Prémio Nobel da Literatura em risco devido a escândalo sexual

Demissão da líder do Comité Nobel da Literatura deixa Academia Sueca com membros insuficientes para votação

Sara Danius, líder do Comité Nobel da Literatura, demitiu-se, esta quinta-feira, na sequência de um escândalo em que o marido de uma das responsáveis da Academia Sueca é acusado de assédio sexual por 18 mulheres. Atribuição do prémio está em risco, devido à falta de membros suficientes.

Sara Danius anunciou a sua decisão após uma reunião de emergência, que durou três horas, com membros da academia no centro de Estocolmo.

De acordo com a BBC, a responsável disse que perdeu a confiança da Academia, mas não quis comentar se foi realizada uma votação para ra destituir. "É desejo da Academia que eu deixe o meu cargo ", revelou Danius, que foi a primeira mulher a ocupar o cargo. "Gostaria de ter continuado, mas há outras coisas para fazer na vida", disse aos jornalistas.

Em novembro passado, e no decorrer da campanha contra o assédio sexual #MeToo, 18 mulheres disseram terem sido assediadas sexualmente por Jean-Claude Arnault, marido de Katarina Frostenson, que também se demitiu.

Outros três membros da Academia Real Sueca e autores, Peter Englund, Klas Ostergren e Kjell Espmark, anunciaram, na semana passada, e em separado, que deram por terminada a sua participação na escolha do vencedor do mais importante prémio mundial de literatura.

A Academia Sueca tem guardado silêncio nos últimos meses em torno das acusações de abuso sexual e tráfico de influências contra Jean-Claude Arnault. mas na quinta-feira, uma reunião de membros da academia, em Estocolmo, espoletou a crise. À mesa debatiam-se as conclusões do inquérito elaborado por um gabinete de advogados com o objetivo de compreender as suas ligações com os membros da academia.

Arnault é casado com a escritora e membro da Academia Katarina Frostenson, e descrito pelo jornal francês Le Mondecomo uma "personalidade cultural de primeiro plano na Suécia".

Segundo o Le Monde, 16 dos 18 participantes (dois deles deixaram de participar por razões que nada têm de ver com as acusações de abuso sexual ou tráfico de influências) desta reunião falharam o objetivo de elaborar um comunicado de imprensa conjunto. Um dos membros, Anders Olsson confirmou à imprensa que existiu uma votação e que a maioria se opôs à expulsão da poeta Katarina Frostenson.

Uma quarta pessoa, Sara Stridsberg, também ameaçou bater com a porta, segundo o New York Times.

São necessárias 12 pessoas para votar a entrada de novos membros. Só ficaram 11

A saída acabou por não se concretizar, e foi a líder do júri do prémio Nobel da Literatura que anunciou a sua demissão, colocando em causa a atribuição do prémio. A Academia Sueca da Literatura deixa de contar com o quórum mínimo de 12 pessoas necessário para votar a entrada de novos membros. Os 18 lugares da academia são vitalícios e só podem voltar a ser ocupados após a morte daquele que ocupa o cargo. O presidente do Comité do Nobel, Per Wastberg veio, entretanto, acalmar os ânimos. "Temos quórum quando oito membros estão presentes".

A situação tem passado tudo menos despercebida na Suécia, e agora para lá das suas fronteiras. "A Torre de Babel caiu", escreveu Asa Linderborg, que edita as páginas de cultura do tabloide sueco Aftonbladet. "A instituição está em ruína", afirmou o editor do Dagens Nyheter.

Foi este jornal que publicou em novembro de 2017 as acusações de assédio sexual das 14 mulheres. Quatro delas davam a cara, acusando uma figura proeminente da cultura sueca. Rapidamente se descobriu tratar-se de Jean-Claude Arnault, 71 anos, diretor artístico do Forum, um lugar onde acontecem eventos culturais na capital sueca.

Os acontecimentos tiveram lugar entre 1996 e 2017, entre a Suécia e Paris, onde a academia sueca tem um apartamento. As agressões eram acompanhadas de ameaças como "Com essa atitude, vou garantir que não dures muito neste ramo" ou "Sabes com quem sou casado?", diz o Le Monde.

Jean-Claude Arnault é também acusado de tráfico de influências. Gabava-se de ser o 19.º membro da academia e de ter tido influência na escola de J.M. G. Le Clézio na atribuição do prémio em 2008.

Foram estas suspeitas que levaram a secretária permanente da Academia Real da Suécia, Sara Danius, a abrir um inquérito um dezembro, procurando averiguar as relações dos vários membros com Jean-Claude Arnault.

A responsável disse que embora a Academia Real Sueca não possa ser responsabilizada pelos abusos de que alegadamente terão sido vítimas as mulheres que acusam Arnault, vários membros acreditam que o nome da Academia foi usado para facilitar os abusos. "É nossa responsabilidade reagir contra isso", disse ao Svenska Dagbladet, citada pelo New York Times.

O relatório com as conclusões deste inquérito deverá ser tornado público esta sexta-feira, dia 13.

O advogado de Arnault rejeita as acusações.

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