Jorge Jesus foi o percursor da aposta dos clubes brasileiros em treinadores estrangeiros, que entretanto virou moda. É fácil perceber porquê: ao serviço do Flamengo, em 2019 e 2020, conquistou o Brasileirão de 2019, a Copa Libertadores do mesmo ano e em 2020 a Supercopa do Brasil, a Recopa Sudamericana e o Campeonato Carioca. Isto para além de ter dado muita luta ao Liverpool na final do Mundial de Clubes de 2019, perdendo por 0-1 no prolongamento..Nos últimos dez anos, e com a recente chegada de Paulo Sousa ao Flamengo e de Alexander Medina ao Internacional de Porto Alegre, subiu para 28 o número de técnicos estrangeiros no futebol "canarinho", oito dos quais portugueses. Nesse lote, para lá dos referidos Jorge Jesus e Paulo Sousa, estão incluídos Abel Ferreira, António Oliveira, Jesualdo Ferreira, Augusto Inácio, Ricardo Sá Pinto e Paulo Bento. Só a Argentina consegue "bater-se" com Portugal, registando o mesmo número de oito representantes, seguindo-se o Uruguai, com três..A próxima edição do campeonato brasileiro poderá contar com três técnicos portugueses, caso Jorge Jesus regresse a um país onde teve enorme sucesso. O Atlético de Mineiro, campeão em título, parece ser uma forte hipótese, pois ao desejo de contar com Jesus como substituto de Cuca, soma-se o facto de o "galo" encaixar no perfil de equipa que agrada ao experiente técnico de 67 anos que deixou o Benfica recentemente: plantel forte, formado por jogadores consagrados, e boa capacidade de investimento..Na última década, o técnico estrangeiro com melhor aproveitamento em terras brasileiras (82%) é, de longe, Jorge Jesus, com 44 vitórias, 10 empates e quatro derrotas, em 58 encontros no Flamengo. Segue-se Juan Carrasco, uruguaio que ao serviço do Athlético Paranaense teve 68% de aproveitamento em 2012.Abel Ferreira é outro exemplo de enorme sucesso: ao serviço do Palmeiras conseguiu o impressionante bis na Copa dos Libertadores e ganhou ainda a Copa do Brasil de 2020. Até ao momento, obteve 53 vitórias, 22 empates e 27 derrotas em 102 jogos, o que corresponde a 59% de taxa de aproveitamento, que o colocam no oitavo lugar na lista de 33 desempenhos dos 28 estrangeiros nos últimos dez anos (alguns trabalharam em mais do que um clube). No entanto, se considerarmos que já ganhou três troféus, sendo que dois foram a Libertadores, o balanço é bem mais positivo....Entre 2011 e o início de 2018, os treinadores estrangeiros no Brasileirão só tinham sido responsáveis pela conquista de um troféu - o Gauchão de 2015 por parte de Diego Aguirre, ao serviço do Internacional de Porto Alegre -, mas entretanto o número de conquistas aumentou para 12, com altíssimo contributo português (cinco por Jorge Jesus e três por Abel Ferreira). De acordo com o globoesportes, o tempo médio no comando dos estrangeiros é de seis meses e 33 jogos, com aproveitamento de 49%..António Oliveira (filho do treinador Toni, referência do Benfica), foi outro treinador português que teve sucesso, ao serviço do Athlético Paranaense. Desde outubro de 2020 que fazia parte da equipa técnica liderada por Paulo Autuori (ex-técnico de Benfica, Vitória de Guimarães, Nacional e Marítimo), mas em 2021 assumiu o comando, tendo orientado a equipa em 40 desafios, nos quais obteve 21 vitórias, sete empates e 12 derrotas. Ou seja, um aproveitamento de 58%, números de realce para um emblema que não está no lote dos favoritos aos troféus..Mas a presença de treinadores portugueses no Brasil nem sempre foi sinónimo de sucesso. Sá Pinto esteve dois meses no Vasco da Gama, em 2020, tendo orientado a equipa em 15 jogos, com três vitórias, seis empates e seis derrotas (33% de aproveitamento) . Foi o primeiro português na história do clube, apesar da ligação dos vascaínos a Portugal . Durante esse período não recebeu qualquer ordenado e deixou a equipa no 17º lugar do Brasileirão, em zona de despromoção , ainda que com uma partida em atraso - tendo ainda sido eliminado da Taça Sul-Americana nos oitavos de final, frente ao Defensa e Justicia..Outra passagem curta pelo futebol brasileiro foi a de Jesualdo Ferreira, que no mesmo ano de 2020 orientou o Santos. Curiosamente, realizou as mesmas 15 partidas do que Sá Pinto, tendo obtido seis triunfos, quatro empates e cinco derrotas, com aproveitamento de 49%. Em entrevista à ESPN Brasil, um mês e meio depois de ter