Começou a correr poucos quilómetros de cada vez aos 45 anos, aproveitando o tempo que tinha de esperar pelo filho nas escolinhas do Benfica. Aos 47 começou a fazer maratonas em Portugal, depois passou para provas no estrangeiro, até chegar às ultramaratonas, em condições extremas. O próximo grande desafio de João Netto, 55 anos, será a Tenzing Hillary Everest Marathon, a maratona mais alta do mundo. Será a 29 de maio, dia em que este diretor-geral de uma empresa de telecomunicações já terá cumprido 56 anos..Será o único português a entrar numa prova que decorrerá debaixo de condições extremamente adversas, onde se atingem os 5450 metros de altitude com temperaturas a rondar os 50 graus negativos. Tudo ao longo de 60 quilómetros, no alto da montanha..Ao DN, João Netto, que terá o patrocínio da Altice nesta aventura, confessa, porém, que este não será o maior desafio da sua carreira. "É verdade que o maior desafio é sempre o próximo e claro que se trata de uma prova muito exigente, mas já participei na World Marathon Challenge em 2019, que consiste em sete maratonas em sete dias e sete continentes [num total de 295 quilómetros]. Foi um desafio e peras, com recuperação a 41 mil pés de altitude. Também já participei numa prova extrema no Polo Norte e tive duas experiências na Antártida", recorda. Esta será a sua 30.ª corrida, entre maratonas e ultramaratonas extreme. "Reservei o número 30 para esta, para me dar sorte", confessa..A ultramaratona será a 29 de maio, mas a subida do Evereste começa a 16 . "Serão 12 dias a subir, de mochila às costas. Quando a prova começar já terei grande desgaste. Estamos a falar de uma maratona que chegará a uma altitude de 5450 quilómetros e por isso a falta de oxigenação será um desafio muito grande", indica. A preparação inclui muitos treinos de corrida e natação, e um treino semanal de bicicleta. A partir deste domingo vai fazer expedições à Sierra Nevada, para adaptação a altitudes a três mil metros. E fará ainda algumas simulações de altitude no Centro de Alto Rendimento do Estádio Nacional..O atleta português ainda não está a par de todos os pormenores logísticos deste difícil desafio: "A organização só vai facultar informação sobre alimentação e ingestão de bebidas em meados de abril. Quando me iniciei, não bebia água, mas percebi que tinha de começar a beber e certamente que o irei fazer desta vez. Normalmente, nestas provas com temperaturas muito baixas, a organização oferece chás quentes, mas não sei se neste caso haverá essa possibilidade.".Mas afinal o que o leva a testar os limites do corpo desta forma? "Já tenho a minha empresa e as chatices do dia a dia, e quando me iniciei nestas aventuras pretendia que fosse um escape. A verdade é que tomou uma proporção totalmente diferente do que estava à espera e felizmente tenho conseguido correr a um nível elevado e tentar chegar aos limites, embora nunca se saiba quais são os nossos verdadeiros limites. Tenho estado a colocar Portugal no radar das competições extremas, juntamente com o Carlos Sá, o João Garcia e outros", destaca. "Receio para esta prova? A minha única preocupação é a respiração, mas espero fazer bem o trabalho de casa com a equipa que me ajuda na preparação e resolver essa questão", acrescenta..João Netto confessa que não é fácil conjugar as várias facetas da sua vida. "Tenho pouco tempo para dormir e para mim próprio, mas tenho conseguido conciliar as coisas. Estou muitos dias fora e a máquina tem de andar, o que nem sempre é fácil. Mas tento instruir a minha equipa para resolver todas as questões", refere. A vida familiar também é afetada, mas por vezes leva consigo, para as provas, a filha Mariana, que tem limitações visuais e motoras. "Em 2015 levei-a à maratona de Lisboa em cadeira de rodas, era a única forma de ela poder acompanhar-me. Ela tem o gosto de me apoiar, é uma guerreira e aguentou-se. E já fizemos outras provas juntos", revela..Apesar da extrema exigência das provas em que entra, João Netto tem menos lesões do que há alguns anos. "Os azares podem acontecer a qualquer pessoa, mas os maiores aconteciam-me porque queria fazer tudo sozinho. A partir do momento em que fui ao World Marathon Challange, em 2019, tive de constituir uma equipa profissional e as coisas melhoraram", destaca..João chegou a levar três injeções de penicilina para poder participar numa ultramaratona no Polo Norte. "Tive uma bronquiolite uma semana antes da viagem, porque saí da praia e fui treinar para uma câmara frigorifica. Obviamente correu mal, mas consegui fazer a prova", recorda. Noutra ocasião, esteve parado três meses, período de tempo em que esteve a tomar um antibiótico para debelar um problema nos intestinos..E qual é o sonho que ainda lhe falta cumprir? "Nenhum em especial, apenas levar a bandeira portuguesa e a dos meus patrocinadores, não defraudando as expetativas das pessoas. E continuar a chegar ao fim da provas com sucesso.".Deixar de correr estas provas extremas é algo em que para já não pensa. "O meu objetivo, para já, é o Evereste. A verdade é que uma pessoa não pode fazer planos e posso dar como exemplo o facto de já ter tido esta prova paga duas vezes e em ambas as situações não pude ir por questões de saúde. O meu foco está nesta prova e nem penso se haverá outra ou não", conclui..dnot@dn.pt