Uma overdose de doces, poucos iogurtes sem adição de açúcar e quase nenhuma fruta. A esmagadora maioria dos produtos disponibilizados nas máquinas de venda das universidades e politécnicos está no extremo oposto das orientações da Direção-Geral da Saúde (DGS) para uma alimentação saudável e dois terços seriam mesmo considerados proibidos, se fossem analisados à luz da regulamentação para as instituições do Serviço Nacional de Saúde. Este é o cenário arrasador que vai ser traçado nesta segunda-feira pela Deco na apresentação do Relatório Anual do Programa para a Promoção da Alimentação Saudável, no Porto..O estudo da associação de defesa dos consumidores, realizado em parceria com a Faculdade de Ciências da Nutrição e Alimentação da Universidade do Porto, analisou 135 máquinas de venda automática em cem instituições de ensino superior de todo o país, num total de 5340 produtos alimentares. E o retrato dificilmente podia ser mais negro: os doces (guloseimas, bolachas, bolos e chocolates) estão presentes em todas as máquinas, os snacks salgados em 61%, enquanto as sandes mais saudáveis apenas estão presentes em 31%, os iogurtes sem adição de açúcar em 8% e a fruta fresca em 3%. Os refrigerantes estão presentes na mesma quantidade que a água: 93%..Em relação à composição nutricional, usando um sistema de semáforo, os alimentos analisados têm classificação vermelha para açúcar, gordura e gordura saturada e amarela para o sal. Todas as máquinas analisadas no estudo continham produtos proibidos e numa das máquinas todos os produtos disponíveis seriam classificados como não permitidos. No total, quase dois terços dos produtos analisados (64%) seriam considerados proibidos se nas universidades e politécnicos se aplicasse as regras dos hospitais..Essa é mesmo uma das recomendações da Deco, a "modificação da disponibilidade alimentar das máquinas de vending através da criação de um enquadramento legislativo para o efeito, à semelhança do que existe para outros setores". Já a DGS vai lançar nesta segunda-feira a iniciativa - selo de excelência - "Alimentação Saudável no Ensino Superior", para incentivar as instituições do ensino superior a implementarem estratégias para a promoção da alimentação saudável através de uma distinção pública..DGS lança selo para mudar alimentação no superior.O guia que acompanha a iniciativa lembra que a transição do ensino secundário para o superior, habitualmente associada a um maior nível de independência, coloca um conjunto de desafios à escolha de alimentos saudáveis. "O facto de muitos dos estudantes do ensino superior se encontrarem deslocados da casa dos seus familiares e afastados das suas rotinas alimentares familiares pode explicar estas alterações nos hábitos alimentares, bem como a falta de motivação e competências para a preparação e a confeção de refeições. Alguns estudos mostram que o ingresso no ensino superior está associado a um menor consumo de hortofrutícolas, um maior consumo de produtos alimentares de elevada densidade energética e de alimentos do tipo fast food e a um padrão de consumo com refeições irregulares.".Os dois primeiros critérios para receber esta distinção são precisamente "melhorar a oferta alimentar das máquinas de venda automática" e "reduzir a quantidade de açúcar disponível nas máquinas de venda automática de bebidas quentes". Segundo o estudo da Deco, verificou-se que a totalidade das máquinas de bebidas quentes no ensino superior apresenta um valor máximo de açúcar disponibilizado superior ao recomendado pelo despacho que regulamenta a oferta das máquinas para o SNS (cinco gramas). A média de açúcar nas bebidas quentes é de 11 gramas, mais do dobro do valor recomendado..Resultados que não apanham a DGS de surpresa. A diretora do Programa Nacional para a Promoção da Alimentação Saudável reconhece ao DN que já esperava os resultados do estudo da Deco. "O Programa Nacional para a Promoção da Alimentação Saudável tem considerado a importância de melhorar a oferta alimentar em diferentes espaços públicos como uma das áreas centrais para a promoção da alimentação saudável e tem considerado as instituições do ensino superior como um dos locais onde esta melhoria da oferta alimentar deve ser promovida", sublinha Maria João Gregório..Aumentar a disponibilidade de água nos espaços de utilização comum, não disponibilizar refrigerantes nas cantinas, garantir que os bares apresentam opções alimentares saudáveis facilmente visíveis e não disponibilizar saleiros são outros critérios que universidades e politécnicos devem respeitar para receber o selo de excelência da DGS. As universidades também têm de assegurar que o pão disponível para consumo é escuro ou de farinha integral e que apresenta um teor de sal inferior a 1 g por 100 g de pão, aumentar a oferta e diversidade dos produtos hortícolas como acompanhamento das refeições servidas nas cantinas e aumentar a oferta de leguminosas nas refeições servidas nas cantinas e outros espaços que fornecem refeições. Tudo acompanhado por, pelo menos, uma campanha para a promoção da alimentação saudável dirigida à comunidade académica. A atribuição do selo de excelência será efetuada às instituições que cumpram pelo menos 50% dos requisitos no primeiro ano de adesão, 75% no segundo e 100% no terceiro..À semelhança da DGS, a Deco também defende a promoção da literacia alimentar e nutricional da população universitária, a que junta "a promoção de um trabalho conjunto com os agentes económicos para que o fornecimento das máquinas de vending garanta a oferta de opções saudáveis e uma maior liberdade de escolha pelo consumidor".