Uma aliança entre o norte e o sul de Itália contra o sistema

Liga Norte quer cortar impostos e Movimento 5 Estrelas aumentar benefícios sociais. Os dois partidos estão perto de formar governo. Será o primeiro executivo anti-sistema na Europa
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Os líderes do Movimento 5 Estrelas (M5E, o mais votado nas eleições legislativas de março, com 32%) e da Liga Norte (17%) anunciaram ter dado "passos significativos" para formar governo. "Não consigo esconder o meu entusiasmo e alegria por começarmos a resolver, por fim, os problemas de Itália", reagiu o presidente do M5E, Luigi Di Maio.

O nó mais difícil foi desatado com o afastamento da Força Itália de Silvio Berlusconi - aliado eleitoral da Liga Norte - das negociações. Quer Salvini quer Berlusconi mantiveram o braço-de-ferro com Di Maio, mas o M5E manteve-se inflexível quanto à participação da formação do ex-primeiro-ministro, que se encontra inabilitado para exercer cargos públicos até 2019 devido à condenação por fraude fiscal.

Juntos, M5E e Liga Norte formam uma maioria parlamentar com 352 assentos em 630, bem como no senado (170 em 315).

"Sobre a composição do executivo e do primeiro-ministro foram dados passos significativos com vista a uma colaboração construtiva entre as partes, com o objetivo de definir tudo rapidamente para dar uma resposta e um governo político ao país", escreveram Di Maio e o seu congénere da Liga Norte, Matteo Salvini, após a reunião entre ambos. As reuniões de trabalho prosseguiram de tarde e hoje reúnem-se de novo, em conjunto com outros dirigentes partidários, para discutirem os nomes que vão ser indicados ao presidente Sergio Mattarella. Ao chefe de Estado pediram mais tempo para as negociações chegarem a bom porto.

Mattarella, que acedeu ao pedido para acabar com o impasse de nove semanas, deixou claro, no entanto, que não aceitará uma composição do executivo e um acordo político que sejam contrários a certos valores. "Pensar em prosseguir sem a Europa significa enganar os cidadãos. Acreditar que podemos estar sozinhos é pura ilusão ou, pior, um engano consciente da opinião pública", declarou o presidente numa conferência enquanto Di Maio e Salvini estavam reunidos.

À primeira vista pouco há em comum entre a Liga Norte e o Movimento Cinco Estrelas (M5E). O primeiro, como o nome indica, tem o seu reduto nas regiões setentrionais de Itália (Lombardia e Véneto) e as prioridades passam por pagar menos impostos para, no entender dos seus partidários, financiar Roma e o sul do país. É precisamente no sul, que contrasta em pobreza com o norte, que o segundo conseguiu captar mais votos, ao prometer um rendimento mínimo de 780 euros para os mais necessitados.

Mas um dos pontos que une os dois partidos é o ceticismo quanto a Bruxelas. A Liga Norte, que de partido com ambições secessionistas, se transformou em nacionalista, quer renegociar os tratados europeus e quer abandonar a moeda única. O fundador do M5E, o humorista Beppe Grillo, também defendia a saída do euro, que seria decidida em referendo. Mas o movimento agora liderado por Di Maio parece ter abandonado a ideia. Quanto à renegociação com a União Europeia, ambos se mostram de acordo em acabar com o pacto de fiscal que limita o défice público a 3% do PIB.

Além de terem de chegar a um compromisso em vários temas, os partidos têm de apresentar um nome para primeiro-ministro - o que estará longe de se alcançar. Caso se chegue a um contrato de governação, entra-se numa nova etapa: os militantes do Cinco Estrelas são chamados a votar online. Se o acordo for ratificado, processo que deverá demorar dois a três dias, segundo o La Repubblica, a lista seguirá por fim para o Palácio Quirinal, residência do presidente italiano.

Temas

Fiscalidade
> A Liga Norte quer um imposto único de 15% e a autonomia fiscal das regiões. Ambos os partidos estão contra o limite de 3% do PIB no défice público.

Apoios sociais
> O M5E fez bandeira da campanha eleitoral a criação de um rendimento mínimo para os mais pobres, de 780 euros mensais. A Liga está contra. Custo estimado: 30 mil milhões anuais.

Idade da reforma
> Um dos partidos quer revogar, o outro quer rever a reforma Fornero, que tinha subido para os 67 anos a idade dos trabalhadores saírem da vida ativa . Custo estimado: 20 mil milhões de euros anuais.

Imigração
> A Liga quer acabar com a chegada de migrantes e deportar até cem mil por ano. O M5E afirma querer lutar contra o "negócio da imigração".

Euro
> Os nacionalistas querem a saída da moeda única, os populistas terão recuado na ideia de referendar a saída.

Rússia
> Ambas as formações estão contra sanções económicas à Rússia. Salvini e Di Maio não escondem a admiração por Vladimir Putin.

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