeava na década de 1850 uma rede de postos de observação meteorológica no Reino Unido. Na década seguinte, o cientista cunharia para a recente ciência meteorológica o termo Anticiclone por referência a extensas regiões de alta pressão, associadas a estados do tempo estáveis. Na posse de informação sobre as condições meteorológicas recolhidas em todo o país, Galton entendeu reuni-las num mapa onde aplicou o seu próprio sistema de símbolos. Em 1861, era impresso o primeiro mapa do tempo na forma ainda hoje reconhecível. Mais tarde também identificada como carta sinótica, esta representação visual sob a forma de mapa, apresenta-nos as condições meteorológicas numa determinada área e num momento determinado. Antes do trabalho de Galton, as informações meteorológicas eram, sobretudo, relatadas em tabelas e gráficos. Nesta segunda metade do século XIX, a previsão meteorológica ganhava uma componente visual, com uma rede urdida de linhas de igual pressão atmosférica (isóbaras), direção e intensidade do vento, temperatura à superfície, coberto de nuvens, entre outra informação. A própria expressão "previsão meteorológica" foi na época cunhada. Um marco que coube a um desbravador dos sinais do céu, pioneiro da meteorologia no Reino Unido de quem Francis Galton era confesso admirador..De 1831 a 1836, o oficial da marinha britânica Robert FitzRoy empreendeu uma notável viagem de carácter científico, aquela que envolveu o brigue H.M.S. Beagle na sua circum-navegação da Terra. Périplo seminal para o posterior trabalho do naturalista Charles Darwin, autor do livro A Origem das Espécies. Por décadas, FitzRoy elaborou previsões meteorológicas diárias. Angustiado com a enorme perda de vidas no oceano fronteiro ao Reino Unido, o meteorologista iniciou em 1859 um serviço de alertas de tempo por via telegráfica. A velocidade de transmissão através de impulsos elétricos ultrapassava o ímpeto de avanço de oeste para leste das tempestades atlânticas. Um aviso que, assim acreditava o cientista, mitigaria a mortandade no mar no período vitoriano. Entre 1855 e 1860, mais de 7000 vidas haviam sido reclamadas por naufrágios. Em 1861, o jornal Times iniciava a publicação das previsões do estado do tempo de Robert FitzRoy. Dois anos mais tarde, o meteorologista publicava o livro Meteorographica: or Methods of Mapping the Weather, a primeira tentativa de coligir, mapear e sistematizar a interpretação de dados meteorológicos a uma escala continental..A 1 de abril de 1875, inaugurou-se uma nova era na democratização da informação meteorológica. Nessa data, o Times iniciou a publicação dos mapas do tempo de Francis Galton. Cartas que davam mostra das condições atmosféricas à superfície no dia anterior. Uma publicação com mais de descritivo do que de preditivo que passou a ter um carácter diário, distante no tempo das tentativas frustradas de décadas anteriores, ainda sem recurso à componente visual. No ano de 1847, o jornal Manchester Examiner promoveu o uso do telégrafo para coligir dados sobre o clima. Em 1851, aquando da Exposição Mundial de Londres, uma companhia de telégrafos providenciou previsões ao longo de 60 dias. Havia que manter informados os milhares de visitantes que demandavam o recinto do certame, montra para dezenas de milhares de expositores..Dez anos após o encerramento da grande mostra londrina, levava o Times aos leitores britânicos a previsão do estado do tempo. A primaveril capital inglesa experimentava então uma temperatura máxima a rondar os 16 ºC, com vento de sudoeste e céu desanuviado de nuvens. Dover alcançaria uns agradáveis 22 ºC, a mesma temperatura da meridional Lisboa..dnot@dn.pt