Taxistas
Hoje em dia, telefono ao Toste. O Toste é o taxista ideal. Chega a horas, conduz com firmeza e ainda me fala de teatro. Faz parte de um grupo amador que agora até tem uma sede. Aqui há uns anos, representaram Nelson Rodrigues, experiência de que o Toste nunca se esqueceu. Um dia talvez encenem um texto meu, assim o Toste consiga persuadir-me.
O Toste não é sequer um taxista: dirige um pequeno centro cultural em forma de táxi. Chego a ter pena de não precisar mais vezes de táxi.
Mas o meu grande chofer, na Terceira, era o Sr. Hermínio. O Sr. Hermínio, que tinha um carro descaracterizado, trabalhava sobretudo com os vendedores de medicamentos, para quem decorava as rotinas dos médicos. Como o seu carro se confundia facilmente com um carro de luxo, também era chamado a acartar entidades.
Chegou a transportar o Presidente da República. Que digo eu: até o presidente do Sporting transportou. E, de vez em quando, também se ocupava de colaboradores da RTP, para que na altura eu trabalhava.
Aquilo é que era, uma viagem com o Sr. Hermínio. O Sr. Hermínio passava a noite a limpar o automóvel. Podiam lamber-se os tapetes. E, depois, havia a pantomina. Os suspiros exasperados com o Sporting. As histórias mirabolantes. O conjunto camisa-gravata-casaco que seria tonto se não fosse tão encantador.
O modo como o Sr. Hermínio desacelerava, para a viagem durar.
O Sr. Hermínio reformou-se, e é pena. O Sr. Hermínio é uma personagem, e as personagens são sempre um milagre.
De qualquer modo, quando leio sobre esta guerra entre velhos e novos taxistas, os lisboetas fixes cantando hinos à Uber porque a Uber é muito fixe também, tenho primeiro pena das pessoas e depois vontade de rir. Os meus taxistas são o Toste e o Sr. Hermínio - eu estava bem tramado se a minha escolha definisse o quão fixe sou.