Os defensores europeus de uma longa extensão do Brexit pertencem a duas categorias distintas. A primeira é a daqueles que não pensaram como seria todo o processo até ao fim. Essas pessoas, sem surpresa, são a maioria. A segunda é a dos que pensaram e que estão dispostos a infligir danos colaterais. Eu gostaria de lançar alguma luz sobre a última categoria, e sobre os danos..Uma longa prorrogação da data em que o Reino Unido deve sair da UE, para além de junho deste ano, quase certamente exigirá que o país participe nas eleições europeias, que estão programadas para terem lugar entre 23 e 26 de maio. Antes de entrarem de olhos fechados numa longa extensão, os membros do Conselho Europeu e os chefes de Estado e de governo dos 27 países da UE devem considerar o seguinte:.A primeira consideração é que a UE ir-se-ia sujeitar a ser alvo de acusações de interferência indevida se exigisse um novo referendo em troca de uma longa extensão. Qualquer ação desse tipo pode até mesmo desencadear inadvertidamente um Brexit sem acordo a 29 de março..Alguns defensores de um segundo referendo estão a tentar prolongar o atual impasse até que o Parlamento enfrente um precipício; se o conseguissem, os deputados seriam forçados a decidir entre um segundo referendo e um Brexit sem acordo no último instante. Mas há riscos: o Parlamento pode não aprovar um segundo referendo, mesmo se tiver uma arma apontada. Ou o governo do Reino Unido poderia frustrar uma estratégia desse tipo. Uma votação parlamentar não substitui a legislação existente e os ministros não têm qualquer obrigação legal de aceitar tal pretensão..Em segundo lugar, se o Reino Unido fosse forçado a realizar eleições europeias em maio, o Brexit tornar-se-ia inevitavelmente o tema principal, e não apenas no Reino Unido. Todos os partidos populistas na Europa argumentariam, com razão, que a UE é uma burocracia antidemocrática e egoísta. Isso destruiria as campanhas eleitorais. Tenho dificuldade em entender porque, por exemplo, Emmanuel Macron, o presidente francês, deveria apoiar uma longa extensão que o coloca na defensiva naquela que já está a preparar-se para ser uma luta difícil, quando em vez disso ele poderia estar a expor as ligações entre a extrema-direita em França e a Rússia? Um Brexit atrasado seria um presente para Marine Le Pen e para os antieuropeus de outros países..A participação do Reino Unido nas eleições também tornaria mais difícil os partidos moderados formarem uma maioria no Parlamento Europeu após as eleições. O UKIP (ou o novo partido do Brexit de Nigel Farage) provavelmente serão os vencedores no Reino Unido, aproveitando qualquer indignação a respeito de um longo atraso. Uma tal vitória dos populistas no Reino Unido aumentaria o número de eurocéticos no Parlamento, que poderiam formar uma minoria de bloqueio..Há também o perigo de a UE calcular erroneamente as hipóteses de uma vitória da permanência num segundo referendo. A ideia de um atraso introduziu uma nova dinâmica. Conheço muitas pessoas no Reino Unido, tanto adeptos da saída como da permanência, que ficariam muito irritadas se o Brexit fosse para prolongamento. Eu não tomaria o voto de ninguém por garantido..No entanto, talvez o mais importante de tudo seja que um atraso no Brexit iria distrair a UE de questões mais prementes. Isso suga recursos. A UE não pode combater mais do que uma grande crise de cada vez e enfrenta várias ameaças. A economia da zona euro iniciou uma recessão económica - com taxas de juro de curto prazo de -0,4% e sem espaço para ações efetivas de política monetária. À decisão de Donald Trump de impor tarifas sobre os carros europeus pode seguir-se uma guerra comercial. O presidente dos Estados Unidos também pode questionar o seu compromisso com a NATO quando souber que a Alemanha não está a aumentar os gastos com a defesa. Pelo contrário, o governo alemão, temeroso de incorrer num défice orçamental, recusa-se a aumentar os gastos com a defesa. Finalmente, não devemos subestimar o impacto da China na unidade da UE. A China escolheu a Itália como o centro a partir de onde pode conquistar os mercados europeus para investimentos internos, e para contornar as barreiras que a Alemanha está a tentar erigir. A manutenção da saga do Brexit durante mais um ano ou dois iria distrair das questões geopolíticas mais importantes..O que se deve fazer? Há fanáticos pelo segundo referendo no Reino Unido, plenamente conscientes dos argumentos acima, que dizem que não é necessário participar nas eleições europeias. Eleanor Sharpston, uma advogada britânica no Tribunal de Justiça da União Europeia, pareceu confirmar que isso é legalmente possível. Outros advogados da UE discordam..Politicamente, seria difícil justificar que se privasse mais de 3 milhões de cidadãos da UE que vivem no Reino Unido - nenhum dos quais votou pelo Brexit - do direito de participar nas eleições europeias..Fazê-lo sob a capa de uma causa pró-europeia pareceria irónico. Não consigo pensar numa maneira mais rápida de destruir o apoio a uma causa do que aceitar uma estratégia tão perversa e tão profundamente antieuropeia..Há muitos perigos num longo atraso e nenhuma vantagem para a UE. Ponham fim ao processo, por favor..© The Financial Times Limited, 2019