No dia 16 de junho de 2015, o empresário e estrela de reality TV Donald Trump desceu as escadas rolantes douradas da Trump Tower, em Nova Iorque, e, perante dezenas de pessoas, algumas das quais pagas, exclamou: "Que grupo de pessoas! Milhares." Depois fez um discurso no qual, além de visar Barack Obama, declarou o México e a China como inimigos dos EUA. O primeiro por "enviarem pessoas que têm muitos problemas" e que levam "drogas" e "crime", além de serem "violadores", pelo que iria pagar pelo "grande muro" que iria construir; e Pequim por tirar os empregos aos norte-americanos e por ter uma liderança "muito mais inteligente" do que a Casa Branca.."Os nossos inimigos estão cada vez mais fortes a cada dia que passa, e os EUA, enquanto país, estão cada vez mais fracos. Quão estúpidos são os nossos dirigentes, quão estúpidos são os nossos políticos ao deixar que isto aconteça? O nosso presidente não tem a menor ideia", disse então..Desta vez, Donald Trump continua a ser empresário - apesar de ter prometido o contrário - e também estrela de reality shows, embora não exclusivamente na TV. É o presidente dos EUA em exercício e vai anunciar a recandidatura à presidência em Orlando, na Florida. Ao contrário de há quatro anos, o local escolhido permite uma audiência de milhares de pessoas, 20 mil. É o Amway Center, o pavilhão onde joga a equipa de basquetebol Orlando Magic..Em casa da diretora de campanha.A escolha do local não foi um acaso. A secretária da Educação de Trump, Betsy DeVos, vai ser a diretora da campanha de Trump. Betsy DeVos é a mulher de Dick, ex-presidente da Amway e filho do fundador da empresa de vendas diretas, Richard DeVos, que por sua vez foi também presidente do clube da NBA; neste momento sentam-se no conselho de administração da Amway os outros filhos de Richard, Cheri, Dan e Doug, que é o atual presidente do Orlando Magic..Donald Trump afirmou no Twitter que mais de cem mil pessoas haviam pedido entradas para o pavilhão e que a organização está a montar ecrãs gigantes no exterior..O anúncio de recandidatura dá-se horas depois de Donald Trump ter demitido três especialistas em sondagens. Uma sondagem interna que foi revelada pela ABC mostra que o presidente perde para Joe Biden em todos os estados analisados, exceto no Texas, e neste caso por uma margem mínima. Em sete estados (Wisconsin, Pensilvânia, Florida, Michigan, Virgínia, Minnesota e Maine) a diferença é superior a dez pontos percentuais. Um dos especialistas demitidos é Brett Lloyd, presidente da Polling Company, empresa fundada pela conselheira da Casa Branca Kellyanne Conway..Há dias, Conway foi notícia porque uma agência de supervisão federal aconselhou Donald Trump a exonerá-la por violar a lei repetidamente, mas a Casa Branca rejeitou de imediato essa hipótese..Biden é o alvo.Trump reagiu aos números dizendo que são "sondagens falsas". "São números falsos. Mas sabem quando é que vão perceber isso? No dia das eleições." Elementos da sua campanha não negaram a veracidade da pesquisa, mas clarificaram que a sondagem é de março..Perante um possível adversário tão popular nas sondagens - mas há duas dezenas de candidatos no campo democrata -, é de prever que, no discurso de Trump, Joe Biden seja o alvo a abater. Será a sequência lógica após o bate-boca que já começou há uns dias. Biden disse que Trump é "literalmente uma ameaça existencial aos Estados Unidos", e Trump classificou o vice-presidente de Barack Obama como "mentalmente fraco"..Adversário interno é mau sinal.Muitos republicanos com notoriedade como Mitt Romney, Ted Cruz, Marco Rubio ou Rand Paul já anunciaram que não vão fazer oposição a Donald Trump (e alguns que o apoiam). O facto de Trump ser acusado pelo campo democrata de ter uma política externa errática, que inclui amizades com o presidente russo Vladimir Putin e o líder norte-coreano Kim Jong-un e uma tensão permanente com os aliados, ou de estar a ser investigado em mais de uma dúzia de casos e de poder vir a responder no Congresso por obstrução à justiça não serão argumentos fortes para os dirigentes do Grand Old Party..No entanto, Donald Trump não vai ser o candidato republicano por aclamação dos delegados. Terá de se bater pelo menos com um candidato. Bill Weld, ex-governador de Massachusetts, de 73 anos, vai desafiar o chefe do Estado norte-americano. Weld anunciou a candidatura em abril e pretende ser o oposto de Trump: fiscalmente conservador, moderado e centrista ao ponto de prometer um governo bipartidário..Na história política dos Estados Unidos, o desafio nas primárias à recandidatura do presidente começou nos anos 60, quando o sistema das primárias foi adotado pelos dois partidos dominantes. Não é muito comum acontecer, até porque a oposição a quem está na Casa Branca é vista como um enfraquecimento da candidatura. Até hoje nenhum candidato conseguiu desalojar o presidente em exercício, mas parece haver uma relação com o destino do presidente..Quem esteve mais perto desse feito foi o republicano Ronald Reagan, quando desafiou em 1976 o presidente Gerald Ford, mas este obteve 53,3% contra 45,9% do ex-ator. E depois Ford perdeu as presidenciais para o democrata Jimmy Carter. Que por sua vez foi desafiado, em 1980, por Ted Kennedy. Que aconteceu? Carter ganhou as primárias, mas perdeu a eleição presidencial para Reagan. O mesmo voltou a suceder em 1992 com George H.W. Bush quando travou as primárias contra Pat Buchanan: mais tarde Bill Clinton foi eleito e impediu a reeleição do presidente.