abandonado o "peixe", não poupou o presidente José Carlos Peres. "Na minha demissão o presidente não esteve presente, nem ele, nem ninguém da direção. Foi uma tremenda falta de respeito. O Santos tem jogadores, dirigentes e adeptos incríveis que eu saúdo com muito prazer e por todos esses órgãos e pessoas tenho muito respeito. O senhor José Carlos Peres? Eu não tenho, porque não teve comigo", atirou..Ainda em 2020, Augusto Inácio teve uma passagem ainda mais meteórica pelo modesto Avaí. Saiu ao fim de apenas sete jogos, nos quais registou duas vitórias, um empate e quatro derrotas, o que correspondeu a 33% de aproveitamento..A experiência de Paulo Bento ao serviço do Cruzeiro de Belo Horizonte, em 2016, também não foi longa. Foram 16 partidas, com seis triunfos, três empates e oito derrotas, com taxa de aproveitamento de 41%. O ex-selecionador nacional deixou a equipa no penúltimo lugar do Brasileirão..No lote de 26 treinadores estrangeiros neste período de dez anos (Paulo Sousa e Alexander Medina ainda não se estrearam), Jorge Jesus foi o que conseguiu mais troféus (cinco), ao serviço do Flamengo. Abel Ferreira, no Palmeiras, é o recordista de jogos numa só passagem (102) e de mais tempo consecutivo no comando (424, ainda em contagem), embora Diego Aguirre tenha somado um total de 155 partidas, ao serviço do Atlético Mineiro, Internacional de Porto Alegre e São Paulo. Petkovic, no Vitória da Bahia, foi o que menos tempo aguentou (23 dias) e também o que registou pior aproveitamento (8%)..Edmilson, antigo avançado brasileiro do FC Porto e do Sporting, vai dividindo o seu tempo entre Portugal e o Brasil, é um um espectador atento ao futebol dos dois países e um grande defensor da aposta em profissionais do nosso país.."É normal que os clubes brasileiros estejam a contratar um número elevado de técnicos portugueses, pois está à vista a sua qualificação. São treinadores muito bem preparados, com metodologia de treino muito avançada e que estudam muito. Os treinadores brasileiros têm de acordar, de se atualizar, pois para além de perderem em termos de qualidade para os portugueses, também já estão a ser ultrapassados pelos seus colegas da América do Sul, nomeadamente os argentinos e os uruguaios", referiu ao DN..Edmilson lembra que "Abel Ferreira foi bicampeão da Libertadores pelo Palmeiras e Jesus ganhou tudo ao serviço do Flamengo, o que mostra bem a qualidade dos melhores treinadores portugueses, que estão a realizar bons trabalhos um pouco por todo o mundo, como podemos ver por exemplo com o Bruno Lage em Inglaterra, o Pedro Martins, na Grécia e outros"..Edmilson diz mesmo que os técnicos locais têm aprendido muito com os portugueses. "Foi o próprio presidente da Associação de Treinadores Brasileiros que o afirmou. A chegada dos portugueses tem tirado os brasileiros da sua zona de conforto, obrigando-os a atualizarem-se e a repensar os seus métodos", realçou. Na sua opinião, outro passo que contribuiria para a melhoria do futebol brasileiro seria a chegada de jogadores portugueses. "Posso ajudar nisso e atenção que atualmente os clubes daqui pagam muito bem, inclusivamente da Série B e da Série C. Seria muito benéfico, pois o futebolista português é muito obediente taticamente. Já os brasileiros necessitam de melhorar muito nessa vertente, bastando ver o que têm sido os desempenhos modestos do Pepê no FC Porto e do Everton Cebolinha no Benfica, eles que eram craques no Brasil", destacou..Edmilson acredita que Paulo Sousa vai ter sucesso no Flamengo, mas avisa que os primeiros tempos não vão ser fáceis. "A sombra do Jesus vai estar a pairar sobre ele. Os adeptos são muito exigentes e vão lembrar-se que o antigo técnico ganhou tudo. A cobrança vai ser grande e tenho receio do que possa acontecer se o Paulo Sousa não começar a ter sucesso no imediato", apontou..Para Edmilson, o Atlético Mineiro é o clube ideal para Jorge Jesus. "Tem uma estrutura enorme. Tive a oportunidade de visitar a nova Arena [o novo estádio do clube, que deverá estar concluído em 2023] e é um projeto impressionante. E Belo Horizonte faz jus ao nome, pois é uma bela cidade para viver. Certamente que Jesus vai adaptar-se sem problemas", anteviu. Por outro lado, confessa-se ansioso "pela polémica que ele vai trazer, pois também é bom haver alguma polémica, para "apimentar" a coisa"..dnot@dn.pt