A 24 de março de 1999, depois de as negociações de paz para o Kosovo terem falhado, a NATO iniciava os bombardeamentos contra a Sérvia. Nessa altura, no governo de Slobodan Milosevic, um jovem de 29 anos ocupava o cargo de ministro da Informação. Chamava-se Aleksandar Vucic. Hoje, 17 anos volvidos, o aliado político do principal rosto da guerra na ex-Jugoslávia, prepara-se para ser reeleito primeiro-ministro e está no limiar de conseguir a maioria absoluta..A realidade é fértil em reviravoltas. O ultranacionalista que impôs multas e sanções para os jornalistas que criticassem Milosevic é o mesmo homem que se prepara para guiar a Sérvia no caminho da União Europeia. "Não escondo que mudei e tenho orgulho nessa mudança. Pensei que estava a fazer o melhor para o meu país, mas estava errado", afirmou à AFP em 2012..A mudança foi radical. Basta pensar nas declarações que fez em de 1999, quando as bombas da NATO caíam sobre a Sérvia: "É impossível que criminosos como Bill Clinton e Tony Blair alguma vez tenham tido uma mãe. Em comparação com eles até Hitler era um menino.".Na atual crise dos refugiados, Vucic deu mais uma vez provas de que o ultranacionalismo que o caracterizou é coisa do passado, ao dizer que a Sérvia está disponível para receber uma quota daqueles que procuram asilo na Europa..Salvador ou déspota?.No calendário original, as eleições estavam previstas para março de 2018, mas Vucic decidiu antecipá-las: "Precisamos de mais quatro anos de estabilidade para ficarmos prontos para aderir à UE.".Eleito primeiro-ministro nas legislativas de 2014 com mais de 48% dos votos, não há dúvidas de que o líder do Partido Progressista Sérvio (SNS) vencerá as eleições de hoje. Resta apenas saber se os eleitores irão entregar-lhe o poder absoluto. De acordo com as sondagens das últimas semanas, as previsões oscilam entre os 44,8% e os 54%..Para o jornal Balkan Insight, os próximos anos irão mostrar se Vucic ficará para a história como o salvador da Sérvia ou como o seu déspota. A mesma publicação traça-lhe o perfil de um negociador com ambições sem limites. "A sua mais notável característica é a capacidade de metamorfose para continuar a liderar. O oportunismo levou-o a mudar abruptamente de rumo em 2008. Da noite para o dia, o defensor da Grande Sérvia e adversário da UE transformou-se num moderado e num entusiasta da adesão.".A Europa parece estar cada vez mais perto. Na sexta-feira, Franco Frattini - ex-vice-presidente da Comissão Europeia - esteve em Belgrado para um comício de Vucic e considerou "realista" o objetivo sérvio de concretizar a adesão em 2020..Em junho deverão ser abertos dois dos capítulos considerados cruciais para o processo. O primeiro sobre justiça e direitos fundamentais. O segundo relacionado com liberdade e segurança..Outros candidatos.Nas sondagens para as eleições de hoje, a seguir ao SNS surge a coligação de esquerda liderada pelo Partido Socialista da Sérvia (SPS) - nascido em 1990 da fusão entre a Liga dos Comunistas, de Milosevic, e a Aliança dos Trabalhadores..Apesar de estar garantido o segundo lugar na preferência dos eleitores, Ivica Dacic, cabeça de lista do SPS, deverá ficar abaixo dos 13% (em 2014 chegou aos 13,5%)..O processo eleitoral na Sérvia ficou marcado, no mês passado, por duas decisões do Tribunal Penal Internacional para a ex-Jugoslávia. Radovan Karadzic, ex-líder dos sérvios-bósnios nos anos 1990, foi condenado a 40 anos por genocídio e crimes contra a humanidade. Por outro lado, o ultranacionalista Vojislav Seselj viu-se absolvido de todas as acusações. Seselj é o líder do Partido Radical Sérvio (SRS), que aparece em terceiro lugar nas estimativas eleitorais, com previsões que oscilam entre os 7% e os 10%..Outra das figuras políticas relevantes envolvidas na eleição de hoje é o líder do Partido Social Democrata (SDS), Boris Tadic, presidente sérvio entre 2004 e 2012. Tadic coligou o seu partido com outras duas forças políticas. O cabeça de lista dessa aliança é Nenad Canak, que em 2009 participou no Big Brother Famosos. As estimativas apontam para um resultado ligeiramente acima dos 5%, o limite mínimo para conseguir lugares no Parlamento..No entanto, mesmo que seja eleito deputado, Tadic já afirmou que não irá ocupar a cadeira na Assembleia, deixando-a para outro membro do partido. Tudo indica que os objetivos políticos que persegue são mais altos. Segundo o Balkan Insight, Boris Tadic está a preparar-se para uma recandidatura presidencial nas eleições do próximo ano..Também na luta por conseguir um assento parlamentar está Sanda Raskovic Ivic, considerada a Marine Le Pen da Sérvia. Líder do eurocético Dveri, Raskovicc foi impulsionada pelo descontentamento com a situação económica e com as políticas de austeridade. Ainda assim, será difícil conseguir fazer que a extrema-direita regresse ao Parlamento. Pode não ser um caso de paixão, mas os sérvios querem casar-se com a União Europeia. E vão votar em Aleksandar Vucic para padrinho.