Rod Paradot, 20 anos. O menino-ator não mimado

Uma revelação como há muito não víamos. Em <em>De Cabeça Erguida </em>tem uma intensidade vital. Tal como o filme, que está em cartaz
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Lembramo-nos de uma descoberta masculina de André Téchiné em Os Fugitivos (2003), um dos seus belos filmes presente na competição de Cannes. O ator chamava-se Gaspard Ulliel e era praticamente um adolescente. Foi filmado com fogo de câmara e desejo de cinema. Depois desse filme tornou-se um dos talentos mais regulares do cinema francês (e com uma experiência bem-sucedida em Hollywood).

Agora, pela mão de Emmanuelle Bercort (Ela Está de Partida) surge-nos um outro jovem adulto que é filmado como um trovão. Chama-se Rod Paradot e encantou Cannes há um ano com De Cabeça Erguida, no qual dá vida a um adolescente problemático que cresce com um mãe solteira toxicodependente e torna-se um delinquente crónico. A partir daí a sua juventude é uma sucessão de passagens por casas de correção. Bercot filma-o com uma energia corporal raivosa, quase animalesca.

Sente-se, adivinha-se que Paradot é virgem de cinema. Na verdade, este jovem de 18 anos (agora já 20) tem uma liberdade de movimentos diferente e isso é uma virtude. A realizadora puxa por essa fúria espontânea, em especial quando se sentem as suas explosões de raiva em frente a atores profissionais como Benoît Magimel e Catherine Deneuve.

Num hotel chique, demasiado chique para ele, conversa com o DN com um entusiasmo natural. "Nunca fiz nada como ator antes deste filme mas sempre amei o cinema. O que aconteceu é que num dia no liceu vi que estavam a fazer uns castings. Fui e chamaram-me", tão simples como isso. De certa forma, faz lembrar o processo de David Mourato, o menino-homem de João Salaviza em Montanha.

E entrar no corpo de rapaz problemático, como foi? "Antes de mais, nunca tive problemas...", diz a rir e continua: "O que aconteceu é que a Emmanuelle Bercot teve longas, muito longas conversas comigo. Falámos sobre a vida, sobre este papel, sobre mim... A única coisa que tenho em comum com este jovem é o seu lado nervoso. Isso e a quantidade de amor que ambos temos. Espero que isso se note no filme." Nota-se. Malony nunca abdica de amar a ferro e fogo, mesmo perante as amarras da sociedade e dos reformatórios por onde passa.

Paradot tem daqueles rostos duros e firmes que lhe vão dar muitas personagens realistas para um certo cinema francês. E o nervosismo que refere tem algo de bálsamo fresco num território cinematográfico povoado em demasia por jovens atores cheios de pose e de mimetismo à Louis Garrell.

Por outro lado, diz que quer apenas viver uma vida normal. Sabe que a azáfama da abertura do Festival de Cannes, no ano passado, foi apenas um episódio. Normal ou não, agora, claro que quer mesmo ser ator de cinema. Quer aprender a ser ator. "Vou fazer tudo para continuar no cinema, amo isto! Gosto de estar na pele dos outros e não saber o que amanhã podemos ser - isso é a grande aventura do cinema... Tenho já um convite para fazer uma curta e o novo do Xavier Beauvois."

Entretanto, ganhou o César de melhor ator revelação e acreditamos que tenha tido uma explosão de alegria, bem diferente das explosões violentas do seu Malony. Sobre esses acessos de cólera que o deixam vermelho e a espumar sem maquilhagem, argumenta que foi picado violentamente por Bercot: "Seja como for, usei também algo das experiências da minha vida e da violência que observo no dia-a-dia na rua. Praticamente em todas as escolas por onde passei vi violência, seja no recreio seja em jogos de futebol ou em brincadeiras de bullying. Enfim, é o que acontece aqui na região parisiense... basta ver as pessoas a falar."

De Cabeça Erguida está em cartaz nas salas portuguesas.

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