Titusville é uma pequena cidade para os padrões de gigantismo urbano dos Estados Unidos. Perto de cinco mil almas habitam na localidade rodeada de florestas no estado da Pensilvânia. Em 1962, o francês René Goscinny combinou a sua escrita com o desenho do belga Morris para situarem em Titusville o 18.º álbum de Lucky Luke, intitulado À Sombra dos Derricks. Enredo que situa o cowboy, nascido para a banda desenhada em 1946, numa cidade tomada pela corrupção..Na história da dupla Goscinny/Morris, a corrida ao petróleo, em meados do século XIX, degradava as relações sociais em Titusville, enleando um rol de personagens de ambições diversas. Lucky Luke contracena com o pouco escrupuloso Barry Blunt, o prospetor de ouro negro Edwin Drake e o mecânico Billy Smith. Estes últimos, duas figuras que ligam as suas histórias reais a Titusville, fora das fronteiras imaginadas do álbum do cowboy "mais rápido do que a própria sombra". Edwin e Billy vivem, por mérito próprio, há perto de 60 anos nas pranchas da banda desenhada da dupla franco-belga, juntando-se a um panteão aí recriado que reúne figuras como Abraham Lincoln, Jack London, Mark Twain, Gustave Eiffel e Jesse James. Titusville ganhou o seu lugar na história por ser berço da extração petrolífera por perfuração nos Estados Unidos. Marco que não ficou órfão de data, 1859, nem de padrinhos de batismo, precisamente Billy Smith e o mais relevante Edwin Drake..Na senda de situarmos as origens da exploração de petróleo norte-americana, há que reunir várias geografias, algumas coincidências e diferentes percursos biográficos. Para que Edwin Laurentine Drake, nascido em 1819 no estado de Nova Iorque, se fizesse prospetor de sucesso, há que remontar a um seu compatriota e contemporâneo, nado no estado da Pensilvânia em 1813. Por muitos anos, pouco interessava ao empresário e inventor Samuel Martin Kier a substância viscosa que assomava à superfície, próximo das minas de sal que explorava. Sabia-se que era petróleo, mas a sua utilização prática era diminuta. Samuel juntava ao negócio do sal uma empresa de transporte de carvão por barco entre Pittsburgh e Filadélfia, assim como a participação em minas de carvão e a gestão de uma fábrica de cerâmica..Na década de 1840, o petróleo tornou-se uma preocupação no quotidiano de Samuel, ao invadir as minas de sal do empresário que se desfazia da substância oleosa despejando-a no rio ou queimando-a. Um dos incêndios provocados por Kier iluminou-lhe o talento inventivo e o carácter empreendedor. Nos anos seguintes, o prospetor apurou a técnica da destila de petróleo para apresentar o seu óleo de seneca e a oportunidade de, com este, crescer no negócio médico. Revelado como um medicamento para doenças várias, o óleo de seneca fundava o seu batismo na designação dos povos Senecas, nação índia a sul do Lago Ontário, no estado de Nova Iorque que, historicamente, utilizavam o petróleo como matéria isolante. Ao óleo medicinal, tal como à "manteiga de petróleo" (vaselina) engendrados por Samuel, coube-lhes o malogro. Sorte diferente teve o óleo de carbono, também obtido da destila de petróleo que substituiu o óleo de baleia como combustível para iluminação. Na prática, Samuel Kier aperfeiçoou a fórmula da querosene, já antes conhecida embora pouco viável na sua comercialização. Em 1854, o empresário e inventor instalou em Pittsburgh a primeira refinaria de petróleo dos Estados Unidos. .Para que a história de Titusville encontrasse a de Edwin Drake, havia primeiro de inscrever um capítulo entre Samuel e o empresário George Bissell, dono da Seneca Oil, cuja perspicácia para o negócio o levou a investir na promissora indústria da querosene e na matéria-prima que lhe servia de base, o petróleo..Em 1858, encontramos Drake como porteiro de hotel em Titusville. A má fortuna talhara-lhe os anos anteriores, com a morte da primeira mulher e a saúde, débil, a obliterar a esperança de manter o trabalho nas ferrovias no estado do Connecticut. Drake tinha a seu favor uma personalidade sedutora, um robusto conhecimento de maquinaria e um bónus, oferecido pela companhia ferroviária onde laborara: viagens gratuitas à boleia do comboio por toda a América. O destino esculpiria os capítulos seguintes da história de Edwin. Após um par de horas à conversa com um dos investidores da Seneca Oil, hospedado no hotel onde o antigo ferroviário trabalhava, este aceitou o convite para sondar poços de petróleo nas terras da empresa prospetora..Coadjuvado por Billy Smith, experiente mecânico, Edwin socorreu-se de perfuradoras a vapor para penetrar o solo da Pensilvânia. Tarefa dificultada pelos desmoronamentos de cascalhos a poucos metros de profundidade. O insucesso na exploração de possíveis poços petrolíferos prolongou-se por um ano, até ao início de 1859, quando Edwin, então apelidado de "louco", fruto da sua obstinação, instalou as brocas perfuradoras dentro de tubos que baixavam ao subsolo. Em agosto de 1859, uma fenda na rocha, a 21 metros de profundidade, reservava uma nova era à exploração petrolífera. O petróleo jorrava à superfície, capaz de encher 25 barris por dia. Uma década depois, em 1872, a mesma área oferecia 25 mil barris a cada 24 horas..Na época, Drake falira há perto de dez anos, incapaz de gerir a sua própria empresa extrativa e impossibilitado de patentear a sua invenção. O "pai" da perfuração petrolífera nos Estados Unidos morreu em 1880 beneficiário de uma pensão anual de 1500 dólares concedida pelo estado da Pensilvânia..A comercialização em larga escala de querosene para iluminação, produzida a partir de petróleo, afundou a indústria do óleo de baleia (ou azeite de baleia) na segunda metade do século XIX. Em 1859, Robert Chesebrough químico e industrial, percebendo o fim de uma era, visitou os campos petrolíferos de Titusville. Na época, os trabalhadores naqueles campos, recorriam à chamada gelatina de petróleo para sarar feridas. Chesebrough retornou ao seu estado de Nova Jérsia a laborar numa ideia de negócio. Em 1872, o químico patenteou a vaselina, para iniciar o fabrico do novo produto em 1874.