O Twitter começou por ser um divertimento, mas agora é um media de pleno direito. Aos 14 anos funciona exatamente como um adolescente perturbado: irresponsável mas com um impacto imenso naqueles que atinge, inimputável mas com um registo de crimes crescente com a sua assinatura..Nos primeiros anos, o sucesso aconteceu porque a plataforma foi vista como uma espécie de microblogue e porque as empresas de media aderiram em massa a um serviço perfeito para propagar informação. E esta, organizada por hastags e determinada pelos famosos que depressa aderiram, tornou-se viral. Apesar de ser pensado para as massas, o Twitter acabou por se tornar a ferramenta preferida dos políticos, dos jornalistas e dos influenciadores de opinião. E como o poder de uma rede social multiplica vozes anónimas, muitos procuraram o Twitter para revelar acontecimentos e discutir problemas. Em 2009, a queda de um avião no rio Hudson, mesmo em frente a Manhattan, foi revelada em primeira mão no Twitter. Nesse mesmo ano, um tweet foi enviado a partir do espaço, por um astronauta sediado na Estação Espacial Internacional..Os primeiros anos foram de um sucesso incrível e até 2010 o crescimento foi tão grande que os servidores não aguentavam o tráfego e muitas vezes iam abaixo. O carácter político do Twitter foi reforçado quando desempenhou um papel importante na Primavera Árabe, na organização de movimentos de protesto como o Occupy Wall Street e no alerta sobre a operação que levou à morte de Bin Laden..O feed individual foi tão bem-sucedido que acabou por ser copiado pelo Facebook, mas o Twitter reteve o carácter mais qualitativo das redes sociais. Isso também colocou-o numa posição mais frágil quer no número de utilizadores quer na recolha publicitária - e levou a comparações injustas com o Facebook dada a enorme diferença entre os serviços. Enquanto o Facebook copiava e/ou comprava o que podia da concorrência, o Twitter tentava inovar: lançou o Vine em 2013, seis anos antes de um seu derivado, o TikTok, conquistar o mundo; e em 2015 lançou o Periscope, mais um passo inovador na utilização de vídeo em direto nas redes sociais..A sua vida foi atribulada, mas desde o regresso do fundador Jack Dorsey, em 2016, que um novo ciclo se iniciou..A rede social do pássaro azul já estava na bolsa há três anos, mas não havia maneira de descolar e considerou-se que o regresso do seu criador seria uma boa ideia. Os últimos anos foram passados sob acusações: primeiro, de não combater devidamente o discurso de ódio, algo admitido pela própria empresa e cuja resolução ainda é um problema por resolver; e, segundo, de conceder ao presidente dos EUA uma plataforma para espalhar mentiras, beneficiando de uma exceção conferida pelo imenso número de seguidores que tem e que representam uma parte significativa do tráfego da plataforma..Trump construiu a sua audiência nacional no Twitter. Angariou os seus primeiros fiéis no Twitter. Arregimentou os extremistas no Twitter. Atacou os seus oponentes no Twitter. E, já presidente, usou e usa o Twitter diariamente para espalhar mentiras, atacar entidades e cidadãos que discordam dele, disseminar o ódio e ameaçar países com declarações de guerra. Tudo isto foi tolerado, permitido e encorajado pela administração do Twitter, porque isso deu-lhe a rota de crescimento necessária para manter a plataforma viva. É o pecado capital de uma plataforma cuja liderança vê-se agora em risco: um investidor tido como próximo de Trump está a comprar as ações baratas do Twitter para afastar o fundador da direção e, alegadamente, transformar o serviço numa ainda maior caixa de repercussão dos populistas que vão fazendo furor, gerando tráfego e promovendo lucros..Assim, é bem possível que, daqui a um ano, Dorsey já não mande no Twitter e que este esteja pior. No fundo, seria a consumação do produto original porque o Twitter, como o Facebook, é um produto do seu tempo. Um tempo em que a economia mundial foi agitada por um grupo de rapazes brancos e ricos na Califórnia, que não pensaram muito bem no que estavam a fazer. O que estavam a fazer era construir ferramentas que iriam pôr em causa a democracia, o Estado de direito e as liberdades civis em grande parte do mundo. Essas consequências estão hoje a sentir-se plenamente, como quando o presidente dos Estados Unidos se coliga com exércitos de bots para promover mensagens racistas ou misóginas que põem em perigo milhares de pessoas, quando manobras de desinformação nascem e crescem na plataforma e quando países estrangeiros manobram os algoritmos para influenciar eleições. Um dia, também o Twitter irá desaparecer. A dúvida é se ainda vai a tempo de melhorar o seu lugar na história, porque até agora fez mais mal do que bem.