Virginia Woolf ou a tremenda continuidade da vida
Entra-se vida adentro como se nada fosse. Podia ser um dia qualquer, uma rua qualquer, uma voz qualquer. "Dado que as ruas que levam de Strand a Enbankment são muito estreitas, é melhor não andar de braço dado." Assim começa A Viagem (The Voyage Out), primeiro romance de Virginia Woolf, publicado a 26 de março de 1915. É uma tarde do começo de outubro em Londres, são Helen e Ridley Ambrose, de braço dado. A voz ou a mão é de Virginia Woolf no que antecede a viagem das duas personagens, assim como da jovem Rachel Vinrace, personagem central, e seu pai, a bordo do Euphrosyne, que ruma à América Latina. O barco atraca em Lisboa. Ali sobem Richard e Clarissa Dalloway, essa que faria o centro e o nome de Mrs. Dalloway (1925), romance que, também ele, como A Viagem, nos põe imediatamente no meio das coisas - "A senhora Dalloway disse que compraria ela mesma as flores." Para a festa, sabemo-lo depois, em torno da qual tudo se organiza.
Numa entrada do seu diário a 4 de fevereiro de 1920, a inglesa Woolf - Adeline Virginia Stephen à nascença, em 1882, filha do escritor Sir Leslie Stephen - conta ter relido esse seu primeiro romance. "Se me perguntarem o que penso terei de responder que não sei, uma tal arlequinada como é, um tal sortido de remendos, aqui simples e severo, aqui frívolo e superficial, aqui como a verdade de Deus, aqui forte e livre a correr como eu poderia desejar." Atribui-lhe algumas "vulgaridades", mas nessa altura já Noite e Dia (Night and Day, 1919) tinha saído e O Quarto de Jacob (Jacob"s Room, 1922) ia nascendo.