A noite dos rapazes solitários

O estatuto de cabeça-de-cartaz pertencia à neozelandesa Lorde, mas no primeiro dia de Nos Primavera Sound foi o americano Tyler, the Creator a merecer o título de vencedor, seguido de muito perto pelo compatriota Ezra Furman
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O fim de tarde chuvoso parecia querer transformar o primeiro dia do NOS Primavera Sound em algo de mais outonal, mas mal os Fogo Fogo subiram ao palco a temperatura parece ter começado a subir. Se foi devido aos ritmos quentes do funaná da banda lisboeta ou apenas porque calhou, o certo é que a chuva parou de vez, mas, pelo sim pelo não, ainda eram muitos a entrar no recinto de galochas calçadas (algumas delas até bastantes originais), lançando um nova moda este ano, capaz de rivalizar com as já tradicionais coroas de flores - cada vez mais unissexo.

As nuvens cinzentas ainda serviram de mote aos escoceses The Twilight Sad, que há um par de anos abriram em Lisboa o concerto dos Cure no Meo Arena, quando agradeceram ao festival por lhes proporcionar um clima igual ao do país natal.

Tanto uns como outros, atuaram no novo palco Seat, situado mesmo à entrada do Festival, onde Father John Misty conseguiu a primeira grande enchente da noite, numa altura em que a chuva já parara por completo. O artista americano consegue transformar cada uma das suas atuações numa verdadeira liturgia, mas desta vez o verdadeiro pregador não estava ali, mas antes a algumas centenas de metros, no palco Super Bock, onde Ezra Furman mostrou um rock de muitas cores, feito de uma folk travestida de punk, que consegue fundir numa mesma canção a sensibilidade de Bowie com uma força quase springsteeniana. Maquilhado, com um vestido brilhante e justo, a figura andrógena do cantor e músico americano contrastava com a masculinidade da banda, imaculadamente vestida de branco, como se fosse uma personagem à parte de tudo o resto, vindo sabe-se lá de onde, para profetizar sobre hedonismo e tolerância àquele público de galochas coloridas e coroas de flores na cabeça, através de temas como Love You So Bad, Suck the Blood from My Wound ou da surpreendente versão de Hounds of Love, de Kate Bush.

Ainda atuava a cabeça-de-cartaz da noite, a neozelandesa Lorde, quando uma verdadeira multidão se começou a reunir à volta do palco Seat, onde momentos depois iria atuar Tyler, the Creator. Sozinho em palco (apesar de acompanhado, nas laterais, por uma quase invisível crew de um dj e dois mc) o rapper americano cedo dominou o mar de gente.

Nesta estreia por terras portuguesas, foi recebido como um verdadeiro messias, com as suas palavras a serem repetidas por todos. Tanto quando ia a "coisas mais antigas", como IFHY, um tema de 2013, como quando interpretava as canções do último e aclamado disco Flower Boy, como November, Glitter ou Who Dat Boy, que chegou a provocar momentos de mosh e crowd surfing nas zonas mais em frente em palco.

A noite terminaria ao som de outro rapaz solitário, o britânico Jamie XX, que, no papel de dj, ocupou por sua conta e risco o palco principal do festival, transformando o Parque da Cidade numa imensa pista de dança ao ar livre - onde durante toda a noite não caiu mais uma pinga de chuva.

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