O plenário dos ministros dos Negócios Estrangeiros da União Europeia decidiu terminar o acordo de facilitação de vistos que existia com a Rússia, ainda que não tenha avançado para a proibição total da emissão desses mesmos vistos..Este é um assunto que está a dividir a Europa, uma vez mais incapaz de conseguir uma posição comum face a Moscovo..Os países que fazem fronteira com a Rússia ou estão, geograficamente, mais próximos de Moscovo não têm dúvidas. A Letónia, Lituânia e Polónia deixaram mesmo de emitir vistos para qualquer cidadão russo que queira viajar. Esta posição é compreensível face à proximidade que estes países têm da realidade sociológica e cultural russa. Com essa proximidade sabem, melhor que ninguém e por experiência própria e pelo percurso da História quais os custos de serem vizinhos de um país belicista, pouco respeitador dos direitos humanos, que tem um comportamento nada consentâneo com a lei e o direito internacional. E que teima em dar preocupantes sinais de não querer respeitar as fronteiras estabelecidas e as soberanias desses Estados. Daí a posição maximalista destes países, após o início da guerra com a Ucrânia, de não quererem receber visitantes russos..Ainda que 70 por cento da população russa seja apoiante da invasão da Ucrânia é necessário aferir as condições em que esse apoio se verifica..Não podemos deixar de levar em linha de conta que a Rússia é uma feroz ditadura, sem qualquer espaço para contraditório, sem liberdade de imprensa. A realidade é construída de acordo com os interesses de um grupo político, oligarcas, chefiados por um presidente cujas raízes se perdem no que de pior tem a escola do KGB/FSB..Aos mais jovens, nos bancos das escolas, são distribuídos manuais escolares que deformam a realidade, constroem uma narrativa quotidiana adaptada aos interesses de uma clique sem escrúpulos que fecha a porta a qualquer sinal de liberdade ou facto vindo do exterior que contrarie a narrativa que impõem..A guerra não é uma guerra, não é uma invasão, não é uma ofensiva. É uma operação especial!.A Ucrânia não é um país, é um território à espera de ser ocupado por essa operação especial para ser limpo de nazis. Os media russos estão proibidos de fazerem referências a civis mortos pelas tropas de Moscovo. Ou seja, o povo russo não sabe na realidade o que se passa. Os jornalistas e correspondentes ocidentais saíram de Moscovo há muito, anulando-se assim qualquer possibilidade de um outro olhar fora da vigilância do Kremlin..A população russa está sem acesso às redes sociais. Não consegue um escrutínio, mínimo que seja, que possa abrir uma brecha no discurso oficial..Os opositores ao regime de Putin são de imediato silenciados ou lançados nas prisões..Ou seja, o povo russo desconhece o que se passa ou tem uma visão destorcida da realidade..Há assim que contextualizar a situação em que se encontra a população russa, o seu desconhecimento e a impossibilidade de poderem avaliar a veracidade de toda a narrativa oficial construída pelo Kremlin..Embora para a esmagadora maioria da população russa seja quase impossível viajar para Europa, os que o fizerem podem ter a oportunidade de avaliar o discurso oficial do Kremlin, verificar as inverdades, os factos escondidos, ter acesso a outras fontes de informação, falar com pessoas que têm outros pontos de vista diferentes do linguarejar oficial de Moscovo..Assim, parece-nos correcta a posição dos que defendem que não deve existir uma proibição total da emissão de vistos para cidadãos russos que queiram viajar para a Europa. Os que puderem que venham e que se informem o mais possível. Que vejam nas televisões ocidentais as imagens que lhes são proibidas na televisão oficial russa. Que vejam os crimes sobre a população ucraniana, os bombardeamentos de bairros civis, de escolas, de hospitais, pelas tropas russas..Estão bem os países, como a Alemanha, França ou Portugal, que fazem um esforço para não misturar Putin e os que o rodeiam com todo o povo russo. Ainda que possa ser chocante ver russos em turismo quando o seu país bombardeia populações civis ucranianas, há que separar os que não estão no perímetro da nomenclatura dirigente russa..Não seria correcto meter tudo no mesmo saco!. Jornalista