Todos à espera que João Gilberto abra a porta de casa
Passou pouco mais de uma semana desde que um tribunal do Rio de Janeiro autorizou a entrada forçada no apartamento do músico João Gilberto, a pedido da sua filha, Bebel Gilberto. Mas até agora ainda nada aconteceu. O músico de 86 anos, o pai da Bossa Nova, que será para sempre lembrado como a voz de temas incontornáveis como Chega de Saudade, em parceria com Tom Jobim e Vinicius de Moraes, continua em casa e a família continua trocando acusações públicas sobre o seu estado de saúde e também sobre a saúde das suas finanças.
Afastado dos holofotes nos últimos anos, de acordo com a imprensa brasileira, o artista está doente, debilitado, e vive recluso, por vontade própria, num apartamento alugado no Rio de Janeiro. João Gilberto mora sozinho e não é visto fora de casa há muitos anos, nem pelos vizinhos do prédio, na rua Carlos Góis, no bairro de Ipanema. E está falido.
Em novembro passado, João Gilberto foi interditado judicialmente pela filha Bebel devido aos muitos problemas financeiros que enfrenta. Mas para que Bebel Gilberto possa ser a representante legal do pai definitivamente - ou seja, para que possa tomar todas as decisões relativamente a património, contratos, finanças e legado artístico -, é necessário que o cantor passe por uma perícia médica para determinar seu estado de saúde. Houve, pelo menos, cinco tentativas de notificar o artista, mas ele sempre se recusou a abrir a porta. Até que na semana passada, a filha de Miúcha conseguiu a autorização da justiça para arrombar a casa do músico e levá-lo a fazer exames médicos.
"Espero que não seja internado. A situação é difícil, ele é muito fechado, tem 86 anos e algumas questões de saúde. Está muito magrinho. A Bebel está tentando de tudo por ele. Todos queremos que o João se trate. Ele foge de médico como o diabo da cruz. Se a gente marcar, ele desmarca 30 vezes", afirmou a ex-mulher, Miúcha, garantindo ainda que a situação não é tão má quanto alguma imprensa quer fazer crer: "Ele está cantando e tocando lindamente. É impressionante, mesmo com a idade."
A interdição do cantor foi pedida porque "João já vem apresentando, há alguns anos, um quadro confusional, que não permite a ele compreender com clareza e exatidão os atos jurídicos que lhe são solicitados por terceiros, resultando numa situação atual de absoluta penúria financeira, apesar de ser titular de direitos autorais que deveriam lhe garantir mais que sua subsistência por toda a sua vida", diz o comunicado divulgado por Bebel, através da sua advogada, Simone Kamenetz.
No entanto, a história não é assim tão simples.
Filhos e ex-companheiras de João Gilberto lutam pelo poder de controlar o património de João Gilberto. De um lado do conflito está Claudia Faissol, ex-companheira do músico; e, do outro, os dois filhos mais velhos do compositor, João Marcelo e Bebel. Os filhos acusam Claudia de administrar de forma incompetente os negócios do artista, função que ela cumpriu durante mais de uma década. Mas a situação não melhorou com o afastamento de Claudia, sendo substituída por Maria do Céu Harris, outra ex-companheira do músico.
Um dos deslizes ocorreu em 2011: quando completou 80 anos, João Gilberto anunciou que faria espetáculos comemorativos pelo Brasil. Mas os concertos foram cancelados por motivos de saúde e a Justiça ordenou que ele pagasse 1,2 milhões de reais de multa à produção. Outro erro foi cometido, segundo João Marcelo e Bebel, em 2013, com a entrega de 60% dos direitos sobre os quatro primeiros discos do cantor ao banco Opportunity. Esta terá sido, segundo Claudia, uma maneira de minorar os problemas financeiros de João Gilberto. Mas João Marcelo acusou-a de fazer um negócio por fora com o banco, recebendo de 5% a 10% do valor negociado. "Ela é uma criminosa e continua a roubar do meu pai", dizia João Marcelo, em julho do ano passado. "Se as finanças do meu pai não estivessem um circo, ele estaria cheio de dinheiro."
Entretanto, os dois irmãos também já se desentenderam. Numa longa publicação no Facebook, em inglês (ele vive nos Estados Unidos), Marcelo criticou Bebel: "Meu pai foi efetivamente sequestrado e alienado de mim e da minha família direta. Eu não fui informado, aconselhado, consultado ou sequer tinha conhecimento das maquinações legais ou físicas que minha irmã tomou", escreveu, antes de finalizar: "Desculpa, pai, eu não consegui manter os abutres longe de você."