Voltar à dracma: plano dos radicais do Syriza previa deter governador do Banco da Grécia

Plataforma de Esquerda, liderada pelo ex-ministro da Energia Panayotis Lafazanis, discutiu num hotel o processo para sair do euro.
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Em primeiro lugar, o governo devia assumir o controlo da casa da moeda da Grécia, onde são mantidas as reservas de dinheiro do país. Depois, acabar com a independência do Banco Central e, se o governador desta instituição, Yannis Stournaras, se opusesse à medida, prendê-lo. Por fim, pedir ajuda a Moscovo. Este era, segundo as informações recolhidas pelo jornal Financial Times, o plano da Plataforma de Esquerda, o grupo dos elementos mais radicais dentro do Syriza, para regressar à dracma. Um plano que só podia falhar.

De acordo com o jornal, o plano foi discutido numa reunião a 14 de julho no Hotel Oscar, em Atenas, depois de o primeiro-ministro, Alexis Tsipras, ter cedido à pressão dos credores no final de uma maratona de 17 horas de negociações em Bruxelas. Muitos no Syriza ficaram "desanimados e desesperados" com a decisão, escreveu o jornal, que entrevistou vários participantes daquela reunião em Atenas e ouviu os jornalistas que aguardavam cá fora o resultado do diálogo.

"Obviamente foi um momento de grande tensão. Mas também estávamos conscientes de um verdadeiro espírito revolucionário na sala", disse ao Financial Times um dos participantes, sob anonimato. A Plataforma de Esquerda é liderada pelo ex-ministro da Energia e do Ambiente, Panayotis Lafazanis, que foi afastado do governo depois de votar no Parlamento contra o primeiro pacote de reformas exigidas pelos credores. Nessa votação, na madrugada de 16 de julho, 38 deputados do Syriza votaram contra ou abstiveram-se. Só o apoio dos partidos da oposição pró-europeus possibilitou a aprovação das medidas de austeridade.

Terá sido Lafazanis a propor que, no cenário de saída do euro e regresso à dracma, o governo assumisse o controlo da casa da moeda da Grécia (Nomismatokopeion). Garantia que as reservas de dinheiro eram de 22 mil milhões de euros e que isso seria suficiente para pagar as pensões e os ordenados dos funcionários públicos até ao lançamento da nova dracma, assim como garantir os fornecimentos de alimentos e combustíveis. O governo assumiria também o controlo do Banco Central da Grécia.

Contudo, segundo o jornal, nos cofres estão apenas cerca de dez mil milhões de euros, um valor insuficiente já que até os dracmas começarem a circular ainda seriam precisos entre seis a oito meses. Além do mais, todo esse dinheiro não poderia ser usado. "A partir do momento que o governo assumisse o controlo, o Banco Central Europeu iria declarar que os euros da Grécia eram falsificados", escreve o Financial Times, que cita um responsável desse banco para indicar que quem tentasse usar essas notas seria detido por falsificação.

A terceira parte do plano, pedir ajuda à Rússia, também não seria mais fácil. Os gregos acreditavam que o apoio do presidente russo, Vladimir Putin, poderia pôr fim aos problemas financeiros. Desde que o Syriza chegou ao poder, em janeiro, que Lafazanis esteve três vezes em Moscovo, como enviado de Tsipras. Em troca de um novo projeto de gasoduto, o governo grego esperava receber pelo menos cinco mil milhões de euros em adiantamento das tarifas de trânsito de gás. Mas os russos recusaram o negócio ainda antes da cimeira decisiva de Bruxelas.

Negociações começam na 2ª-feira

As questões de segurança que obrigaram a adiar o início das negociações para o terceiro resgate, no valor de 86 mil milhões de euros, parecem estar ultrapassadas e os representantes da Comissão Europeia, do Banco Central Europeu (BCE) e do Fundo Monetário Internacional (FMI), a impopular troika, são esperados hoje à noite em Atenas. Amanhã, começa o diálogo.

As negociações estavam previstas para começar na sexta-feira, mas nesse dia não tinha sido ainda encontrado um local que reunisse as condições de segurança para acolher as equipas. Um responsável do Ministério das Finanças grego, sob anonimato, negou à Reuters que em causa estivesse qualquer tentativa do executivo de manter a equipa de credores afastada dos edifícios governamentais. Ontem não tinha sido divulgado publicamente o local escolhido.

O FMI é o último a juntar-se ao grupo de credores, tendo confirmado na sexta-feira à noite ter recebido oficialmente a carta do ministro das Finanças, Euclid Tsakalotos, com o pedido para um novo empréstimo à Grécia. "Vamos discutir com as autoridades gregas e com os nossos parceiros europeus o momento e a forma como vão decorrer as negociações", dizia a declaração do FMI.

A Grécia, que a 30 de junho se tornou o primeiro país desenvolvido a falhar um pagamento ao FMI, pagou a sua dívida que já ascendia a dois mil milhões de euros na passada segunda-feira. Tudo graças a um empréstimo-ponte no valor de 7,2 mil milhões de euros do Mecanismo Europeu de Estabilização Financeira, que permitiu ainda pagar os 4,2 mil milhões de euros de dívida que venciam nesse mesmo dia ao BCE.

A Grécia quer que as negociações estejam concluídas até 20 de agosto, quando tem de pagar novamente ao BCE, desta vez 3,2 mil milhões de euros. Atenas não pode falhar esse pagamento, já que é o BCE que mantém os bancos gregos à tona de água, através da linha de liquidez de emergência (ELA). Apesar de os bancos terem reaberto, continua o controlo de capitais na Grécia. Os gregos só podem levantar 60 euros por dia ou 420 por semana. Contudo, os cidadãos que estejam a planear viajar para o estrangeiro podem levar consigo dois mil euros, segundo uma nova decisão de sexta-feira.

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