O nome de Sophia de Mello Breyner Andresen é uma vida, uma obra ímpar, um sentido estético e ético exemplar. A escritora que deixou a terrena realidade a 2 de Julho de 2004 vai ser homenageada hoje, às 15.30, no Teatro Nacional D. Maria II, em Lisboa..O encontro será moderado pela Professora Maria Teresa Dias Furtado, da Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa.Participam as ensaístas Silvina Rodrigues Lopes (que falará sobre a obra poética de Sophia) e Maria João Cantinho (que abordará a área dos contos para crianças). Depois de analisada a faceta literária de uma figura maior da cultura portuguesa, assistir-se-á a um recital em que os actores João Grosso e Teresa Lima irão dizer poemas da autora de obras como O Livro Sexto, Dual, Ilhas ou Musa. Além da poesia, destaque-se a criatividade de Sophia na prosa, nomeadamente em Contos Exemplares e Histórias da Terra e do Mar. A palavra de água e cristal de Sophia perdura, do mesmo modo, na literatura infantil, livros que encheram de encantamento muitas gerações A Fada Oriana, O Rapaz de Bronze ou A Menina do Mar . Também no ensaiosobressai a sua imensidão em obras como Poesia e Realidade ou O Nu na Antiguidade Clássica. Acresce a sabedoria e o brilho com que traduziu, entre outros, Shakespeare, Dante e Eurípides..ESSÊNCIA. A responsável pela organização do encontro, Maria Teresa Dias Furtado, fala ao DN da motivação da homenagem a Sophia "Pretende-se voltar a reconhecer, para um público diversificado, a personalidade literária e humana únicas, nas suas múltiplas manifestações, quer em poesia, quer em prosa." Que pode encontrar esse público mais vasto em Sophia? "Dá-nos a conhecer melhor o mundo e a humanidade a um nível de exigência ética e poética, na inteireza da sua personalidade aberta, sempre em escuta atenta, captando a essência das coisas.".IDENTIDADE. Para Maria Teresa Dias Furtado, "Sophia devolve-nos a capacidade de nos maravilharmos, de recusarmos o que é fácil, abrindo-nos horizontes de descoberta e de identidade. Tanta coisa escreveu que nos ficou no ouvido, na alma, no nosso modo de ser com o mundo e a vida.".E como define a Professora de Letras a escrita de Sophia? "É límpida e rítmica, parte do real mais concreto e eleva-o às alturas do espírito. Espírito onde convergem, em unidade, o legado da cultura clássica e do cristianismo, matrizes da cultura europeia." .A moderadora do encontro recorda, entretanto, poetas que homenagearam Sophia, como Fiama num poema que integra o livro Cenas Vivas..EDIÇÃO. Maria Teresa Dias Furtado acentua ao DN "Sophia é e continuará a ser na literatura portuguesa e na literatura mundial uma filigrana de luz, uma epopeia poética e dramática, uma voz que nos desperta e nos confia o que de mais genuíno tem a realidade." Lembra, a propósito, palavras da escrita de Sophia: "O poema é o selo da aliança do homem com as coisas.".Em preparação está uma edição crítica, num só volume, de toda a obra poética de Sophia de Mello Breyner Andresen, a cargo da Professora e também poeta Maria Andresen de Sousa Tavares. Essa obra (revista, fixada e anotada) "virá a ser um excelente instrumento de estudo, de divulgação e de tradução para muitas línguas estrangeiras" - sublinha a coordenadora da homenagem que hoje é feita à autora d'O Nome das Coisas..ENSINO. As obras de Sophia, no que respeita aos contos (para adultos) e aos poemas são, em certa medida, conhecidas por alunos do ensino secundário, e, ao nível da universidade, "prestam-se admiravelmente para as aulas de Introdução ao Estudo da Literatura (cadeira do 1.º ano), sobretudo para definir o texto literário" - diz a Professora de Letras ao nosso jornal..Os contos de Sophia para crianças, mais presentes no ensino básico, despertam, também, o maior interesse. Maria Teresa Dias Furtado recorda, neste nível de ensino, uma recente adaptação/dramatização do conto A Noite de Natal, representado pelas crianças no espaço da escola. Comenta "Era admirável ver como se haviam apropriado da linguagem da autora, apresentando-a sem falhas e com grande vivacidade e autenticidade.".MEMÓRIA. Também Casimiro de Brito, presidente do Pen Clube Português, fala ao DN de Sophia. "Grande poeta é esse que resume o mundo e toda a poesia em cada um dos seus poemas Sophia, entre nós, é um dos melhores exemplos. A origem da poesia passa pela sua poesia, os gregos, os mitos, a tradição peninsular, a aura e o sofrimento dos humanos, a natureza e a sua inteireza, a aurora e a noite, o conhecimento e a grande e saudável ignorância.".O olhar de Casimiro de Brito sobre Sophia completa-se assim "Mas cada grande poeta é também esse que inicia, que tudo são começos, e Sophia, entre nós, é o poeta da palavra inaugural, a que foi bebida junto ao mar, sofrida junto dos homens, a palavra do canto antigo todos os dias renovado, como se em cada poema dela, Sophia, a palavra dissesse: começa aqui a casa primitiva. Poucos poetas alcançam essa grandeza, a de ser solista numa orquestra sempre multiplicada, e tão plena de energia, como é a poesia portuguesa.".A poetas como Sophia "libertos da lei da morte, o que se diz é Até ao próximo poema. Até à próxima película da vida, em que é pleno e perfeito cada instante - refere ainda Casimiro de Brito. E diz "Da amiga tenho a memória, da poeta a chama sensível.".ESGOTADAS. A principal editora da obra poética de Sophia - a Caminho -, reeditou toda a poesia de Sophia (14 volumes), individualizando os títulos. Esta publicação iniciou-se em finais de 2003 e completou-se em 2004. Cada livro teve uma tiragem de cinco mil exemplares e muitos deles esgotaram-se num curto espaço de tempo, nomeadamente Dual, Poesia e Dia do Mar. O editor responsável pela Caminho, Zeferino Coelho, adiantou ao DN "Estamos já a trabalhar em nova reedição, que a todo o momento chegará ao mercado livreiro.".Zeferino Coelho sublinha ao nosso jornal "Publicar Sophia é uma honra. É uma voz única na poesia portuguesa, tanto na beleza plástica como na riqueza de ideias, mas que não foi ainda devidamente descoberta e estudada.".Distinguida com prestigiados galardões, dentro e fora de Portugal, a obra de Sophia (ficção e infantil) encontra-se publicada noutras editoras, entre as quais a Figueirinhas e Salamandra. E do muito que tem sido escrito sobre a autora saliente-se o recente ensaio Sophiade Mello Breyner Andresen Mitos Gregos e Encontro com o Real, de António Manuel dos Santos Cunha (edição da Imprensa Nacional-Casa da Moeda).