'Notas de amor': Valsa a três ao som de Leonard Cohen
Título: 'Notas de Amor'
Realização: Sarah Polley
Com: Michelle Williams, Seth Rogen, Luke Kirby
Classificação: 2 / 5
Notas de Amor chegou às salas de cinema portuguesas com dois anos de atraso mas parece ter os ingredientes certos para conseguir cativar as bilheteiras dos próximos dias - é a segunda longa-metragem realizada pela canadiana Sarah Polley (a primeira foi Longe Dela, título de 2006 em torno da velhice e do Alzheimer) e reúne, também no registo do drama romântico, rostos que facilmente reconhecemos: Michelle Williams (já nomeada para três Óscares de interpretação), Seth Rogen e Sarah Silverman (estes dois curiosamente vindos da comédia).
São a maior força de um filme que, na verdade, parece ter tudo de disfuncional. Sarah Polley dirige muito bem (capacidade que pode ter a ver com a sua grande experiência como atriz) a protagonista Michelle Williams, que encarna a figura de uma mulher casada que, em conflito com a sua vontade, se apaixona pelo vizinho (vivem em Little Portugal, em Toronto), confiando nela a energia que salva o filme de uma visão banal sobre o adultério ou o amor inesperado.
Foi uma decisão correta - os maiores momentos deste filme valem quase totalmente pelo efeito de verdade e capacidade de contenção de Williams -, mas que não deixa de esconder as grandes fragilidades deste Notas de Amor. Polley tenta fugir ao seu próprio convencionalismo refugiando-se numa série de tiques formais e dramáticos que vão definindo aquilo que hoje percebemos como um "estilo" indie-hipster: uma fotografia próxima dos pormenores que privilegia incompreensíveis mudanças no foco e uma constante luz de pôr-do-sol, uma utilização exagerada de canções na banda sonora, personagens que sobrevivem de profissões-tipo (ela escreve panfletos e sonha ser escritora, o marido deseja ser autor de livros de culinária e o amado é pintor introvertido e condutor de riquexó)...
Para além disto, a realizadora esforça-se em se distinguir na sua encenação da realidade ao dar delicado destaque à nudez (da mulher) e a uma vivência intensa e livre do sexo. E é precisamente sobre este ponto que Polley filma a sequência mais bizarra, mas também mais interessante, de Notas de Amor, servindo-se da canção Take this Waltz (que dá o título original ao filme), de Leonard Cohen. Parece-nos por isso que as maiores ideias de realização são, ao mesmo tempo, ideias típicas de teledisco (atente-se também na cena em que protagonista e amado nadam juntos dentro da piscina, ou naquelas em que Video Killed the Radio Star, dos Buggles, dá a energia àquilo que vemos). Estamos, por tudo isto, perante um caso de cinema com uma construção muito pobre - mas que tem, pelos atores e o modo como se esforça em conduzir os sentimentos das personagens, uma verdadeira capacidade de afetar emocionalmente aqueles que se disponham a entrar no universo de Take This Waltz. O que é o mesmo que dizer: entre o filme e o espectador são precisos dois para dançar a valsa.