Sinn Féin à beira de uma vitória histórica na Irlanda do Norte

Nacionalistas nunca ganharam e unionistas não se comprometem a entrar no governo, como prevê o acordo de partilha de poder. Votos só são contados amanhã.
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Quase 25 anos depois de os Acordos de Sexta-Feira Santa terem posto fim a três décadas de violência entre os republicanos defensores de uma só Irlanda e os unionistas desejosos de continuar a fazer parte do Reino Unido, as sondagens dão pela primeira vez a vitória aos republicanos nas eleições para a Assembleia da Irlanda do Norte. Mas a possível vitória histórica do Sinn Féin, antigo braço político dos paramilitares do IRA, não significa o fim dos problemas para a região, que está há meses sem governo.

Ao abrigo do acordo de partilha de poder, que nasce do acordo de paz de 1998 e foi revisto em 2006, o partido mais votado escolhe o chefe do governo. O vencedor das eleições para a Assembleia de 90 lugares tem sido sempre unionista - desde 2003 o Partido Unionista Democrático (DUP, em inglês). O posto de vice, quando finalmente o acordo foi posto em prática, tem sido dos nacionalistas do Sinn Féin, nas mãos de uma nova geração de líderes desde a saída do histórico Gerry Adams, em 2018.

Na prática, contudo, primeiro ministro e vice têm o mesmo poder e um não pode atuar sem o outro. Isso tem levado à queda do governo, como aconteceu em fevereiro, quando o unionista Paul Givan se demitiu em protesto contra o Protocolo da Irlanda do Norte, previsto no acordo de Brexit, levando à queda da nacionalista, Michelle O"Neill. A possível vitória histórica do Sinn Féin abre a porta a que ela se torne chefe de governo. Contudo, o DUP não se comprometeu a entrar neste executivo, tendo alertado que a vitória nacionalista irá levar à pressão para um referendo sobre a reunificação das Irlandas.

"É uma escolha clara nestas eleições. É entre o DUP e o nosso plano de cinco pontos para enfrentar os temas que verdadeiramente importam às pessoas na Irlanda do Norte e o referendo divisivo do Sinn Féin", disse o líder do DUP, Jeffrey Donaldson, à AFP. Entre outras coisas, os unionistas querem rasgar o polémico protocolo - algo que a União Europeia rejeita. Este documento, que na prática mantém a Irlanda do Norte a seguir as regras de Bruxelas, foi criado para evitar uma fronteira física entre as duas Irlandas que pudesse reavivar a tensão entre nacionalistas, de maioria católica, e unionistas, protestantes. Mas acabou por criar uma fronteira interna entre esta região e o resto do Reino Unido.

Este foi um dos temas das eleições, mas não é o único problema na mente dos eleitores, preocupados também com habitação ou emprego. Tem sido nestes pontos que o Sinn Féin, apesar de na prática estar no governo há 14 anos, tem conseguido apresentar-se como a solução de mudança. E tem conseguido atrair o eleitorado mais jovem - os nacionalistas também têm vindo a ganhar votos por uma questão demográfica, estimando-se que os censos de 2021 revelem, pela primeira vez, uma maioria católica na região que foi criada em 1921 como "um estado protestante para um povo protestante".

Nas últimas eleições, em 2017, apesar da vitória do DUP, os dois partidos já tinham conseguido eleger cada um 26 deputados. Agora, as sondagens colocam o Sinn Féin com 26,6% de intenções de voto e o DUP com 18,2%. A complicar mais as coisas, surge a Aliança. O partido liberal de centro, que não se identifica nem como unionista nem com nacionalista, tem vindo a ganhar força e surge empatado com o DUP. Mas ao abrigo do acordo de partilha de poder, não poderá designar um vice, razão pela qual quer acabar com este sistema. Os eleitores são chamados hoje às urnas, mas os votos só começam a ser contados amanhã.

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