Voos e ruído a mais. Zero andou a vigiar os céus de Lisboa
"Tão dentro da cidade e tão próximo dos residentes, não há outros casos" como o aeroporto de Lisboa, a nível europeu. Quem o diz é Francisco Ferreira, presidente da associação ambientalista Zero, que durante dois dias esteve a medir o ruído dos aviões que sobrevoam os céus da cidade. A conclusão foi clara: o ruído e o número de voos vão além daquilo que a lei permite. Não só o Aeroporto Humberto Delgado tem um regime de exceção na lei, o que lhe permite que durante o período horário em que seria proibida qualquer movimentação (aterragens e descolagens) possa fazer até 26 movimentações, como o ultrapassa. Em número e em volume sonoro.
O local escolhido para a recolha de dados foi a zona do Campo Grande, em Lisboa. No âmbito da campanha "DECIBÉIS A MAIS, O INFERNO NOS CÉUS", a Zero esteve desde as 17:00 de quinta-feira até este sábado de manhã a analisar o ruído ambiente, através daquilo a que designa de sonómetro, e concluiu que este foi ultrapassado nos valores permitidos. "Foram muito ultrapassados", frisa Francisco Ferreira, em entrevista ao DN.
Explica que enquanto o limite de valor na zona em questão, considerada mista (próxima da infraestrutura aeroportuária), é de 65 decibéis, registou-se um valor de 74,5 decibéis. "Cerca de mais dez decibéis", no conjunto dos períodos diários analisados - diurno, entardecer e noturno. Este último para o qual o aeroporto de Lisboa tem direito a um regime de exceção relativamente à quantidade máxima de voos que pode atingir.
"A lei exige que não haja movimentações entre a meia-noite e as 6:00, mas o governo conseguiu negociar um regime de exceção", através do qual passa de zero para 26 movimentações permitidas com aviões, esclareceu o dirigente. Apenas por 26 vezes, os aviões podem descolar ou aterrar neste aeroporto durante este horário, num dia (91 no total da semana). Mas a análise da associação ambientalista concluiu que numa noite houve 28 e numa outra 31 movimentos.
Face aos resultados desta análise, a Zero irá avançar com "uma queixa para a Autoridade Nacional da Aviação Civil, o Ministério das Infraestruturas e a Agência Portuguesa do Ambiente (APA) para aplicarem as devidas consequências ao responsável", que acredita ser da ANA - Aeroportos de Portugal.
As suspeitas sobre o ruído em excesso na cidade e a discussão em torno de um novo aeroporto no Montijo (sobre os seus impactos ambientais) foram o mote para o início desta campanha. Francisco Correia recorda que os motivou o facto de as pessoas não estarem "conscientes do impacto que isto tem na sua saúde", mas confessa que se enganou na premissa. "Começamos a receber imensas mensagens de residentes, alguns deles para nos dizerem que têm de tomar comprimidos para dormir e a oferecerem-se para nos ajudar com a campanha", conta.
"A saúde tem um preço muito elevado. Não podemos só abdicar dela pelos turistas e pela economia", sublinha ainda.
No início deste ano, o governo e a empresa ANA assinaram um acordo para fazer avançar tanto a expansão do Aeroporto Humberto Delgado como a construção do aeroporto complementar do Montijo. O acordo contempla o aumento da capacidade aeroportuária do aeroporto de Lisboa, com a quase duplicação do número de passageiros (dos 30 milhões para 42 milhões por ano) e um aumento no número de movimentações.