Wim Wenders filma as palavras de Peter Handke
Se o leitor/espectador não acredita em milagres, este é o filme para parar... e voltar a pensar no assunto. Há, de facto, qualquer coisa de miraculoso neste misto de contemplação e vertigem com que Wim Wenders se apropria de um prodigioso texto teatral de Peter Handke, transfigurando-o numa das mais belas cerimónias cinematográficas deste ano de 2016.
São apenas duas personagens sob a luz suave de um fim de tarde de Verão - e só ver o modo como essa luz vai moldando os rostos dos protagonistas (Reda Kateb e Sophie Semin) envolve uma comoção de esplendorosa serenidade. Eles falam sobre o que os liga, cruzando memórias e sensações como quem relança a pergunta essencial: neste mundo de mercantilização das relações, que espaço ainda sobra para a dimensão humana?
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Reencontramos, assim, o próprio cinema como acontecimento que se cola à pulsação do real, embora resistindo a qualquer efeito de reprodução automática. No limite, somos levados a compreender que já não escutamos o silêncio - é o mais belo dos escândalos.
Classificação: ***** excecional