Um gosto muito particular por ingerir plástico.Chama pelo nome científico de Galleria mellonella, embora na voz do dia a dia a denominemos traça-da-cera. Na sua fase larvar, este inseto de vida curta, afeiçoado à ingestão de mel e cera das colmeias, desenvolveu a invulgar capacidade de ingerir plástico, em específico o polietileno, usado em sacos. A traça-da-cera não é um caso isolado no mundo dos insetos que deglutem plásticos. Várias espécies de lepidópteros, como a traça-indiana-da-farinha (Corcyra cephalonica), revelaram a capacidade de degradar plásticos de baixa densidade. Neste campeonato de singularidades digestivas, os besouros da família Tenebrionidae são alguns dos insetos degradadores de plástico mais bem descritos. As suas bactérias intestinais forneceram informações valiosas sobre o papel que os microrganismos ali localizados desempenham na degradação do plástico..Um estudo apresentado em setembro último e empreendido por um grupo de investigadores sediados no Centro Internacional de Fisiologia e Ecologia de Insetos, em Nairobi, capital do Quénia, recentrou no continente africano a discussão em torno destas categorias de insetos comedores de plástico. O trabalho, publicado no site Scientific Reports, apresenta algumas novidades. Entre elas a de, pela primeira vez, uma espécie de inseto nativa de África, a larva da farinha de Tenebrio molitor, um besouro, revelar-se capaz de digerir plástico, em específico o poliestireno. Este é um polímero barato e durável cuja forma mais comum de comercialização é a esferovite que encontramos em recipientes de armazenamento de alimentos, pratos e copos descartáveis e isolamento na construção. Estima a Plastics Europe, associação comercial que representa os industriais europeus do plástico, que a produção anual de poliestireno ronde as 20 milhões de toneladas..A equipa de investigadores quis “explorar métodos biológicos de gestão destes resíduos persistentes [plásticos]”, escreve a cientista Fathiya Khamis nas páginas do site Times Living. Isto, em alternativa aos “métodos químicos, térmicos e mecânicos (…) dispendiosos e produtores de compostos aromáticos nocivos que podem ampliar os impactos ambientais negativos”, destacam os investigadores no resumo que introduz o já referido estudo..A heroína africana da degradação de poliestireno, a pequena larva da farinha queniana, apresenta-se como uma praga comum em aviários. Na investigação em apreço, a larva revelou uma outra natureza, a de ser uma fiável hospedeira de bactérias intestinais que ajudam na decomposição do plástico. As características da subespécie agora identificada são semelhantes às de outras larvas da farinha da família Tenebrionidae e especificamente relacionadas com a subfamília Alphitobiini..“A capacidade de a larva da farinha consumir poliestireno foi avaliada juntamente com a diversidade da microbiota intestinal associada”, sublinha o estudo recentemente publicado e acrescenta: “o nosso inseto poderá ser uma nova subespécie que requer uma identificação adicional”..A investigação deteve-se em particular nas bactérias intestinais do inseto. No caso em apreço, ao longo de um mês, as larvas foram alimentadas de três formas: apenas com poliestireno, apenas com farelo (resíduos grosseiros de cereais moídos) ou com uma combinação de poliestireno e farelo. Daqui resultou, de acordo com a investigação publicada, que “as larvas da farinha alimentadas com uma dieta de farelo e poliestireno sobreviveram com taxas mais elevadas do que as alimentadas apenas com poliestireno. Isto destaca os benefícios de garantir que os insetos mantenham uma dieta rica em nutrientes”..De acordo com os investigadores do Centro Internacional de Fisiologia e Ecologia de Insetos, “as larvas da farinha na dieta de farelo e poliestireno foram capazes de quebrar cerca de 11,7% do poliestireno total durante o período experimental”..As bactérias predominantes observadas nas larvas alimentadas com dietas de poliestireno foram, entre outras, a Kluyvera, Klebsiella, Enterobacter. “Estas descobertas demonstraram que a larva da farinha recentemente identificada pode sobreviver com uma dieta de plástico e conta com um consórcio de bactérias fortemente associadas à degradação do poliestireno”, adianta o estudo. Acresce que a análise do intestino da larva da farinha revelou alterações significativas na composição bacteriana dependendo da dieta. “Isto irá ajudar-nos a isolar as bactérias e enzimas específicas que podem ser aproveitadas para os esforços de degradação do plástico”, escreve Fathiya Khamis no site Times Living. A mesma investigadora salienta que “as larvas da traça-da-farinha podem não ter a capacidade natural de comer plástico. Em vez disso, quando começam a comer plástico, as bactérias nos seus intestinos podem mudar para ajudar a decompô-lo. Assim, a microbiota da larva pode ajustar-se a dietas invulgares, como a do plástico”..