Foi durante um programa de monitorização que pretendia avaliar a biodiversidade de insetos afetados pela vespa asiática (Vespa velutina) que investigadores da Universidade de Oviedo capturaram quatro exemplares da Vespa Gigante do Sul (Vespa soror du Buysson). Os resultados da investigação, publicados há uma semana na revista Ecology and Evolution, levantam preocupações sobre o potencial de ameaça desta espécie para a saúde humana e para o ambiente, tendo em conta o comportamento altamente predatório destas vespas..A Vespa Gigante do Sul é natural da Ásia, com um habitat que se estende do Nordeste da Índia ao norte da Birmânia e da Tailândia e ao sul da China. É um dos gigantes do mundo das vespas sociais, com as rainhas a poderem chegar aos cinco centímetros. As obreiras, como os exemplares que foram capturados nas Astúrias entre março de 2022 e outubro de 2023, em armadilhas destinadas à vespa asiática, são um pouco mais pequenas, podendo chegar aos 3,5 centímetros. Além do tamanho, esta espécie de vespa tem um padrão de cores que a torna facilmente identificável, com uma cabeça grande e amarela, “ombros” castanhos muito escuro ou negros, um corpo longo e amarelo acastanhado com a extremidade negra, asas amareladas e patas e antenas castanhas..Como explicam os investigadores, trata-se de um predador agressivo, que se alimenta de invertebrados de diferentes tamanhos, desde abelhas, borboletas, libelinhas outras vespas e gafanhotos, mas também pequenos vertebrados como geckos. A picada é muito dolorosa e o veneno tem uma ação prolongada e pode, nos casos em que ocorram múltiplas picadas, levar à morte..Uma vez a espécie instalada – e os dados recolhidos pelo estudo não permitem comprovar que isso tenha acontecido – o maior impacto na saúde humana poderá ocorrer entre os meses de setembro e dezembro, época que antecede o aparecimento das novas rainhas. “É no Outono que as novas rainhas saem do ninho para fundar novas colónias. Regra geral são fecundadas por vários machos no primeiro voo que fazem para fora da colónia”, explica Albano Soares, entomólogo (que não participou no estudo), ao DN. “Uma rainha sozinha funda uma colónia. Constrói um ninho primário, com um pequeno séquito de obreiras e a partir dessa altura não sai mais do ninho”, continua o naturalista. Depois deste primeiro momento, a rainha põe os ovos que vão dar origem aos indivíduos férteis – novas rainhas e machos – cujas larvas precisam de uma maior quantidade de proteína. “É o apogeu da colónia”, diz Albano Soares..Viajantes clandestinos.Uma vez que, como refere o artigo agora publicado, as rainhas fecundadas passam os meses mais inóspitos do ano escondidas, a explicação para o aparecimento da espécie nas Astúrias pode estar na introdução acidental de um destes animais, que pode ter viajado “clandestinamente” num contentor, na raiz de uma planta ou na carga de um navio, e sobrevivido à viagem..Uma vez reunidas as condições ambientais adequadas são necessários poucos indivíduos para que a espécie se estabeleça em novas áreas, alertam os investigadores asturianos, dando como exemplo o que aconteceu com a vespa asiática. Para os investigadores, as duas primeiras vespas capturadas em maio de 2022 podiam pertencer a um ninho formado muito recentemente ou a um ninho formado ainda em 2021, tendo sobrevivido ao Inverno..Ao contrário do que acontece com a Vespa Velutina, a Vespa Gigante do Sul – a que os investigadores espanhóis propõem dar o nome de vespa soror como nome comum – constrói os seus ninhos debaixo do solo, por vezes entre raízes de grandes árvores, em zonas florestadas e até aos 700 metros de altitude. Alguns ficam perto da superfície, mas outros são mais profundos o que, alertam os investigadores, pode dificultar a sua deteção e eliminação..Albano Soares concorda que a construção subterrânea dos ninhos pode gerar problemas. No entanto, diz, o comportamento muito defensivo das vespas em relação ao ninho, bem como o seu tamanho e aspeto característico, pode facilitar a localização da colónia..Monitorização necessária.Para Albano Soares, a identificação da Vespa Gigante do Sul no norte da Península Ibérica deverá ser motivo para preocupação tanto para os apicultores como para a sociedade em geral. “O mais preocupante é que os limites geográficos das zonas em que habita na Ásia têm ciclos climáticos semelhantes à Europa e um clima temperado. Além disso, com a mudança climática, a Europa tem um clima cada vez mais quente”, o que facilita a adaptação, diz..Se a espécie vier a instalar-se, será nos primeiros anos que irá causar maior perturbação, uma vez que é um elemento estranho no ecossistema: os predadores não a vêem como presa e as presas não a reconhecem como predador, num processo em tudo semelhante ao que aconteceu com a vespa asiática. Para Albano Soares, o facto de terem ocorrido detecções em dois anos consecutivos e na mesma zona, leva-o a crer que já exista ali uma colónia estabelecida ou, pelo menos, que tenha estado estabelecida naquele período..Nos próximos anos, os investigadores da Universidade de Oviedo vão reforçar a monitorização da espécie tanto na zona em que foram encontrados os primeiros exemplares, como nas regiões vizinhas, para avaliar a presença e possível disseminação da vespa gigante do sul, bem como o seu impacto na apicultura, nos ecossistemas e na saúde..“Esta é a altura ideal para se estancar a invasão porque depois de uma espécie estabelecida é impossível erradica-la”, concorda Albano Soares, para quem é importante que haja uma cada vez maior aposta em programas de monitorização de insetos. “É algo que pode ter imensas implicações na nossa vida”, diz.