Como vai ser esta estreia ao vivo em Portugal?.É um concerto muito especial, porque representa uma nova fase na minha carreira. Marca a abertura de um novo mercado, que é o português. Em Angola posso dizer que já fiz tudo o que havia para fazer, seja ao nível de festivais, de salas de espetáculos ou de prémios. Necessitava de novos desafios e este convite para atuar no Mexefest é uma injeção de motivação que chegou na altura certa. Sinto-me quase como se estivesse a iniciar tudo do zero, apesar de ter um trabalho já feito, em Angola, que torna todo este processo mais fácil..No fundo trata-se de um regresso, pois foi em Portugal que Eva começou a rimar, certo?.É verdade, costumo até dizer que sou uma das filhas do hip-hop tuga (risos). Comecei a rimar cá, quando ainda andava no liceu e este concerto é também como um regresso a casa, com muito mais experiência e uma carreira já feita. Quando saí de Portugal para Angola, em 2010, tinha 22 anos. Ainda estava à procura de um caminho..Quando e como é que se começou a interessar pela música e em particular pelo rap?.A primeira vez que ouvi hip-hop foi através de um tio meu. Ele tinha uns cd do Boss AC e dos Da Weasel, que eu costumava ouvir com o meu primo Ruben. Tínhamos oito ou nove anos e ficámos viciados naquilo. Por volta dos 12 anos, quando andava na Escola Paula da Gama, na Amora, comecei a soltar as primeiras rimas, mas foi só na escola Fernando Namora, na Brandoa, onde havia um forte movimento hip-hop, com rodas de freestyle e batalhas de MC a toda a hora e em todo o lado, que decidi que queria ser uma MC. Nunca mais parei. Cheguei a colaborar com o Sir Scratch, o Bob da Rage Sense, o Sam the Kid ou o Conductor, dos Buraka Som Sistema, que me ensinaram muito..Como é ser mulher num mundo tão masculino como o do hip-hop?.É difícil, mas não é impossível. Não só é um meio muito masculino, como a própria temática das músicas é muito machista. Na maior parte das vezes, a mulher no hip-hop só tem direito a um papel secundário, é a dama que o rapper ostenta na música, a rapariga sexy que dança no videoclip. A maior parte das pessoas que ouve hip-hop ainda não está muito habituada a ver mulheres com o papel que eu tento desempenhar, enquanto MC. Mas esse é um fenómeno global, infelizmente..Como é que as pessoas reagem, em Angola, a uma temática mais feminista, como as que aborda nas suas letras?.A primeira música que fiz assim mais forte, nesse sentido, foi Sexo, Drogas, Damas e Massa, publicada no meu primeiro disco, para contestar o facto de os homens só falarem destes assuntos nas suas letras. Fiz um bocado de chacota, dizendo que se gabam muito nas músicas, mas na vida real não fazem nada disso. E isso em Angola foi um choque..Como vê as recentes mudanças políticas em Angola?.Estou feliz, porque havia situações muito injustas em Angola. Sentimos que estamos a acordar para uma nova fase, porque este novo presidente trouxe uma dinâmica completamente diferente. Em apenas dois meses já foram muitas as mudanças, o que nos faz acreditar em dias melhores para Angola..A mesma coragem que a levou a escrever uma carta aberta a Eduane Danilo, filho do antigo presidente, a questionar a proveniência do seu dinheiro?.Fiquei escandalizada e achei que alguém tinha de falar. Havia muitas críticas de gente anónima na internet, mas pensei que se eu sou hoje quem sou é devido a um povo que compra os meus discos e vai aos meus concertos. E foi por esse povo que me senti na obrigação de tomar uma posição pública.