E deu mesmo Volodymyr. As televisões falam de uma vitória por valores superiores a 70%. Mesmo contando com uma enorme margem de erro, dificilmente a presidência da república escapará ao candidato-surpresa das eleições ucranianas. Volodymyr Zelensky, que se tornou conhecido no país ao interpretar o papel de presidente numa série televisiva de comédia, vai a partir de agora ter de tornar-se sério: é ele o novo residente do Palácio de Mariyinsky..A ficção e a realidade confundem-se na história do novo chefe de Estado do país. Na série Ao Serviço do Povo, Zelensky dá corpo a um professor de História de uma escola secundária que se torna o novo herói das massas ao fazer um discurso que se torna viral criticando a corrupção na política ucraniana..E a sua campanha, na verdade, não apostou num discurso assim tão diferente. O candidato presidencial fez-se uma figura popular dando voz à mesma ideia - o total desdém pelo serviço que a classe política tem prestado ao país e a aposta numa refundação da economia baseada em critérios de seriedade.."Mais do que uma vitória de Zelensky, uma derrota de Poroshenko".A eurodeputada Ana Gomes, que acompanhou as votações no terreno enquanto observadora internacional, diz por telefone ao DN que "mais do que uma vitória de Zelensky, esta é uma derrota de Petro Poroshenko". O candidato derrotado já veio a público felicitar o seu opositor e admitir que falhou o segundo mandato. Se as sondagens da televisão ucraniana estiverem corretas, o ainda presidente não conseguiu mais de 25% dos votos, contra os 73% do rival.."O discurso de Zelensky centrou-se no ataque às oligarquias, que dominam o país desde o final da União Soviética e atiram o país para um sistema corrupto", diz Ana Gomes. "Mais do que votarem nele por o conhecerem, os ucranianos quiseram votar pela mudança do sistema, pelo combate às oligarquias, e preferiram um absoluto desconhecido a alguém que já conheciam, mas que era ele próprio um oligarca.".O novo presidente, entretanto, já fez a sua declaração de vitória - e fê-la com o mesmo estilo com que comandou a campanha, apostado mais em piadas e vídeos cómicos do que em compromissos. "Obrigado a todos os que votaram em mim e obrigado a todos os que não votaram em mim. Prometo que não vou estragar isto tudo.".Os desafios da economia e da Rússia.Além de ter pela frente a missão de recuperar uma economia debilitada, Zelensky tem no conflito com os separatistas que o Kremlin apoia o seu grande desafio. "Ele já disse que quer negociar a paz, mas não vai ser fácil fazê-lo", diz Ana Gomes. "Os ucranianos estão fartos da guerra. Surpreendeu-me ver que aqui as pessoas não estão contra a Rússia propriamente dita. Estão contra a Rússia de Putin e dos oligarcas.".Putin tornou-se um ator incontornável da política ucraniana desde a anexação da Crimeia, em 2014, e o apoio aos grupos separatistas que se levantaram desde então no sudeste do país. No total, 13 mil ucranianos perderam já a vida no conflito. Zelensky quer tréguas. Resta saber se Putin aceita.