“Esta investigação estabelece as bases para estudos futuros sobre a reciclagem microbiana de resíduos plásticos em biomassa rica em proteínas de insetos de alto valor para alimentação animal”, conclui o estudo..Recorde-se que “a produção global de plásticos deverá atingir os 460 milhões de toneladas, prevendo-se que os volumes de produção continuem a aumentar nas próximas décadas”, identificava a Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico em 2022 no Global Plastics Outlook Economic Drivers, Environmental Impacts and Policy Options..‘Ressuscitar’ uma semente com mil anos na procura de um bálsamo perdido.Na década de 1980, uma semente foi recuperada no decorrer de escavações arqueológicas numa gruta no deserto da Judeia, em Wadi el-Makkuk, a norte de Jerusalém. Recentemente, um estudo dirigido pela investigadora israelita Sarah Sallon, e publicado sob a égide do Centro de Pesquisa de Medicina Natural Louis Borick, em Jerusalém, trouxe uma nova luz sobre a misteriosa semente, entretanto plantada há cerca de dez anos. A referida investigação, para consulta na revista online Communications Biology, oferece hipóteses várias para explicar as origens da planta ‘ressuscitada’ após quase mil anos, apelidada “Sheba”. Esta “Commiphora [da família da mirra e do incenso] é, tanto quanto sabemos, a primeira identificada num sítio arqueológico nesta região, incluindo a identificação com uma árvore produtora de resina mencionada em fontes bíblicas”. Inicialmente, os investigadores postularam estar perante uma planta relacionada com o histórico Bálsamo da Judeia..Foto: DR.“Recuperar sementes históricas gerou um interesse considerável devido às suas potenciais aplicações em muitos campos como forma de recuperar espécies perdidas e identificar fenótipos extintos; contribuir para uma melhor compreensão da domesticação das culturas, melhoria das culturas atuais; reforçar as populações de espécies raras e fazer renascer espécies extintas na natureza”, lemos na apresentação ao já referido estudo..A mesma investigação realça que “o género Commiphora, distribuído predominantemente em África continental, Madagáscar e Península Arábica, tem sido valorizado ao longo da história dadas as suas utilizações económicas e etnobotânicas. Desde o século XVIII, a Commiphora gileadensis tem sido considerada candidata ao histórico Bálsamo da Judeia, produzido nesta região há pelo menos mil anos. O produto de exportação mais valioso da antiga Judeia (atual Israel e Palestina) e descrito extensivamente pelos escritores da antiguidade, o bálsamo da Judeia, era muito apreciado pela sua resina aromática perfumada”. Acresce que o Bálsamo da Judeia desapareceu da região no século IX d.C..A planta obtida a partir da semente encontrada nas escavações arqueológicas, não correspondia a nenhuma das espécies conhecidas de Commiphora existentes em bancos de dados de botânica. Também não correspondia à Commiphora gileadensis, dado a árvore ressurgida não apresentar as propriedades aromáticas daquela outra. Da análise química concluiu-se que as folhas e resina de “Sheba” estão repletas de compostos com propriedades anti-inflamatórias e anticancerígenas, assim como do antioxidante natural esqualeno, utilizado em tratamentos de pele. Para os investigadores, “Sheba” pode representar uma “linhagem extinta” de uma planta outrora nativa desta região, “cuja resina era valiosa, associada à cura, mas não descrita como fragrante”, explica o estudo..A germinação de sementes antigas provenientes de sítios arqueológicos, permafrost (camada de subsolo permanentemente congelada) e de coleções históricas e botânicas, identificaram, entre outras, sementes de tâmaras com 2000 anos e sementes de lótus com 1300 anos..Livros.Linhas Invisíveis.O nosso mundo tem inúmeras fronteiras, das óbvias, como um oceano, às mais subtis, como as diferenças na língua ou no clima. No livro Linhas Invisíveis (edição Saída de Emergência), o geógrafo Maxim Samson apresenta 30 destes limites invisíveis. Da qualidade do ar na China ou à Faixa da Malária subsariana, a existência - ou a perceção de existência - de linhas divisórias tem múltiplas implicações para os seres humanos, a vida selvagem e a própria localização dessas linhas. Uma obra ilustrada com mapas de cada região. Maxim Samson é professor de Geografia na DePaul University, em Chicago. É especialista em geografias da religião, globalização, multiculturalismo e urbanização. O livro tem o preço de capa de 18,80€.