Passaram quase 365 dias desde que Gustavo Veloso perdeu a Volta a Portugal para o seu companheiro Rui Vinhas. As imagens e sons daquele 07 de agosto, quente de emoções, ainda pairam na memória de todos, especialmente na do bicampeão derrotado, que no regresso a Lisboa, cidade que o consagrou como campeão em 2014 e 2015 e que consumou a sua derrota no ano passado, recordou uma edição "dura", muito mais a nível psicológico do que competitivo.."Não foi uma Volta mais difícil que outras, foi diferente. Em 2013, perdi para um colega de equipa [Alejandro Marque] por quatro segundos, mas era a primeira Volta. Não havia o favoritismo que eu tinha no ano passado. Eram circunstâncias diferentes", distinguiu o galego em entrevista à agência Lusa..As circunstâncias de que o líder da W52-FC Porto, de 37 anos, fala prenderam-se com a rivalidade que muitos tentaram incentivar entre si e o seu colega português, que viria a ficar à sua frente na geral, depois de fugir para a amarela na terceira etapa.."No momento em que o Vinhas ganhou a camisola amarela, todas as perguntas dos jornalistas eram orientadas para uma hipotética disputa entre os dois. Parece que a Volta éramos só nós. Desde esse ponto de vista, foi uma Volta dura. Chegou um momento em que eu já estava farto de responder sempre às mesmas perguntas", lembrou..À distância de um ano, o experiente espanhol reconhece que as polémicas declarações que proferiu no último dia, quando, no calor do momento, argumentou que tinha sido ele o mais forte na estrada, traduziram o turbilhão de emoções e tensão acumulados durante a competição.."Fui um bocado mal interpretado. Naquela situação, as pessoas só conseguiram ver aquelas declarações e esqueceram-se dos dez dias antes. Com essa pressão, com os jornalistas sempre a perguntar sobre a rivalidade... foi um momento em que eu, depois de cruzar a linha de meta, senti que tinha tirado uma mochila cheia de pedras. Estive pressionado durante toda a Volta. O líder era o Vinhas e a pressão continuava toda a cair em mim. Estavam constantemente a perguntar-me se ia atacar o Vinhas, quando eu ia na roda dos adversários, para servir como travão para ele não perder tempo. Foram umas declarações que fiz, que era o mais forte e que nem sempre quem ganhava era o mais forte... penso que não disse nada que não fosse verdade", defendeu-se o líder 'dragão'..Veloso garantiu, no entanto, que em nenhum momento pretendeu retirar mérito ao feito do seu colega e que, horas mais tarde, superado o "choque emocional" que sentiu quando concluiu o contrarrelógio, celebrou o triunfo do pequeno trepador português como se fosse seu na tradicional festa do Sobrado, localidade sede da W52-FC Porto.."Naquela altura, tinha os sentimentos à flor da pele. As pessoas não repararam, mas as lágrimas caíam, quando tinha o capacete do 'crono' ainda posto. Houve um pequeno detalhe, que ninguém viu: eu tinha auricular, por isso, cortei a meta a saber que não ganhava a Volta. E esperei pelo Vinhas para o felicitar. Podia ter-me ido embora", revelou..Por isso, desenganem-se aqueles que esperam ver cisões na formação portista na 79.ª Volta a Portugal, que arranca hoje com um prólogo em Lisboa, e termina a 15 de agosto, com um contrarrelógio em Viseu.."Nós sabemos que, nestes últimos quatro anos, a nossa arma mais potente em relação aos outros foi a união. Mesmo no ano passado, isso ficou demonstrado. Por muito que as pessoas pudessem especular, na estrada demonstrámos que éramos uma equipa unida e que nos respeitávamos. Este ano, tanto eu como o Vinhas podíamos ter ido para outras equipas, talvez até com melhores condições. Se ficámos aqui, é porque estamos à vontade. Mau ambiente não há", realçou..Visivelmente mais zen do que nas edições anteriores, o favorito número um ao triunfo nesta Volta a Portugal não nega que as agruras de 2016 também se traduziram em ensinamentos.."Aprendi [hesita, demora uns segundos e suspira]... não sei o que aprendi. Se calhar, coisas que já sabia... que, às vezes, não se pode mostrar muito os sentimentos", resumiu.